terça-feira, 3 de abril de 2012

Por que é importante ter uma fé racional?

Existem duas coisas básicas que os cristãos precisam saber. A primeira é que é importante que se cultive uma fé inteligente, com bases racionais e que ofereça certeza de veracidade. A segunda é que essa fé inteligente não deve ficar guardada dentro de sua casa, escondida do mundo. Pelo contrário, o cristão que possui uma fé inteligente deve, sempre que possível, expô-la aos que acreditam que fé é apenas crença infundada e sem evidências.

Agora, por que essas duas coisas são importantes? O que vale não é apenas crer e pronto? Cada um não tem direito de crer no que bem entender? Não é melhor deixar de lado as discussões e não interferir nas crenças dos outros? Vamos responder esses questionamentos.

Em primeiro lugar, devemos ter em mente que é natural querer saber se algo é verdadeiro antes de aceitar como verdade. O nome disso é ceticismo e por mais ingênua que seja uma pessoa, ela sempre terá certo nível de ceticismo. Um bom exemplo para se mostrar como que o ceticismo é natural e importante, imagine que alguém chegasse para você e dissesse: “Sou um lobisomem”. O que você faria? Simplesmente acreditaria, sem questionar? Eu tenho certeza que não. Você não acreditaria a menos que tivesse fortes evidências para crer nisso. Então, vemos que o ceticismo é natural e importante.

Da mesma forma, não pode haver fé se não houver também ceticismo. Afinal, para que você acredite em algo, é necessário que você tenha boas razões para crer que aquilo é verdadeiro, bem como ter boas razões para crer que as visões opostas a que você adotou são falsas. Então, fé envolve uma boa dose de ceticismo.

É claro que nem sempre as razões que temos para crer em algo são razões evidentes para outras pessoas. Muitas vezes cremos em algo por experiência pessoal. E o que é pessoal, é pessoal. Esse tipo de razão é válido, pois não deixa de ser uma razão, um motivo para crer. E é importante ter experiências pessoais, pois são as experiências pessoais que mais nos tocam e nos inclinam a crer na veracidade de algo.

Entretanto, se cultivamos apenas razões pessoais para nossa fé, poderemos ter dois problemas. Primeiro: Dificilmente poderemos convencer alguém de que nossa fé é verdadeira e racional. Segundo: Quando estivermos diante de argumentos contrários à nossa fé, provavelmente não saberemos refutá-los e, assim, além de passarmos vergonha e deixarmos uma má impressão da nossa fé, vamos também ficar com dúvidas. E essas dúvidas provavelmente não serão respondidas, pois nós não temos o costume de buscar razões lógicas (que excedem o campo do pessoal).

O resultado é catastrófico: Damos a impressão de que nossa fé é burra, ajudamos os argumentos contrários, afastamos as pessoas de acreditarem no que nós acreditamos e, por fim, acabamos perdendo a nossa fé. Isso não sou eu que estou dizendo. Isso pode ser atestado todos os dias nas faculdades e em meios mais intelectuais. Os cristãos são vistos como burros, retrógrados, ingênuos, anti-intelectuais, idiotas e por aí vai. Vários cristãos abandonam sua fé, muitos ateus não se convertem e os doutores e professores da faculdade continuam tratando fé como um empecilho.

Portanto, vemos que é essencial os cristãos cultivarem uma fé inteligente para que o cristianismo seja visto com mais respeito; para que menos cristãos abandonem a fé; para que mais ateus e agnósticos possam enxergar que o cristianismo é uma opção racional e viável.

Com relação ao direito de escolha, sim, todas as pessoas tem direito de crerem naquilo que bem entendem. E devemos respeitar isso. Agora, isso não significa que não podemos falar para as pessoas sobre algo que, a princípio, elas discordam. E existem vários motivos para isso. Um deles é que a pessoa pode estar errada e você certo. Assim, ao conversar com a pessoa, se ela realmente se importa em saber a verdade, ela terá a chance de perceber que está errada e mudar. Outro motivo é que você pode estar errado e a pessoa certa. Assim, você terá a chance de perceber que está errado e mudar.

Em todo o caso, a discussão pacífica e construtiva de qualquer assunto, sempre será positiva, pois poderá levar alguém a perceber o seu erro. Mas para isso é necessário que você estude o assunto para que não corra o risco de você estar certo, mas por falta de estudo achar que está errado.

Como cristãos, a questão fica ainda mais séria. Jesus afirma que quem conhecer a verdade, será liberto (João 8:32). Ele também diz que nos capacita para sermos suas testemunhas (Atos 1:8). Pedro nos diz que devemos estar sempre preparados para dar a razão de nossa esperança às pessoas (I Pedro 3:15). Calar-nos e deixar que as pessoas pensem que a fé é irracional, é, portanto, até mesmo uma falta de amor para com ateus, agnósticos e cristãos de fé vacilante. Cristo deseja que todos estes conheçam a verdade e se acheguem a ele. Cabe a nós dar a eles essa oportunidade. Se depois não quiserem aceitar, pelo menos estaremos certos de que fizemos a nossa parte.

Por fim, estudar as razões da nossa fé colabora para o nosso próprio crescimento espiritual, pois acrescenta mais certeza e segurança para o nosso coração de que estamos seguindo a coisa certa. Devemos lembrar também que se Deus criou o mundo também é dono da racionalidade, da inteligência e do raciocínio lógico. Então, tentar desassociar fé e razão é uma forma de chamar Deus de burro. Se Deus existe é claro que podemos chegar a ele através da razão.

Quanto às discussões, mais uma vez ressalta-se que elas devem ser pacíficas e construtivas. É preciso mostrar à pessoa com a qual discute, que você está interessado em discutir racionalmente, que está interessado em saber quais são as dúvidas ou as razões da descrença dela com o fim de ambos saberem a verdade.

Conclui-se, então, que é importante ser engajado intelectualmente no que diz respeito a sua fé. Mas não se assuste. Não é necessário saber muito e nem gastar anos e anos estudando. Apenas é necessário saber o básico. Um aprofundamento fica por conta do gosto do estudante pelo assunto. É curioso notar que ao estudar um pouquinho, nós percebemos que a maior parte das dúvidas dos não-cristãos são fáceis de responder. E mais interessante é que muitos ou não tem argumentos concretos para sua descrença ou simplesmente repetem o que outros disseram. Quando nos damos conta disso, aí vemos como o cristianismo tem perdido espaço nas universidades e centros intelectuais por verdadeiras bobagens. É claro que existem bons argumentos e bons argumentadores que militam contra o cristianismo e a crença em Deus em geral. Mas são poucos e também não devemos temê-los. Afinal, se aquilo em que cremos é verdade, a verdade sempre vai se impor sobre a mentira. No fim, quem estuda não tem medo de ter fé. E quem tem fé não tem medo de estudar.

20 comentários:

  1. Eu cheguei a esta postagem ao pesquisar o seguinte no google: "por que ter fé?". Fiz essa pesquisa pois busco a verdade, independente de qual seja. Já fiz essa pergunta a várias pessoas e as respostas vão sempre por um desses três caminhos:

    1- experiências pessoais, pra mim não adiantam de nada pois são extremamente subjetivas e são somente dessas pessoas, eu não as tive.
    2-Argumento da ignorância, atribuem causas sobrenaturais a fatos que não podem explicar. Ora, o fato de não sabermos como algo acontece ou aconteceu não significa que a causa seja sobrenatural...
    3-Egoísmo, a pessoa dá a entender que acredita em Deus porque será salva, ou seja, não vai pro inferno. Isso me soa extremamente egoísta e desprezível. Se eu fosse um deus ficaria realmente chateado das pessoas se aproximarem de mim somente por interesses próprios...

    Então quando vc começou a falar de "fé inteligente" eu fiquei esperançoso de encontrar uma resposta satisfatória. Mas fiquei frustrado... No meio de tantas palavras bonitas não encontrei o que procurava...

    Contudo devo admitir também que no fundo eu tenho fé... Então eu me pergunto, por que? E então eu respondo a mim mesmo: "Só Deus sabe..."

    Boa noite.

    P.S eu devo ser louco

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    1. Prezado Daniel,

      Evidentemente eu não fiz esse texto especificamente para você, pois não o conhecia quando fiz (nem o conheço hoje). Mas pergunte-me o que você quer saber. Então, eu poderei responder a você especificamente. Experimente.

      Abraços.

      Davi Caldas.


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    2. Minha pergunta é: Por que ter fé?

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    3. Prezado Daniel,

      A Bíblia define fé como a certeza das coisas que não se veem. É uma metonímia. Por visão, a Bíblia está querendo se referir a todos os sentidos físicos. Ora, todas as pessoas tem certeza da existência de coisas que não podem apurar diretamente pelos sentidos físicos. Por exemplo, há um axioma em matemática que afirma que duas retas paralelas traçadas em local plano jamais se tocarão. Esse axioma é a base para a geometria euclideana. Como se chegou a essa conclusão? Através da observação pelos sentidos físicos? Por testes empíricos? Não. Pela lógica. A lógica nos garante que essas retas nunca se tocarão, pois são paralelas. Mas não podemos ver o infinito para provar por nossos sentidos físicos que elas, de fato, não se tocam. Isso se encaixa na definição de fé.

      Note que fé não é sinônimo de algo sem lógica. A fé pode se basear em fatos lógicos ou muito prováveis. O que define fé não é o número de evidências que você tem para crer, ou o peso delas, mas se elas são apuradas diretamente pelos sentidos físicos ou não. Há muitas coisas que não provamos ou apuramos diretamente por empirismo. Verdades matemáticas, verdades lógicas, verdades morais e a próprio empirismo, aliás. Quando um cientista utiliza o empirismo para provar alguma verdade, ele pressupõe que o empirismo está correto. Mas ele não pode provar o empirismo pelo próprio empirismo. O mesmo se dá em relação a razão. Utilizamos nossa razão e a consideramos válida, procurando ser racionais. Mas não podemos provar a validade da nossa razão através de método cientifico. Afinal, o próprio método cientifico se baseiam nessa razão. Então, precisamos aceitar sua validade axiomáticamente, isto é, como autoevidente. Não podemos prová-la, mas precisamos aceitá-la porque todos os nossos pensamentos e juízos se baseiam nela. Isso é fé.

      Temos fé também quando aceitamos fatos históricos. Você, por exemplo, deve ter uma certidão de nascimento. Você acredita no que ela diz em relação a sua data e local de nascimento. E provavelmente o que ela diz é corroborado por seus pais talvez algumas outras pessoas. Mas essa certeza que você tem se baseia em fé. Seria perfeitamente possível que seus pais estivessem mentindo e que certidão estivesse errada. Você não tinha aptidão para apurar empiricamente a data e o local do seu nascimento quando nasceu. Ou seja, você crê não por apuração empírica direta, mas por fé.

      Quando leio um livro de história, o que ali está registrado eu também aceito por fé. Os fatos ali mencionados eu não vivi. Não os vi com meus próprios olhos. Não ouvi o que ali se diz que foi falado. Creio porque há muitas evidências, mas isso não é conhecimento empírico direto, pois não vivi os fatos em si. Apenas sei o que me contam através de registros. Ademais, nem mesmo tenho acesso direto à maioria das evidências. Documentos e artefatos antigos estão nos museus e não nas minhas mãos.

      Acreditamos por fé também que nossos sentidos captam a realidade. Você já viu Matrix? Nesse filme, todas as pessoas vivem em uma realidade virtual. Ninguém percebe isso, pois o cérebro delas monta todas as percepções (visão, audição, olfato, paladar e tato). Todos sentem e vivem como se estivessem em um mundo real. Mas a verdade é que tudo não passa de projeção mental. O filósofo Pascal já falava sobre isso no século 17. Como exercício de reflexão ele nos pedia que imaginássemos um demônio que manipulasse nossos sentidos, de modo que toda a realidade à nossa volta fosse apenas uma ilusão. Como saberíamos disso? Esse exercício de reflexão não está tão longe da realidade. Há pessoas que sofrem de esquizofrenia e às vezes seus cérebros imaginam toda uma realidade que não existe. Um filme chamado "Mente Brilhante" (A Beautiful Mind), estrelado por Russel Crowe, conta a história de um matemático que passa por isso. Ele precisa lutar pra saber o que é real e o que não é.

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    4. O filósofo e teólogo William Lane Craig nos leva a pensar no seguinte: como podemos apurar e provar, por exemplo, que o universo, a a terra e nós não fomos criados há cinco minutos com aparência de antiga e todos as evidências de tempo transcorrido, como nossas memórias e até a comida em nossos estômagos? Não temos como apurar e provar. Aceitamos que as coisas não são assim simplesmente pela fé. É um axioma.

      A verdade é que todas as pessoas tem fé. Infelizmente, há um mito de que a Ciência é totalmente baseada em fatos empiricamente apurados e comprovados. Nada mais falso. A Ciência é feita de uma série de pressuposições aceitas à priori, sem comprovação, pelo simples fato de não poderem ser apuradas empiricamente.

      Quando alguém diz que não tem fé, é mentiroso. Todos nós acreditamos em coisas que não podem ser apuradas e provadas empiricamente, e também em coisas que não foram apuradas e provadas diretamente por nós, mas por outros, e que nós apenas aceitamos como verdade. Todos tem fé.

      Então, respondendo a sua questão: "Por que ter fé?". Porque é impossível não ter fé. A fé move o mundo. A fé é o que faz as coisas terem algum sentido. Uma vez que você aceita essa realidade e começa a trabalhar dentro dela, perceberá que há boas razões e evidências para ter fé em algumas coisas específicas, como Deus. Sim, crer em Deus é racional. Há motivos plausíveis para isso. Outro dia listei algumas dessas evidências. Listo-as aqui novamente:

      - Argumento Cosmologico
      - Argumento Teleologico
      - Argumento Moral
      - Argumento da Razão
      - Argumento Ontologico
      - Argumento das Civilizações
      - Argumento Da Estrutura Psicológica e da Saúde Humana
      - Critérios de confiabilidade histórica da Biblia
      - Argumento da Ressurreição
      - Argumento da Identidade e autorreconhecimento de Jesus
      - Observação da Necessidade lógica do cristianismo
      - Achados arqueológicos comprovatorios da Biblia
      - Harmonia interna da Biblia
      - Incoerências nas demais religiões e deuses

      Há muitos livros que falam sobre esses argumentos. E muitos bons artigos pela internet. Aqui no meu blog tem alguns artigos sobre esses temas e uma lista de livros que já li e indico. Vou deixar aqui o índice do blog para você pesquisar pelas postagens, e o índice de livros indicados.

      Índice de Postagens do Blog: http://mundoanalista.blogspot.com.br/search/label/Indice%20de%20Postagens
      Lista de Livros: http://mundoanalista.blogspot.com.br/search/label/Livros%20Recomendados

      Bom, espero ter ajudado. Estude amigão. E peça a Deus ajuda para conhecê-lo melhor.

      Att.,

      Davi Caldas.

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  2. Bom, vc me deu muita coisa pra ler, gostaria de responder aqui somente quando tiver lido tudo o que me foi indicado. De qualquer forma muito obrigado pela atenção. Bom dia.

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  3. "Fé religiosa racional"? Você está ciente de que a grande maioria dos filósofos profissionais são ateus, sabia disso?

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    1. Em primeiro lugar, desconheço qualquer pesquisa séria que tenha entrevistado todos os principais filósofos do mundo para afirmar que a maioria é ateu. Supondo que seja, e daí? Quantidade prova veracidade?

      Em segundo lugar, você deve lidar com a questão de Deus na filosofia e nas ciências em geral de uma maneira menos leviana. Afinal, a filosofia e a ciência foi construída, em sua maior parte, por intelectuais de grande envergadura que acreditavam em Deus. E assim é até hoje. Ignorar isso é jogar fora Sócrates, Platão, Aristóteles, Agostinho de Hipona, Tomás de Aquino, Anselmo de Cantuária, Nicolau Copérnico, Galileu Galilei, Blaise Pascal, Francis Bacon, Lois Pasteur, Rene Descartes, Isaac Newton, Gregor Mendel, Leibniz, Kepler, Gauss, Faraday, Fermat, Grimaldi, Euler, Guldin, Boscowitsch, Gerdil, Kelvin, Francis Collins, C. S. Lewis, G. k. Chesterton, Tolkien, William Lane Craig, Alvin Plantinga, Richard Swinburne, Alister McGrath, Norman Geisler, Frank Turek, N. T. Wrhite, Rodrigo Pereira Silva, Olavo de Carvalho, Mario Ferreira dos Santos, Mario Sérgio Cortelha, Darrell Bock, F. F. Bruce, Robert Hunthcinson, Thomas Howe, John Lonnox e etc. Eu poderia ficar aqui citando nomes o dia inteiro. Penso que em vez de usar de "ad hominem", é melhor analisar os argumentos desses caras e encarar as questões filosóficas relacionadas a Deus com coragem e honestidade.

      Att.,

      Davi Caldas.

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  4. “Em primeiro lugar, desconheço qualquer pesquisa séria que tenha entrevistado todos os principais filósofos do mundo para afirmar que a maioria é ateu.”
    Pois então, eu vou lhe informar melhor sobre isto. Esta constatação é importante, pois muitos religiosos e apologistas têm batido nesta tecla, afirmando que ícones do ateísmo moderno, como Dawkins, Harris e Dennett são pessoas que “não conhecem apologética e não podem ser levadas a sério”, porque, veja você,” eles são cientistas, não filósofos. A questão da existência de Deus é filosófica, não científica”. Embora isso seja verdade, o fato é que é muito conveniente para estas pessoas querer mover a questão para fora do âmbito da comunidade científica, já que o índice de ateísmo ali é altíssimo se comparado ao resto da sociedade. Afinal de contas, é muito difícil de negar que, no contexto do mundo atual, existe uma correlação muito forte entre profissionalismo na área de ciências e negação da crença tradicional monoteísta. Para se ter uma ideia, 93% dos membros da National Academy of Sciences, nos EUA, declaram não acreditar na existência de um Deus pessoal ou são agnósticos, enquanto uma proporção quase inversa de 92% da população comum dos EUA afirma acreditar em alguma divindade. Embora pesquisas de opinião entre a população comum de diversos países e as comunidades científicas tenham revelado resultados um tanto diferentes, simplesmente TODAS as pesquisas de opinião feitas sobre o assunto têm demonstrado que a proporção de ateus e agnósticos entre a comunidade científica atual é muitíssimo maior do que a proporção de ateus e agnósticos entre a população comum. Com isso, portanto, conclui-se que trabalhar com ciências, de uma forma geral, aumenta extremamente a possibilidade de a pessoa declarar não acreditar em Deus.
    Eu não digo isso para argumentar ou implicar que todo este apoio, necessariamente, refuta o monoteísmo. Isto seria uma falácia de apelo à autoridade que eu não tenho a menor intenção de cometer. Mas mesmo assim, o que eu pretendo lhe explicar aqui é refutar este apelo a comunidade filosófica feito por vários apologistas:
    “Ah, é claro que se você for ler os livros de cientistas como Dawkis, Harris e Dennett, você vai acreditar que a ciência refuta Deus, mas você precisa estudar o que os filósofos acreditam sobre Deus! A questão da existência de Deus é filosófica, não é científica!”
    Por exemplo, o apologista cristão William Lane Craig faz este apelo em sua vídeo-aula abaixo: https://www.youtube.com/watch?v=eNsU2B7icDQ
    Ao comentar o best-seller ateísta “Deus, um delírio”, de Richard Dawkins, Craig afirma: “Dawkins é um biólogo profissional. Ele é um perito na sua área de especialização, mas ele não é um filósofo. Então, quando ele fala de questões filosóficas, como os argumentos sobre a existência de Deus, sua opinião não têm mais valor do que a opinião de um leigo ignorante.”
    Assim como Craig, eu já vi um número grande de apologistas e outros religiosos fazendo este apelo a autoridade. O pensamento típico deste argumento é afirmar que “a ciência não explica tudo” e, que uma vez que a pessoa abrir a mente para o pensamento filosófico, ela irá acreditar que Deus existe. O que mais me intriga sobre este argumento é que praticamente todas as objeções feitas contra a existência de Deus são, justamente, filosóficas. Figuras como Dawkins, Harris e Dennett são, realmente, cientistas, mas todos os seus argumentos em favor do ateísmo são comentários sobre o teísmo e a religião baseados na História da humanidade e, justamente, na filosofia. O mais estranho ainda é que os apologistas tem a noção de que a comunidade filosófica discorda destes cientistas ateus ferrenhos- que, supostamente, não entendem de filosofia e, portanto, não têm bons motivos para não acreditar na existência de Deus.

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  5. A questão que então fica é: será que a comunidade filosófica realmente concorda com os argumentos da apologética cristã, ou de qualquer outra religião? Ou melhor ainda: será que ao contrário das ciências, trabalhar profissionalmente com a filosofia aumenta a chance de alguém acreditar em Deus, no cristianismo ou qualquer outra religião? Resposta curta: NÃO.
    E, na verdade, a tendência ao ateísmo entre os filósofos profissionais é quase tão forte quanto entre os cientistas profissionais, como veremos a seguir. Será que a filosofia é a “poção mágica” que pode salvar a crença em Deus, no contexto do mundo atual? Sendo eu mesmo um ateu, eu acredito, sinceramente, que não, e o fato é que a grande maioria dos filósofos profissionais concordaria comigo.
    A pesquisa que fundamenta este fato foi realizada pela organização online PhilPapers. Para quem não conhece, a PhilPapers (philpapers.org) é uma organização não-governamental, sediada nos EUA, que funciona como uma base de informações internacional e interativa de artigos acadêmicos para professores, pesquisadores e estudantes universitários de filosofia de todo o mundo.
    Na última pesquisa de opinião realizada pela instituição, em novembro de 2009, 3226 pessoas, entre as quais 1803 professores universitários de filosofia e/ou PhDs em filosofia, além de 829 alunos da graduação das 200 mais importantes faculdades de filosofia do mundo responderam a questões diversas sobre a filosofia. A pesquisa está disponível, em inglês, no link: http://philpapers.org/surveys/results.pl
    E, ao analisarmos a pesquisa da Philpapers de todos estes filósofos profissionais, considerando-se apenas os que são professores universitários e/ou com PhD em filosofia, nós veremos onde que a maioria dos filósofos profissionais se identifica no debate sobre a questão da existência de Deus. Se alguém quiser fazer apelos a autoridade em filosofia, nós veremos que os resultados são muitíssimo mais favoráveis ao ateísmo do que em relação ao teísmo. Todos os resultados abaixo serão transcritos em inglês, junto com a tradução em português.

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  6. Então, vamos aos números. Quantos filósofos profissionais, sejam eles professores das melhores universidades no mundo e/ou PhDs em filosofia, será que acreditam que Deus existe? A pesquisa nos revela:
    God: theism or atheism?
    Accept or lean toward: atheism 1257 / 1803 (69.7%)
    Accept or lean toward: theism 295 / 1803 (16.4%)
    Other 251 / 1803 (13.9%)

    ( Deus: teísmo ou ateísmo?
    Aceitar ou inclinar-se para: ateísmo 1257/1803(69,7%)
    Aceitar ou inclinar-se para: teísmo 295/1803(16,4%)
    Outros 251/1803(13,9%) )
    “Uau!”, diria qualquer um. “Então... quer dizer que, praticamente, 70% dos filósofos profissionais são ateus? E menos de um sexto deles são teístas? Puxa! Então... convenhamos que isto coloca figuras como Craig,Plantinga,Swineburne,Lennox e outros em uma minoria e tanto, não?”. E, de fato: 69,7% dos filósofos profissionais entrevistados declaram-se ateus ou tendendo a concordar com o ateísmo, ou uma maioria bastante expressiva deles. Apenas com esta constatação inicial, muitas observações podem ser feitas. Como você mesmo diz:
    “Supondo que seja, e daí? Quantidade prova veracidade?”
    Não necessariamente! Mas mesmo assim, ela prova que o ateísmo deve ser considerado como uma posição filosófica bastante considerável e, portanto, razoável de ser verdadeira. E isso porque muitíssimos religiosos e apologistas desprezam os ateus e o ateísmo como sendo algo patentemente irracional, desprezível ou absurdo. Por exemplo, os apologistas Geisler e Turek escreveram um livro chamado “Não Tenho Fé Suficiente para Ser Ateu”, querendo dar a entender que o ateísmo é algo ululantemente ignorante- mas ignorantes, na verdade, são eles, que, ao debochar do ateísmo, desconhecem que 70% dos filósofos sérios são, justamente, ateus. Da mesma forma, muitos apologistas têm comentado o fato de que os jovens perdem a fé depois que entram na universidade, pois eles foram ”doutrinados” pelos seus professores, sem que eles soubessem da existência da apologética. Ou então, muitos religiosos alfinetam o movimento moderno do neo-ateísmo, afirmando que livros e sites partidários de autores como Dawkins têm levado milhares de pessoas, principalmente jovens, a desacreditar em Deus, sem que elas estudassem apologética. Estas pessoas podem até ter razão quanto a influência destes autores nas pessoas mais intelectualmente preguiçosas. Mas mesmo assim, como visto acima, virtualmente 70% das pessoas que estudam filosofia profissionalmente declaram-se, justamente, ateístas. Religiosos e apologistas que acreditam que o ateísmo é uma moda de facebook são, com certeza, pessoas ignorantes, ao desconhecer que 70% da comunidade filosófica profissional mundial declara acreditar, justamente, no ateísmo. Com tudo isto, então, este resultado de que 69,7% dos filósofos profissionais são ateus, já seria, realmente, de impressionar qualquer um.

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  7. Agora, um apologista ou qualquer outro religioso mais inteligente poderia contra argumentar esta constatação, ao observar que o ateísmo também não necessariamente se sujeita ao chamado naturalismo, ou seja: a crença de que apenas as leis e as forças naturais operam no mundo; em extensão, a ideia ou crença de que não existe nada além do mundo natural. Afinal de contas, é preciso observar que existe um número considerável de cosmovisões que até são filosoficamente ateístas, mas que não são naturalistas. Por exemplo, existem pessoas que alegam não acreditar em Deus, mas mantém crença em algum tipo de “força superior” no universo ou algo que o valha. Da mesma maneira, em todo o mundo, muitas das pessoas que dizem não acreditar em Deus ainda têm algum tipo de crença supersticiosa, como fantasmas, astrologia, karma, reencarnação ou telepatia. Inclusive algumas religiões, como o budismo e o hinduísmo são relativamente compatíveis com o ateísmo, mas mesmo elas supõem a existência de espíritos, forças sobrenaturais ou afins. E o sobrenatural, em muitos aspectos, pode ser considerado como um análogo filosófico do conceito de Deus.
    Então... Se uns 70% dos filósofos profissionais são ateus... Isto quer dizer, ainda assim, que os naturalistas são uns ignorantes em filosofia, que não têm o apoio entre os profissionais desta área? O estudo nos revela:
    Metaphilosophy: naturalism or non-naturalism?
    Accept or lean toward: naturalism 912 / 1803 (50.6%)
    Accept or lean toward: non-naturalism 474 / 1803 (26.3%)
    Other 417 / 1803 (23.1%)
    ( Meta-filosofia: naturalismo ou não-naturalismo?
    Aceitar ou inclinar-se para: naturalismo 912 / 1803 (50.6%)
    Aceitar ou inclinar-se para: não-naturalismo 474 / 1803 (26.3%)
    Outros 417 / 1803 (23.1%) )
    Bom... Como podemos ver acima, eu suponho que o naturalismo, ainda que por uma margem consideravelmente menor, estatisticamente falando, ainda assim, trata-se da posição dominante entre os filósofos profissionais, em um tanto mais da metade, ou 50,6% da comunidade. Além disso, nós podemos ver esta questão sobre outro aspecto: se 69,7% dos filósofos profissionais são ateus e 50,6% dos filósofos profissionais são naturalistas, nós podemos calcular matematicamente que 72,60% dos filósofos ateus também são naturalistas, ou uma porcentagem bastante alta deles. Ou seja: apenas 27,4% dos filósofos ateus acreditam em alguma forma de ateísmo não-naturalista. Assim, apologistas que acreditam que os naturalistas e céticos do sobrenatural não passam de um bando de cientistas malucos que não sabem nada de filosofia e que não podem ser levados a sério são, com certeza, pessoas ignorantes, ao desconhecer que mais da metade da comunidade filosófica profissional (50,6%) declara acreditar, justamente, no naturalismo. E que, dentre todos os filósofos que são ateus, 72,60% deles também se declaram naturalistas.

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  8. Em outras questões filosóficas que são discutidas entre ateus/naturalistas e os teístas, os resultados da pesquisa entre os filósofos profissionais predominam consideravelmente para posições ateístas e naturalistas.
    Por exemplo, os naturalistas argumentam que conceitos abstratos, como o amor, não existem, na verdade, além dos padrões de matéria e energia que os seres humanos percebem e atribuem nomes. E o que a maioria dos filósofos acredita? O estudo nos mostra:
    Abstract objects: Platonism or nominalism?
    Accept or lean toward: nominalism 736 / 1803 (40.8%)
    Accept or lean toward: Platonism 655 / 1803 (36.3%)
    Other 412 / 1803 (22.9%)
    ( Objetos abstratos: Platonismo ou nominalismo?
    Aceitar ou inclinar-se para: nominalismo 736 / 1803 (40.8%)
    Aceitar ou inclinar-se para: platonismo 655 / 1803 (36.3%)
    Outros 412 / 1803 (22.9%) )
    Os números são mais próximos aqui, mas ainda assim, o nominalismo tem mais apoio entre os filósofos profissionais do que o platonismo. Desta forma, não acreditar na existência de universos imateriais e de objetos abstratos não é, com certeza, uma posição filosoficamente medíocre ou ignorante. Uma questão análoga a esta é que muito apologistas também argumentam que certos tipos de verdade, como as verdades matemáticas, não podem ser provadas empiricamente (e como isto prova a existência de Deus nunca me foi explicado, é claro). Ainda assim, eu contra argumento a esta posição, afirmando que, na verdade, as verdades lógicas e matemáticas também são tautológicas e pertencem, sim, ao conhecimento analítico. O conhecimento completo sobre o mundo externo só pode ser provado, de uma forma geral, sob evidências empíricas e explicado sobre paradigmas analíticos. A combinação destes dois fatores configura o que os filósofos chamam de “conhecimento sintético”. Esta distinção permite que contas matemáticas como 1+1=2 sejam verdadeiras em uma capacidade analítica, enquanto todo o conhecimento substantivo ainda é derivado pela experiência perceptiva. Os filósofos acreditam que esta distinção é válida? A maioria acredita que sim:
    Analytic-synthetic distinction: yes or no?
    Accept or lean toward: yes 1115 / 1803 (61.8%)
    Accept or lean toward: no 517 / 1803 (28.7%)
    Other 171 / 1803 (9.5%)
    ( Distinção sintética-analítica: sim ou não?
    Aceitar ou inclinar-se para: sim 1115 / 1803 (61.8%)
    Aceitar ou inclinar-se para: não 517 / 1803 (28.7%)
    Outros 171 / 1803 (9.5%) )

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  9. E, de qualquer forma, por que será que existe este ataque dos apologistas ao empirismo? Ora, o simples fato de que não há absolutamente nenhuma evidência empírica que parece sugerir a existência de Deus ou do sobrenatural. Com isso, os apologistas ficam ardentes para encontrar alguma epistemologia que se encaixe melhor com as suas crenças religiosas. O racionalismo e as verdades inatas se encaixam melhor com a sua teologia e, portanto, muito apologistas adotam uma postura epistêmica mente racionalista. E a maioria dos filósofos profissionais concorda com eles? A reposta é não:
    Knowledge: empiricism or rationalism?
    Accept or lean toward: empiricism 687 / 1803 (38.1%)
    Other 647 / 1803 (35.9%)
    Accept or lean toward: rationalism 469 / 1803 (26.0%)
    ( Conhecimento: empirismo ou racionalismo?
    Aceitar ou inclinar-se para: empirismo 687 / 1803 (38.1%)
    Outros 647 / 1803 (35.9%)
    Aceitar ou inclinar-se para: racionalismo 469 / 1803 (26.0%) )
    E quanto ao livre-arbítrio? Frequentemente, os apologistas argumentam que o determinismo material exclui a possibilidade da existência do livre-arbítrio. Isto supõe uma definição libertária da definição do livre-arbítrio, onde o agente deve se libertar da corrente causa-e-efeito. Existe outra posição sobre o livre-arbítrio, chamada de compatibilismo, acredita que, na verdade, o determinismo permite aos agentes determinar as suas próprias decisões e destinos. E poderia esta última concepção reconciliar a observação científica do determinismo e o conceito do livre-arbítrio, sem ter que apelar para conceitos divinos, sobrenaturais ou imateriais? Aparentemente, a maioria dos filósofos acredita que sim:
    Free will: compatibilism, libertarianism, or no free will?
    Accept or lean toward: compatibilism 1004 / 1803 (55.7%)
    Accept or lean toward: libertarianism 301 / 1803 (16.7%)
    Other 265 / 1803 (14.7%)
    Accept or lean toward: no free will 233 / 1803 (12.9%)
    ( Livre-arbítrio: compatibilismo, libertarianismo ou não existe livre-arbítrio?
    Aceitar ou inclinar-se para: compatibilismo 1004 / 1803 (55.7%)
    Aceitar ou inclinar-se para: libertarianismo 301 / 1803 (16.7%)
    Outro 265 / 1803 (14.7%) )

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  10. E quanto ao fisicalismo mente-corpóreo? A ciência da neurologia e a psicologia apontam todas elas que a nossa consciência é um objeto puramente material, sem a existência de qualquer tipo de alma ou outros componentes sobrenaturais. E mesmo se os cientistas dizem isso, será que os filósofos também poderiam concordar com esta visão naturalista? Ao, que tudo indica sim:
    Mind: physicalism or non-physicalism?
    Accept or lean toward: physicalism 981 / 1803 (54.4%)
    Accept or lean toward: non-physicalism 521 / 1803 (28.9%)
    Other 301 / 1803 (16.7%)
    ( Mente: fisicalismo ou não-fisicalismo?
    Aceitar ou inclinar-se para: fisicalismo 981 / 1803 (54.4%)
    Aceitar ou inclinar-se para: não-fisicalismo 521 / 1803 (28.9%)
    Outros 301 / 1803 (16.7%) )
    Com tudo isto, então...será que existe alguma irracionalidade patente, algum problema filosófico, alguma ignorância absurda em ser um nominalista, empirista, compatibilista, fisicalista e, portanto, ateu e naturalista? De jeito nenhum. E, na verdade, como nós vimos acima, as opiniões apologéticas, religiosas e teístas sobre os aspectos relacionados a existência de Deus formam uma minoria dos maiores profissionais do mundo na área de filosofia profissional.
    Além disto tudo, também é interessante analisarmos qual a opinião dos filósofos especializados em determinadas áreas da filosofia no que diz respeito aos argumentos apologéticos concernentes a sua área de especialização. E isso porque a pesquisa do Philpapers também traz a opção de selecionar os respondentes pelo seu nível de titulação e a sua especialização filosófica. E, mais uma vez, todos os argumentos comumente utilizados pela apologética perdem a disputa, pois a grande maioria dos filósofos especializados nestas áreas específicas do conhecimento são, justamente, ateus e naturalistas.
    Por exemplo, o argumento cosmológico para a existência de Deus pertence a área da filosofia das ciências físicas, e 75,6% dos filósofos especializados na filosofia das ciências físicas são ateus, e 63,3% deles são naturalistas.
    O argumento teleológico e o argumento da sintonia fina para a existência de Deus pertencem a área de ciências biológicas, e 83,1% dos filósofos especializados na filosofia da biologia são ateus, e a mesma proporção de 83,1% deles também são naturalistas.
    O argumento ontológico e o argumento da razão pertencem a área da epistemologia, mas a grande maioria dos filósofos especializados em epistemologia(74,7%) pelas melhores universidades do mundo são, justamente, ateus. E a maioria de 47,9% deles também é naturalista (contra apenas 29% deles que se declaram não-naturalistas e 23,2% deles que se declaram “outros”).
    Da mesma forma, também existe, por exemplo, o argumento moral para a existência de Deus, mas a grande maioria dos filósofos que são professores universitários e/ou PhDs em ética aplicada(66,1%), ética normativa(75,2%) e meta-ética(76,5%) pelas melhores universidades do mundo são, justamente, ateus. E a maioria de 48,2%, 45,6% e 46% deles, respectivamente, também são naturalistas (contra uma minoria respectiva de apenas 17,9%, 30,3% e 29,9% deles que não são naturalistas).

    Com isso, nós podemos constatar que os argumentos mais comumente utilizados pelos apologistas não superam a análise rigorosa dos maiores especialistas do mundo em filosofia nas suas respectivas áreas de especialização, pois a grande maioria deles são, justamente, ateus e naturalistas.

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  11. Eu repito: tudo isto não prova, necessariamente, que o ateísmo e o naturalismo sejam verdadeiros. Não que eu esteja fazendo um apelo a autoridade. O que eu estou lhe dizendo é que apelos de apologistas a autoridade de figuras como Craig ou Plantinga para querer provar o que os “filósofos” acreditam sobre todas estas questões são geralmente muito não-representativas entre a comunidade. Craig e Plantinga formam uma minoria não-considerável de filósofos profissionais que, como vimos acima, são predominantemente ateus e naturalistas. Embora isto não necessariamente faça o ateísmo e o naturalismo verdadeiros em si, é muito interessante constatarmos como não apenas estudar ciências profissionalmente aumenta muitíssimo a chance de o indivíduo ser ateu, mas estudar filosofia profissionalmente também.
    Eu também já vi muitos apologistas que parafraseavam a seguinte citação sobre o ateísmo e a filosofia:
    “Um pouco de filosofia, leva a mente humana ao ateísmo; mas a profundidade da filosofia leva-a para a religião.” -Francis Bacon
    Será mesmo? Os números desta pesquisa parecem sugerir justamente o contrário. A pesquisa da PhilPapers nos mostra a seguinte tendência nas crenças teístas do indivíduo, a medida que seu nível de filosofia aumenta:
    Undergraduate
    Accept or lean toward: atheism 135 / 217 (62.2%)
    Accept or lean toward: theism 44 / 217 (20.3%)
    Other 38 / 217 (17.5%)
    Graduate
    Accept or lean toward: atheism 527 / 829 (63.6%)
    Accept or lean toward: theism 173 / 829 (20.9%)
    Other 129 / 829 (15.6%)
    Faculty or PhD
    Accept or lean toward: atheism 1257 / 1803 (69.7%)
    Accept or lean toward: theism 295 / 1803 (16.4%)
    Other 251 / 1803 (13.9%)

    ( Estudante universitário de filosofia
    Aceitar ou inclinar-se para: ateísmo 135 / 217 (62.2%)
    Aceitar ou inclinar-se para: teísmo 44 / 217 (20.3%)
    Outros 38 / 217 (17.5%)

    Graduado em filosofia
    Aceitar ou inclinar-se para: ateísmo 527 / 829 (63.6%)
    Aceitar ou inclinar-se para: teísmo 173 / 829 (20.9%)
    Outros 129 / 829 (15.6%)

    Professor universitário e/ou PhD
    Aceitar ou inclinar-se para: ateísmo 1257/1803(69,7%)
    Aceitar ou inclinar-se para: teísmo 295/1803(16,4%)
    Outros 251/1803(13,9%) )

    Bom... como a análise nos mostra, quanto mais formação profissional do indivíduo em filosofia, maior é a chance dele se declarar um ateu. Assim, ao contrário do que os apologistas propagandeiam, um pouco de pensamento filosófico relaciona-se, realmente, com um nível maior de ateísmo do que a média da população comum- mas mesmo assim, um nível muitíssimo maior de estudo filosófico relaciona-se com um nível até maior de ateísmo. Talvez esta não seja, necessariamente, uma relação causal, mas isto certamente demonstra que não existe absolutamente nenhuma relação causal entre estudar filosofia profundamente e “reconciliar” as pessoas a religião ou de fazê-las acreditar que o cristianismo ou qualquer outra religião seja racional. Na verdade, existem até mais evidências para acreditar que o oposto seja verdade, como vimos acima. Também como vimos acima, o mesmo acontece com a ciência. E, embora eu desconheça pessoalmente a existência de uma pesquisa similar na área de estudos clássicos-aliás, sou todo ouvidos, se alguém conhecer- eu não me surpreenderia se uma formação profissional na área de história antiga, arqueologia, estudos bíblicos e áreas afins correspondessem a um nível maior de ceticismo em relação ao cristianismo. A área de estudos do Novo Testamento é um ramo acadêmico repleto de cristãos, muçulmanos, judeus e outros teístas-mas mesmo assim, até mesmo intelectuais ex-teístas, tais como os norte-americanos Bart D. Ehrman, Hector Avalos, Matt Dillahunty, Jerry DeWitt e Robert Price são estudiosos que se tornaram ateus ou agnósticos após se tornarem especialistas no cristianismo.

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  12. Em resposta a todas essas tendências ateístas e naturalistas no mundo acadêmico da filosofia profissional, muitos apologistas acusam os ateus, em particular aqueles que se desconverteram da religião/teísmo de apenas colocar “cortinas de fumaça intelectuais” ao eles se afastarem da religião. Essas formas de ataques pessoais são proeminentes, em particular, nos comentários de apologistas renomados como William Lane Craig. Em seu site Reasonable Faith, no link http://www.reasonablefaith.org/faith-and-doubt , Craig nos declara:
    “I firmly believe, and I think the Bizarro-testimonies of those who have lost their faith and apostatized bears out, that moral and spiritual lapses are the principal cause for failure to persevere rather than intellectual doubts. But intellectual doubts become a convenient and self-flattering excuse for spiritual failure because we thereby portray ourselves as such intelligent persons rather than as moral and spiritual failures.”
    (Traduzido: "Acredito firmemente, e acho que os bizarros testemunhos daqueles que perderam a fé e apostatado corroboram, que os lapsos morais e espirituais são a causa principal do fracasso em perseverar em vez de dúvidas intelectuais. Mas as dúvidas intelectuais tornam-se uma desculpa conveniente e auto-lisonjeira para o fracasso espiritual, porque assim nos retratamos como pessoas tão inteligentes e não como falhas morais e espirituais ".)
    Então... Qual será a interpretação correta de todas estas informações? Será que o ateísmo e o naturalismo são, realmente, apenas “uma desculpa conveniente e auto-lisonjeira para o fracasso espiritual”, ou será que o índice consideravelmente majoritário e altíssimo de ateus entre os filósofos profissionais em relação ao resto da sociedade é, na realidade, o reflexo das melhores mentes mundiais no assunto sobre a questão teísta e religiosa, ou seja: dúvidas, colocações e comentários intelectuais genuínos que levam-nos ao ateísmo, ao naturalismo e ao secularismo?
    Sendo eu mesmo um ateu e naturalista, sinceramente, não tenho dúvidas quanto a resposta desta pergunta!

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  13. “Em segundo lugar, você deve lidar com a questão de Deus na filosofia e nas ciências em geral de uma maneira menos leviana. “
    Leviana? Você está chamando a opinião de milhares de filósofos que são professores universitários e/ou PhDs em filosofia nas 200 melhores universidades do mundo de...levianos?
    Pessoas que estudaram a vida toda sobre filosofia profissional de...levianas? É isso mesmo?

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  14. “Afinal, a filosofia e a ciência foi construída, em sua maior parte, por intelectuais de grande envergadura que acreditavam em Deus. E assim é até hoje. Ignorar isso é jogar fora Sócrates, Platão, Aristóteles, Agostinho de Hipona, Tomás de Aquino, Anselmo de Cantuária, Nicolau Copérnico, Galileu Galilei, Blaise Pascal, Francis Bacon, Lois Pasteur, Rene Descartes, Isaac Newton, Gregor Mendel, Leibniz, Kepler, Gauss, Faraday, Fermat, Grimaldi, Euler, Guldin, Boscowitsch, Gerdil, Kelvin, Francis Collins, C. S. Lewis, G. k. Chesterton, Tolkien, William Lane Craig, Alvin Plantinga, Richard Swinburne, Alister McGrath, Norman Geisler, Frank Turek, N. T. Wrhite, Rodrigo Pereira Silva, Olavo de Carvalho, Mario Ferreira dos Santos, Mario Sérgio Cortelha, Darrell Bock, F. F. Bruce, Robert Hunthcinson, Thomas Howe, John Lonnox e etc. Eu poderia ficar aqui citando nomes o dia inteiro. Penso que em vez de usar de "ad hominem", é melhor analisar os argumentos desses caras e encarar as questões filosóficas relacionadas a Deus com coragem e honestidade.”

    E como nós vimos acima, a esmagadora maioria daqueles que estudaram nas melhores instituições do mundo fizeram isso e concluíram, justamente, que Deus e o sobrenatural não existem.

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  15. Ah, agora sim, você trouxe a pesquisa. Isso é muito bom. Tem gente que fala coisas da própria cabeça. Foi por isso que te questionei.

    Bom, eu tenho que ser sincero com você e dizer que eu provavelmente não irei te oferecer uma resposta satisfatória tão cedo. Porque para isso eu preciso analisar toda a pesquisa detidamente, analisar a metodologia da pesquisar, ter uma noção de quem foram as pessoas entrevistadas, o que elas pensam, quis são seus argumentos, como se tornaram ateístas, onde estudaram e etc. É uma baita de uma pesquisa que eu não sei quando terei tempo e disposição para fazer. Mas para você não achar que fiz desfeita do seu comentário, já moderei e vou responder alguns pontos. Como eu disse, não será uma resposta satisfatória. Sinto muito.

    Em nenhum momento eu chamei de levianos os intelectuais ateus das 200 melhores faculdades do mundo. Eu disse apenas que você deve lidar com a questão de maneira menos leviana. Disse isso supondo que você desconhecesse que a ciência e a filosofia ao longo dos séculos foram construídas por pessoas que acreditavam em Deus. Isso, evidentemente, não é um argumento para a veracidade. Todas elas poderiam estar erradas. Eu apenas o instiguei a estudar os argumentos dessas pessoas e se manter longe do preconceito que alguns (friso, "alguns") ateus possuem contra a religião, como se ser religioso fosse atestado de ignorância, o que não é. Felizmente, você tem mais conhecimento do que eu supus. Então, parabéns! Continue assim.

    Sobre essa maioria de ateus na área filosófica, é claro que muitos deles se tornaram ateus por meio de estudo honesto, longo, profundo e exaustivo sobre a questão. Agora, quantos? Aí eu não tenho como afirmar. De que forma o ambiente ao redor influenciou para que eles chegassem a essas conclusões? Também não tenho como dizer. E isso é algo importante. Na minha faculdade, por exemplo, a maioria das pessoas é de esquerda. Na minha turma original, de 50 alunos, apenas eu era de direita; alguns poucos de centro ou apolíticos. Dos cerca de 40 professores que tive, nenhum era de direita. A maioria esmagadora de esquerda. As aulas estão repletas de pontos de vista esquerdistas. Os trabalhos, as provas, as discussões, as questões, tudo. Autores de direita? Não estudamos. É como se não existissem. Eu desço em outros andares e a situação não é muito diferente. A faculdade está repleta de murais, panfletos e eventos de assuntos da agenda esquerdista. Tenho amigos de direita em outras faculdades e universidades públicas (assim como eu) e que me relatam a mesma coisa. São minoria.

    Se você me perguntar o motivo, eu vou te dizer: todo o ambiente é montado para isso. A cosmovisão absorvida por todas as matérias, pela cultura acadêmica, pela cultura universitária e pelo senso comum dessas pessoas é de esquerda. Isso influencia. "Ah, então, todos os que viraram de esquerda ao entrar ali não estudaram, são levianos e ignorantes?". Não, de forma alguma. Certamente há muitos que estudaram bastante para chegar às suas conclusões. Mas o ambiente à volta influencia deveras, cria uma cultura, forma pessoas que manterão viva essa cultura e isso constroi um ciclo. É o que vejo por experiência própria há cinco anos.

    Então, não há como concluir nada daqui. Quantificar quem crê de cada lado não nos ajuda a entender como essas crenças se formaram, o quanto cada um se dedicou para chegar àquelas conclusões, o quanto o ambiente à volta influenciou. Em vez de perder tempo com isso, julgo melhor estudar as questões em si. E, pelo que vejo, você está fazendo isso. Parabéns e boa sorte!

    Abraços!

    Davi Caldas.


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