terça-feira, 31 de julho de 2012

Um pouquinho sobre os Adventistas do Sétimo Dia

Todas as doutrinas adventistas são baseadas na Bíblia Sagrada que, para nós, é a única regra de fé e prática. Esta pequena postagem tem como objetivo mostrar como as principais doutrinas adventistas estão fundamentadas na Palavra de Deus. Trata-se de um resumo, é verdade, mas está bem explicado e fácil de entender. Dúvidas mais específicas e aprofundadas serão respondidas em outras postagens.


(1) Por que os adventistas do sétimo dia guardam o sábado?



O sábado foi o dia escolhido por Deus para que o homem cessasse seus trabalhos seculares e se dedicasse a Deus, à família e ao próximo (Êxodo 20:8-11). O objetivo é que cada ser humano possa descansar fisicamente, mentalmente e espiritualmente, além de poder ser descanso para o seu próximo também. Por esse motivo é que Jesus insistia que o sábado não era um dia de descaso, mas de descanso. Por isso, era permitido fazer o bem. Um mandamento que nos impedisse de sermos bons, não seria um bom manda-mento, por certo.



Muitos cristãos sinceros acreditam que Jesus Cristo aboliu o sábado após morrer na cruz. Essas pessoas se dividem em dois grupos. Um grupo acredita que não existe mais um dia específico para se guardar. Já outro grupo acredita que esse dia de guarda ainda existe, mas que ele deixou de ser o sábado e passou a ser o domingo, em função da ressurreição de Cristo ter ocorrido no domingo.



Mas a Bíblia mostra que os dois grupos estão errados. Em primeiro lugar, porque não há nenhuma passagem do Novo Testamento que afirme que Jesus aboliu a guarda do sétimo dia semana. A única passagem do Novo Testamento que parece indicar que os sábados foram abolidos (Colossenses 2:16-17), na realidade, se refere a feriados religiosos (que também eram chamados de sábados pelos judeus – ler Levítico 23:26-32 e 37-38, por exemplo), conforme o contexto deixa muito claro.



Em segundo lugar, no que diz respeito à santidade do primeiro dia da semana, a Novo Testamento simplesmente não diz nada. Existem 8 passagens que falam sobre o primeiro dia da semana no Novo Testamento. Nenhuma delas afirma que esse dia ficou no lugar do sábado.



Em terceiro lugar, o simples fato de Jesus ter ressuscitado no domingo, não é uma prova de que o domingo passou a ser o dia de guarda. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Prova, por assim dizer, seria se Jesus dissesse: “Como eu ressuscitei no domingo, agora quero que guardem o domingo, em lugar do sábado”. Mas Jesus jamais disse isso na Bíblia.



Portanto, não há nada que indique que o sábado foi abolido. E ao contrário do que se pensa o sábado não é um fardo. Os fariseus o tinham tornado um fardo, com tradições que não se encontravam nas escrituras. Mas quando Jesus veio, mostrou como que se deve guardá-lo de maneira a satisfazer o ser humano (ler com atenção os textos de Marcos 2:27-28; Mateus 12:9-14).



(2) Por que os adventistas do sétimo dia enfatizam tanto o cumprimento da lei, se não vivemos mais debaixo da lei e sim debaixo da graça de Jesus?



Os adventistas concordam que a lei não tem poder para perdoar, nem para salvar e nem para purificar uma pessoa. Jesus Cristo é o único capaz de nos perdoar perante o Pai, nos salvar da morte eterna e nos purificar através do Espírito Santo. Ele é capaz disso porque se tornou homem como nós, mas sem pecado, e se sacrificou para que nós tivéssemos vida por meio dele. Isso é básico para nós.



Agora, isso não significa que a lei não tem sua função. Conforme Paulo afirma em Romanos 3:20, a lei tem o objetivo de nos mostrar o que é certo e o que é errado. Ou seja, ela é um padrão de conduta. Isso é tão claro no Novo Testamento que o apóstolo João afirma que “o pecado é a transgressão da lei” (João 3:4). Então, ainda há uma lei que deve ser seguida; e quando não a seguimos, estamos pecando.



É claro que as leis civis e as leis cerimoniais contidas na Bíblia não precisam mais ser seguidas porque foram dadas para contextos específicos. As leis civis do Velho Testamento eram leis feitas para o funcionamento de Israel como nação, obedecendo o contexto histórico-cultural. Em nosso contexto, seguimos as leis civis de nosso país e de seus estados membros. As leis cerimoniais eram os rituais judaicos que simbolizavam o sacrifício de Jesus ou a antiga aliança e que, obviamente, se tornaram obsoletos quando Jesus operou o seu sacrifício santo. Mas as leis morais (os 10 mandamentos) continuam de pé. Tiago confirma isso em Tiago 2:8-12. Paulo confirma isso em Romanos 7:7-14 e em Romanos 13:8-10. Jesus confirma isso em Lucas 17:19-20, em Mateus 24:20-21 e em Mateus 5:17-20. 



Assim, quando enfatizamos que existe uma lei, não estamos querendo dizer que essa lei perdoa, salva ou purifica. Isso quem faz é Jesus. A lei apenas diz o que é certo e o que é errado.



Vamos a um exemplo. Digamos que eu pratique um furto. Por que eu sei que o ato de furtar é errado? Porque existe uma lei nos 10 mandamentos que deixa claro que eu não devo furtar. Por isso, eu sei que furtar não é do agrado de Deus. Agora, só o fato de eu saber disso é o suficiente para que eu seja perdoado, salvo e purificado? Não! Para que isso aconteça, eu preciso de Jesus. Eu preciso crer que Jesus morreu por mim para que eu fosse salvo. Eu preciso confessar a Jesus o meu pecado. Eu preciso aceitar que o Espírito Santo trabalhe em mim para que eu me afaste desse pecado.



E quanto à graça? A graça é justamente o fato de que quando eu peco, tenho a condição de ser perdoado por Jesus Cristo. Se existisse apenas a lei, eu jamais poderia ser perdoado, salvo e purificado. Isso é graça. E é uma dádiva imerecida, pois o salário do pecado é a morte, mas se simplesmente confessamos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda a injustiça.



(3) Por que os adventistas do sétimo dia insistem em manter a dieta do Antigo Testamento que Deus havia ordenado aos judeus?



Os adventistas crêem que tudo o que temos é de Deus e que por isso devemos cuidar bem do que temos. A isso chamamos de mordomia. Através da mordomia nós somos convidados a cuidar bem do nosso tempo, do nosso dinheiro, da nossa saúde, do nosso intelecto; tudo isso sempre como uma forma de agradecimento e serviço a Deus, que nos dá todas essas coisas.



Afora isso, a Bíblia deixa bem claro que nós, cristãos, somos o povo escolhido de Deus, raça eleita, além de “o Israel espiritual de Deus”. Sendo assim, é necessário que o cristão seja realmente diferente dos não-cristãos, tal como os judeus deveriam ser diferentes dos povos pagãos.



Tudo isso corrobora para que os adventistas entendam que também devemos ter um cuidado diferente com a saúde. Mas isso não é tudo. O Novo Testamento ainda vai mais longe que o Antigo na questão da nossa santidade, dizendo que o nosso corpo é templo do Espírito Santo (I Coríntios 6:19-20) e que nós devemos manter nossos corpos íntegros (I Tessalonicenses 5:23). Tais coisas não se referem só à pureza sexual, mas a tudo o que se relaciona ao seu corpo; porque todo o nosso corpo é propriedade de Deus, já que ele nos criou, ele nos comprou com o seu sangue e ele habita dentro de nós.



Como se esses motivos não bastassem, ainda é bom ressaltar que não há nenhum lugar no Novo Testamento que indique que as leis de saúde foram abolidas. O que há são passagens mal interpretadas. Por exemplo, a passagem em que Pedro tem um sonho com os animais puros e impuros juntos é muito usada para dizer que as leis de saúde perderam o vigor. Mas a própria passagem deixa claro que o sonho era uma metáfora para uma verdade maior, a saber, que Pedro deveria pregar também para os gentios, pois em Cristo não “há judeu, nem grego”, todos são iguais. Ou seja, o contexto da passagem não tinha nada a ver com leis de saúde, mas com a pregação do evangelho.



Agora, é claro que a igreja adventista não impõe como mandamento aquilo que a Bíblia não diz. Por isso, você não vai ver um adventista sóbrio dizendo que é lei você não comer produtos com agrotóxicos, ou que é lei não beber refrigerante. Essas coisas, embora sejam importantes para a saúde, por não se encontrarem na Bíblia (obviamente), são apenas práticas aconselháveis, mas não impostas pelos adventistas.



Por fim, quando as leis de saúde são seguidas pelo cristão, elas aumentam a sua expectativa e qualidade de vida. Isso é positivo para ele e importante para que Deus possa abençoá-lo. Alguém que não cuida de sua saúde, por exemplo, dificilmente será abençoado com longevidade, boa saúde e cura de doenças. Deus muito faz por nós, mas jamais irá fazer aquilo que nós mesmos precisamos fazer.



(4) Por que os adventistas do sétimo dia não acreditam na imortalidade da alma humana?



Nós, adventistas, não acreditamos na imortalidade da alma porque a Bíblia não sustenta essa doutrina. A Bíblia deixa claro que o homem foi feito a partir da união do barro com fôlego de Deus (Gênesis 2:7 e Gênesis 3:19). Quando essa união é desfeita a pessoa deixa de existir e a sua consciência fica desativada até o dia da ressurreição dos mortos. Isso é enfatizado em diversas passagens como Salmos 146:3-4; Salmo 17:15 Salmo 6:4-5; Salmo 115:17-18; Eclesiastes 3:18-20; Eclesiastes 9:5-6 e 10; Eclesiastes 12:1-7; Isaías 38:18-19; Daniel 12:2; Lucas 8:49-55; Atos 2:25-35; I Coríntios 15:20-26; I Coríntios 15:50-54; I Tessalonicenses 4:13-17; I Timóteo 6:13-16; Hebreus 9:27-28; Apocalipse 20:4-6 e etc.



Com relação às passagens que supostamente provam que o ser humano possui uma parte imaterial que continua viva após a morte do corpo, elas são mal interpretadas e, ainda que não fossem, não afirmam enfaticamente que a alma é imortal. Ora, como se trata de uma doutrina importante seria esperado que a Bíblia dissesse enfaticamente que a alma é imortal, caso ela realmente fosse. Mas o que a Bíblia afirma enfaticamente é que um dia Jesus vai voltar e vai ressuscitar todos os mortos. É nesse dia que aqueles que aceitaram Jesus se tornarão imortais.



(5) Por que os adventistas do sétimo dia não acreditam na existência de um inferno eterno?



A idéia de que Deus preparou um lugar de fogo que queimará eternamente as almas pecadoras não advém da Bíblia. Ela é fruto de (1) crenças das religiões pagãs somadas a (2) más interpretações de passagens bíblicas.



Com relação às passagens bíblicas é necessário começar dizendo que a palavra inferno não existe nos idiomas oficiais em que a Bíblia foi escrita. Ela provém da palavra latina “inferum”, que quer dizer “mundo inferior”; e é utilizada no lugar de três palavras bíblicas oficiais: Sheol, Hades e Geena.



Sheol é uma palavra hebraica e significa literalmente sepulcro, sepultura, lugar inferior. Hades é uma palavra grega e significa a mesma coisa. Quanto à Geena, este era um vale localizado em Jerusalém onde o povo jogava lixo e restos de animais. Por causa do vasto material orgânico que lá havia, o lugar vivia pegando fogo.



Então, todas as vezes que lemos a palavra “inferno” na Bíblia, o texto original se referia ou à sepultura ou à Geena. Até aqui, portanto, nada que indique a existência de um lugar onde os homens vão queimar para sempre.



No caso de Geena, Jesus utilizou essa palavra como metáfora para indicar o que aconteceria com os ímpios. Na época, corpos de criminosos eram jogados no vale de Geena e incinerados. Assim, Jesus queria indicar que o ímpio também seria incinerado no último dia. Isso nem de longe indica que o ímpio queimará eternamente até porque, se o fogo consome algo, um dia esse algo terminará de ser consumido. É lógico. 



Com relação a expressões como “fogo eterno”, “fogo inextinguível”, “queimar pelos séculos dos séculos” e etc., todas elas, no grego, apresentam o mesmo radical, a saber, aión (eterno). E a palavra aión tem um sentido que vai pode diferir dependendo de a quem ou ao quê ela é aplicada. Por exemplo, se aplico a palavra aión à existência de Deus, isso significa que Deus nunca morrerá. Agora, se aplico essa palavra à queima de palha do meu celeiro, isso significa que a palha queimará “eternamente” enquanto houver palha para queimar.



Em outras palavras, se algo não é eterno por natureza, não pode queimar para sempre. Queimará até onde existir. A expressão é utilizada dessa maneira para mostrar o caráter da punição do ímpio. Ela não é uma espécie de purgatório, no qual o ímpio queimará um pouco e depois poderá ir para o céu. Não. Ele queimará “eternamente” sem que nada atrapalhe essa queima. E quando essa queima acabar, o ímpio não existirá nunca mais. Não haverá volta.



(6) Os adventistas do sétimo dia acreditam na Trindade?



Com certeza. Nós acreditamos na Trindade porque a Bíblia é muito clara a este respeito, mostrando que Jesus é um com o Pai e com o Espírito Santo, e que os três são iguais em essência, poder e existência; pois formam o mesmo Deus.



Infelizmente muitos cristãos nos associam às Testemunhas de Jeová. Mas isso pode ser facilmente refutado através das 28 crenças fundamentais adventistas, que é um documento no qual mostramos as principais doutrinas bíblicas em que cremos; ou então através dos livros da escritora Ellen White, uma mulher extremamente importante no desenvolvimento da igreja adventista do sétimo dia. Nesses locais é possível averiguar que a igreja adventista crê plenamente na Trindade.



(7) Os adventistas se guiam pelos livros de Ellen White?



Definitivamente não. A igreja adventista crê que apenas na Bíblia está a Palavra de Deus. Por conseguinte, tudo o que qualquer pessoa fale deve estar de acordo com o que está escrito na Bíblia. Se não estiver, não será seguido.



A senhora Ellen White foi uma peça importante no desenvolvimento da igreja adventista, pois era uma cristã fervorosa e que, ao longo de sua vida, recebeu visões por parte de Deus. Não obstante, isso não faz dela a mulher mais perfeita que já existiu e muito menos alguém que deva ser adorada. Ela foi simplesmente um ser humano como nós. E seus escritos só são de serventia para os adventistas porque estão todos baseados na Palavra de Deus (a Bíblia). Não fosse assim, seriam renegados.

39 comentários:

  1. Sou católico, e me interesso por conhecer outras religiões. Gostei muito do seu texto, mas ele me trouxe algumas dúvidas. Eu poderia listar todas de uma vez, mas seria improdutivo, então vou colocar uma por uma, ok?

    A primeira é a seguinte: se Jesus prometeu que estaria conosco todos os dias, até o fim do mundo (Mt 28,20), como ele pôde deixar sua Igreja caminhar no caminho errado por tanto tempo, só se revelando 18 séculos depois de morrer? Isso não contraria a promessa feita?

    Obrigado!

    ResponderExcluir
  2. Olá, “Feio” (ai, é ruim chamar uma pessoa de feio, rsrs).
    Primeiramente, obrigado pelo comentário e pelo elogio. Também acho muito legal sua postura de conhecer mais sobre outras religiões. É bem honesta.

    Bem, minhas respostas costumam ser grandes. Então, prepare-se para ler um pouquinho, rsrs. Vamos ao que interessa.

    O contexto de Mateus 28:18-20 diz assim: “Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século”.

    Acho que a melhor forma de entender essa promessa de Jesus é ter em mente que Jesus estar com o ser humano não garante que o ser humano irá trilhar sempre pelos caminhos certos. Até porque, muitas vezes Jesus está com os homens, mas os homens não estão com Jesus. Exemplo disso são os fariseus, que eram líderes religiosos (nos dias de hoje, seriam como padres e pastores). Eles tiveram a chance de estar perto de Jesus por três anos e meio, mas isso não os impediu de blasfemarem contra ele e o condenarem a cruz.

    A coisa não mudou depois que Cristo terminou seu ministério na terra, precisamente porque o ser humano não mudou. Paulo diz em Romanos 3:10 que não há “um justo sequer” nessa terra e em Romanos 7:15, 18, 19 e 21 que o mal reside em nós e que é difícil fazer o certo. Essa é a natureza do homem. Então, desvios, obviamente, iriam ocorrer dentro da igreja de Cristo.
    O próprio Cristo discursa sobre o joio e o trigo (Mateus 13:24-40) e sobre as virgens néscias (Mateus 25:1-13). Isso se refere há desvios dentro da própria igreja dele.

    ResponderExcluir
  3. Agora, isso não quer dizer que Jesus se apartou do homem durante 18 séculos. E talvez a maior prova disso esteja nas “7 cartas do apocalipse”. Já ouviu falar? É muito interessante. No capítulo 2 e no capítulo 3 de apocalipse existem 7 cartas para 7 igrejas da época (ano 100 d.C., mais ou menos). Em cada uma das cartas existe uma descrição de como era a igreja e no que ela deveria mudar para melhor. Até aí, nada demais. Só que se você reparar, cada igreja dessa representa um período do cristianismo ao longo dos séculos. Se pegarmos, por exemplo, a carta a igreja de Esmirna (Apocalipse 2:8-11), vemos claramente ali descrito o período em que o Império Romano mais perseguiu e matou cristãos (303-313).

    Então, o legal é ver que em cada uma dessas descrições, Jesus mostra a sua preocupação com o período, fala dos problemas enfrentados, encoraja os que são sinceros (que querem mesmo segui-lo), fala do que precisa ser mudado e faz uma promessa ao fim da carta aos que permanecerem firmes. Ou seja, ele esteve em todas as épocas, acomanhando tudo bem de pertinho.

    A grande questão é: No mundo nós passaremos mesmo por aflições, como disse Jesus. Isso inclui ter que lidar com desvios dentro da própria igreja. Mas devemos ter bom ânimo porque Jesus venceu o mundo (João 16:33).

    Se esqueci alguma coisa, é só falar.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  4. Valeu pela resposta, Davi. Mas como não me considero respondido ainda, vou colocar mais alguns pontos:

    O ponto principal é o fato de que a doutrina estar errada (justamente o que considero complicado na sua visão) é uma coisa, e o fato de os homens não seguirem fielmente uma doutrina (nisso concordamos totalmente) é outra coisa, bem diferente.

    Seu exemplo dos fariseus ilustra isso muito bem: Jesus deixou um recado (a doutrina), mas os fariseus não a seguiram. E mesmo os apóstolos, que a seguiram, continuaram cometendo falhas contra a doutrina (pecados), pois isso faz parte da natureza humana.

    Agora: Jesus permitir que eles pregassem a *doutrina* errada por 18 séculos pra só então se manifestar a respeito? Isso me parece um tanto estranho...

    Não consigo entender como Deus manda seu Filho para cá para deixar uma doutrina, mas não se preocupa com o fato de essa doutrina ter sido mal interpretada por séculos.

    Eu continuo achando que se trata de uma promessa não cumprida. Afinal, Ele pediu para os apóstolos seguirem "ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado", mas eles ensinaram tudo errado por 18 séculos, e só depois da criação da Igreja Adventista é que finalmente alguém passou a ensinar a doutrina correta.

    Isso me parece totalmente bizarro... O que não significa que seja falso, claro. Mas a pergunta que surge é: por que Deus faria isso? Por que não dar o recado correto logo de cara?

    Quanto às 7 cartas do apocalipse, nunca tinha ouvido falar. Procurei no Google e encontrei alguma coisa, mas preferi não estudar por não saber se é exatamente o que você está falando. Se puder colocar um link pra eu dar uma estudada, eu agradeço.

    Abraço!

    ResponderExcluir
  5. Então, “feio”, entendi sua dúvida. Você questiona por que Deus não falou de cara que a doutrina estava errada, mas esperou 18 séculos para isso. Mas isso é um entendimento simplista do que realmente aconteceu ao longo da história. Se formos estudar a Bíblia e a história, veremos que os erros doutrinários surgem justamente do fato dos homens não serem perfeitos.

    Por exemplo, antes de Jesus vir a terra, vários profetas como Isaías, Daniel, Miquéias e etc., falaram sobre a vinda do Messias. E embora o estudo atento desses textos deixe claro que em dado momento o Messias sofreria muito e seria pobre (o que se refere à sua primeira vinda), os líderes religiosos passaram a fazer uma interpretação unilateral das profecias e a ensinarem que o Messias viria como um grande rei, que libertaria o povo da opressão e fundaria um reino terreno. Por esse motivo, não aceitaram Jesus, pois ele foi pobre e não virou um rei terreno.

    Então, veja que o erro humano acarretou um erro de doutrina, erro grave, que levou o povo judeu a não aceitar Jesus como o Messias. Está tudo conectado. E eu poderia citar muitos outros erros doutrinários (que o próprio Jesus Cristo citou) que os fariseus pregavam e espalhavam. E a mesma coisa acontece depois que Jesus ascende aos céus.

    Agora, isso não quer dizer que Deus ficou de braços cruzados durante esses desvios de doutrina na história de Israel e posteriormente da Igreja. Deus está sempre levantando homens para apregoarem as santas verdades que vão sendo deturpadas e esquecidas com o tempo. Na época de Israel, Deus levantava profetas e durante a história da Igreja Deus sempre manteve pessoas que guardavam a apregoavam as santas verdades.

    O problema é que na medida em que a verdade é deturpada e ignorada, o retorno à doutrina verdadeira fica mais difícil. Muitas pessoas começam a se preocupar mais em provar que estão certas do que em descobrir se realmente estão seguindo à verdade. Aí, acabam legitimando e ajudando a espalhar mais a mentira.

    Então, o que vemos durante a história não é Deus parado, esperando chegar os anos 1800 para fazer alguma coisa; e sim Deus trabalhando para mudar a situação desde quando a Igreja começou a se desviar de algumas doutrinas. Eu poderia citar aqui vários grupos de cristãos levantados por Deus ao longo do tempo que ajudaram Deus nesse gradual processo de retorno à verdade, como os grupos cristãos que foram perseguidos pela igreja romana por não quererem se submeter aos erros da mesma (sobretudo, entre os anos de 321 e 538), os Valdenses (lá pra meados de 1200), os reformadores (entre 1400 e 1600) e etc.
    Foi um processo histórico longo e gradual. De forma alguma foi uma ação abrupta de Deus apenas nos anos 1800, depois de “dormir” por 18 séculos.

    Quanto às 7 cartas, vou postar algo aqui no blog sobre isso. Aí você pode ter uma noção do processo histórico de que estou falando.

    Espero ter ajudado. Sinta-se à vontade a perguntar mais.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  6. P.S.: Vale lembrar também que os erros doutrinários só começaram a ser oficializados na igreja depois que a igreja se misturou ao Estado romano. E essa mistura da igreja com o Estado romano foi um processo que demorou cerca de 500 anos para se concretizar. Até este ponto, muito cristão foi morto e perseguido por ver que a união entre igreja e estado não ia ser benéfica para a conservação das santas doutrinas que Jesus havia deixado.

    ResponderExcluir
  7. O processo histórico eu conheço. Não a fundo, mas em linhas gerais (não sei se você conhece, mas o livro "A Igreja dos Apóstolos e dos Mártires", de Daniel-Rops, é o volume 1 de uma obra incrível de 10 volumes sobre a história da Igreja; o viés é católico, mas você vai aproveitar bastante mesmo assim). Certamente houve muitas doutrinas diferentes sobre as mesmas coisas, disso não há dúvida.

    Quanto aos erros de doutrinas do Antigo Testamento: eu as acho aceitáveis porque a doutrina ainda não estava fechada. Jesus deixa isso bem claro em Mt 19,8, por exemplo. A evolução gradual da doutrina era necessária até que a humanidade chegasse a um ponto de poder aceitá-la filosoficamente.

    Na história do judaísmo, os livros apareciam gradualmente, e você não sabia se a revelação tinha se completado ou não. O cânon judaico ainda não tinha sido "fechado" na época de Jesus.

    Já no Novo Testamento, a nova aliança foi revelada praticamente numa tacada só. Não vejo sentido em esperar novas revelações divinas se ele não envia mais profetas. Se sua Bíblia incluísse outros livros, com os ensinamentos de profetas pós-Jesus, eu acharia a doutrina mais consistente, mas isso não acontece...

    A partir do ponto em que o próprio Filho de Deus veio aqui "dar um recado", não me parece fazer mais sentido esse tipo de "estratégia" por parte de Deus. É claro que eu posso estar errado, pois não conheço Seu pensamento, mas não me parece coerente Jesus dizer que é "a Verdade", e mandar que os apóstolos preguem essa verdade, sendo que ela ainda não tinha sido compreendida direito pelos apóstolos.

    Bom... De qualquer maneira, acho que já chegamos a um ponto onde eu expus o que penso e você também. Como meu objetivo aqui não é te convencer, acho que esse assunto já deu, pelo menos pra mim, pois meu objetivo já foi alcançado: entendi sua forma de pensar, apesar de não conseguir concordar com ela...

    Vou esperar alguma outra resposta sua antes de mandar mais perguntas, ok? Senão os assuntos ficam misturados e dá uma confusão danada.

    Só uma correção: os erros doutrinários ocorreram logo de início no cristianismo. Isso não começou depois que a Igreja se misturou ao estado não: isso aconteceu já na primeira geração de cristãos. Um bom exemplo disso é a Epístola aos Gálatas, que começa com uma bronca homérica, e que foi escrita entre 55 e 60, ou seja: menos de 30 anos após a morte de Jesus.

    Fica bastante claro (pelo menos pra mim) que São Paulo tinha essa noção (ou seria uma ilusão?) de que conhecia a Verdade revelada plenamente, a ponto de se sentir na obrigação de corrigir os desvios dos Gálatas.

    Cara, é muito bom encontrar gente como você internet afora. Isso é tão raro, principalmente em assuntos religiosos...

    Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  8. Ah, legal, acho que estamos chegando a algum lugar. Eu só preciso deixar alguns pontos mais claros. Vou me alongar um pouco, mas acho que vai ser produtivo. Vou começar dizendo no que eu acredito como sendo adventista do sétimo dia.

    Eu acredito que a primeira igreja na terra que existiu foi a igreja apostólica (formada pelos apóstolos e pelas pessoas que viveram na mesma época que os apóstolos). Estou pondo esse nome (igreja apostólica) só pra gente se situar, já que na época não existia denominações e igrejas institucionais como temos hoje.

    Essa igreja apostólica (ou primitiva, se preferir), tinha como seus líderes principais os discípulos diretos de Jesus e algumas pessoas que o seguiam quando ele ainda estava na terra. Também teve Paulo, que acabou se tornando uma ferramenta de pregação para os gentios, Apolo (que é citado por Paulo), Timóteo (que foi discípulo de Paulo) e etc.

    Até pelo menos o ano 100d.C., a configuração da Igreja de Cristo era basicamente essa: um movimento que era expandido por pessoas que viveram na época de Jesus e/ou na época dos seguidores diretos de Jesus. Esse movimento era verdadeiro. Tudo o que ele pregava estava de acordo com o que Jesus disse e, quando havia alguma dúvida, elas eram tiradas com reuniões, oração e jejum (como foi com a questão da circuncisão, que está descrita em Atos 15:1-35).

    Agora, obviamente, paralelo a esse movimento principal, surgiam todos os dias muitas seitas, pregando doutrinas estranhas ao evangelho puro e verdadeiro de Jesus. Mas elas eram vigorosamente combatidas pelos principais líderes da igreja apostólica (Paulo, Pedro, Tiago e etc). E essa igreja apostólica era a que mais crescia dentre todos os movimentos heréticos que se diziam cristãos (Pedro, por exemplo, converteu três mil pessoas em sua primeira pregação).

    Então, os discípulos diretos de Cristo e seus seguidores do primeiro século (mesmo aqueles que não o conheceram pessoalmente), cumpriram direitinho aquilo que Jesus lhes ordenou. Espalharam o evangelho, combateram as mentiras e heresias que surgiam todos os dias, mantiveram contato uns com outros e tomaram cuidado para fazer tudo conforme Jesus havia dito. Essa é a primeira crença que tenho como adventista (baseada no que vejo na Bíblia) que queria expor.

    Então, quando você falou “não me parece coerente Jesus dizer que é ‘a Verdade’, e mandar que os apóstolos preguem essa verdade, sendo que ela ainda não tinha sido compreendida direito pelos apóstolos”, você me entendeu errado. Eu acredito que os apóstolos eram os que melhor compreendiam a doutrina e os que mais se empenhavam em combater heresias e erros doutrinários. Sem dúvidas.

    ResponderExcluir
  9. Mesmo assim, a igreja principal (vamos chamar assim) permaneceu mais forte do que as seitas, mas já com alguma influência de fora. A primeira carta a Éfeso (lembra que te falei das 7 cartas do apocalipse?) deixa bem claro o que aconteceu nesse período. Todo aquele gás contra as mentiras e heresias diminuiu um pouquinho (eu vou ver se posto isso ainda hoje. O texto está pronto. Só preciso revisar. Aí coloco o link aqui pra você dar uma lida quando tiver tempo).

    Conforme o tempo foi passando, a coisa foi ficando pior. As heresias foram entrando mais, o número de pessoas que as aceitavam foi ficando maior e quando o Estado começou a se misturar com a igreja, aí processo de desvio doutrinário começou a se oficializar. Foi isso o que quis dizer quando expressei: “os erros doutrinários só começaram a ser oficializados na igreja depois que a igreja se misturou ao Estado romano”. Antes não era oficial, porque os erros eram combatidos pela espinha dorsal da Igreja. Mas depois eles passaram a ser incorporados pelos próprios líderes (contrariando os ensinos dos primeiros cristãos, que se pautavam na Bíblia).

    Sei que você é católico (e respeito muito isso), mas entre esses erros que se tornaram oficiais (depois de um processo bem lento e gradual que se iniciou após a morte dos primeiros cristãos), eu acredito que estão a abolição do sábado (que era guardado pelos apóstolos), a aceitação do estado consciente dos mortos (doutrina de origem babilônica, que já influenciava alguns fariseus da época de Jesus) e etc. Não existe embasamento bíblico para essas doutrinas e não há nada que prove no Novo Testamento que essas doutrinas eram defendidas e ensinadas pelos apóstolos. Porém, elas começaram a ser debatidas e defendidas aos poucos por cristãos pós-apostólicos, até serem aceitas por uma maioria e, finalmente, acopladas pela Igreja. Aí se tornou oficial.

    Não estou dizendo que estou certo sobre a veracidade dessas doutrinas (até porque a discussão aqui não é essa). Só quero deixar claro no que acredito, para poder tirar suas dúvidas.

    Então, em resumo, eu creio que:

    1) Os discípulos diretos de Cristo e os primeiros cristãos, até cerca do ano 100d.C. (ou até um pouco mais adiante), pregaram exatamente o que Jesus ensinou (afastando com força as mentiras e heresias que surgiam a cada dia). Podemos chamar esse primeiro período de Igreja Apostólica.

    2) Após a morte dos primeiros cristãos, a Igreja passou a sofrer um pouco mais com as heresias e mentiras de fora e, em um processo gradual, algumas doutrinas extra-bíblicas foram sendo aceitas pelos líderes.

    3) Deus sempre manteve pessoas que defendiam a doutrina certa, mas essas pessoas foram sendo “sufocadas” através do tempo, por causa da adesão de mais e mais pessoas a essas mentiras, tornando sempre mais difícil a missão de resgatar algumas verdades bíblicas que os apóstolos defendiam.

    Peço perdão por ter me alongado tanto, mas como vi que você me interpretou errado em algumas partes, tive que escrever sobre o que exatamente creio. Espero ter tirado suas dúvidas.

    A propósito, obrigado pelo elogio. Também fico muito feliz de discutir (construtiva e educadamente) assuntos religiosos com você. Se mantivermos esse nível, a conversa vai fluir muito bem por aqui.

    Abraços, irmão!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Demorei mas voltei... =)

      E acho que entendi quase tudo agora. =)

      Como é de se esperar: quanto à "primeira crença", estamos plenamente de acordo, mas quanto à "segunda crença", nós divergimos.

      O que eu não entendo (e gostaria de entender) nos adventistas é esse "ceticismo seletivo". Tomemos por exemplo o domingo, que você citou:

      Vocês rejeitam a definição feita formalmente por Constantino em 325, mas aceitam o cânon bíblico, "fechado" formalmente em 393. Porém, Inácio de Antioquia já citava a substituição do sábado pelo domingo em sua "Carta aos Magnésios", escrita antes do ano 110 (alguns dizem 101, outros 107, há divergências). Justino de Roma diz o mesmo no capítulo 67 de "I Apologia", do ano 155.

      Por outro lado, a referência mais antiga do cânon com os 27 livros é a Carta de Páscoa, de Atanásio, datada do ano 367; antes disso, há vários outros cânones citados, mas todos com alguma diferença da "versão final".

      Note que a definição do domingo é muito anterior à definição do cânon, mas vocês rejeitam a primeira e aceitam a segunda. Sinceramente, não entendo por que aceitar a autoridade da Igreja primitiva em um caso mas não em outro...

      No mais, não há por que pedir perdão pelo tamanho do texto. Eu é que agradeço a paciência e caridade de explicar todos esses detalhes!

      No mesmo espírito de caridade, me sinto compelido a fazer uma sugestão: como vocês não são adeptos da Sola Scriptura (estou certo?), e dão valor às crenças dos primeiros cristãos (antes de o Estado se misturar à Igreja), sugiro que você pesquise os documentos citados acima e veja com os próprios olhos o que os primeiros cristãos diziam. Provavelmente você vai se surpreender com o que vai encontrar... E se houver mais interesse nesse caso do domingo, tem um link aqui: http://www.veritatis.com.br/apologetica/120-protestantismo/631-dia-do-senhor-sabado-ou-domingo

      Quanto a quem está certo: ambos temos fé que estamos, e buscamos honestamente a Verdade. Tenho a confiança que a misericórdia divina não condenará esses erros honestos. Seja você ou eu (ou ambos, quem sabe?) o errado, se nós procuramos com todas as forças encontrar a Verdade, creio que qualquer erro honesto será relevado...

      Quanto ao Apocalipse, vou ler e comento por lá se achar necessário. Mais uma vez obrigado.

      Um grande abraço!
      Zé (esqueci de dizer isso antes, pra não te obrigar a me chamar de "feio" =D)

      Excluir
  10. "Feio", como prometido, aqui está o link com a postagem sobre as 7 cartas do Apocalipse.

    http://mundoanalista.blogspot.com.br/2012/09/estudos-sobre-o-apocalipse-parte-1-as.html

    É a primeira parte de uma série de estudos sobre o Apocalipse que pretendo postar. Sinta-se livre para ler, analisar, opinar e criticar. Vou me esforçar para responder todos os questionamentos que possam surgir, sempre com base na Bíblia e no pensamento lógico-racional.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  11. Rapaz, que bom que você voltou. Eu cheguei a pensar que tinha perdido um amigo de debates, rsrs. Quero fazer algumas observações sobre o seu comentário. Você disse assim:

    “O que eu não entendo (e gostaria de entender) nos adventistas é esse ‘ceticismo seletivo’. Tomemos por exemplo o domingo, que você citou: Vocês rejeitam a definição feita formalmente por Constantino em 325, mas aceitam o cânon bíblico, "fechado" formalmente em 393”.

    Vamos com calma. Primeiro, existem bons motivos para aceitar esse cânon do Novo Testamento que tanto católicos como protestantes usam. Vou citar só alguns:

    (1) ele é feito de livros e epístolas que foram escritos por discípulos diretos de Jesus e discípulos dos discípulos. Foram pessoas, de fato, contemporâneas a Jesus de Nazaré. Isso dá credibilidade à mensagem porque não há ali opiniões e interpretações de comentaristas que viveram posteriormente, mas sim a Palavra pura de Jesus;

    (2) esses livros são coerentes entre si e coerentes com o Antigo Testamento. A Bíblia é o princípio básico dos adventistas justamente por isso. Ela se completa com perfeição, sem que haja contradições. Não só entre os livros do Novo Testamento, mas entre os livros do Antigo Testamento. Isso prova inspiração divina não só sobre quem escreveu os livros, mas sobre quem, posteriormente, os uniu em um cânon só;

    (3) os livros que fecharam o cânon do Novo Testamento foram divulgados vastamente pelo mundo. Só na língua original grega, existem mais de 5700 cópias de livros e fragmentos de livros muito próximos da escrita dos originais, que contém a mesma mensagem (o que dá credibilidade a informação contida ali – se tivessem divergências significaria que a mensagem foi sendo deturpada com o tempo);

    (4) nem tudo o que a Igreja que se misturou com Estado fez foi ruim. Na verdade, a Igreja de todas as épocas sempre teve cristãos maravilhosos. Eu não sou católico, mas me amarro nos escritos de Santo Agostinho, Tomás de Aquino, Anselmo de Cantuária e etc. Eles eram cristãos verdadeiros, muito inteligentes e que contribuíram muito para o evangelho. Com certeza eram cheios do Espírito Santo também e mesmo que defendessem algumas ideias erradas, sem dúvida fizeram honestamente e eu sei que os encontrarei no céu. Não há sentido em um adventista rejeitar tudo o que os católicos dizem só porque acredita que essa igreja contém alguns erros doutrinários. Não é nem uma atitude cristã fazer isso.

    Então, não vejo problema em os adventistas, tal como os protestantes, aceitarem o cânon do Novo Testamento. Basta dar uma lida rápida ali para constatar como que aquilo é de inspiração divina. Não há acréscimos humanos. A mensagem é perfeita. Assim, não se trata de “ceticismo seletivo”, mas sim de aceitar o que tem boas evidências de ser verdadeiro.

    Aliás, é interessante ressaltar que Paulo afirma: “Julgai todas as coisas, retende o que é bom” (I Tessalonicenses 5:21). Algumas versões trazem: “Examinai”. Isso significa que antes de aceitar qualquer coisa devemos ver se realmente aquilo é válido. Se é válido, retemos. Se não é, jogamos fora. Creio que aceitar o canôn, com base nos argumentos plausíveis que mostrei, é fazer, precisamente, o que Paulo aconselhou.

    ResponderExcluir
  12. Agora, quanto à questão do domingo, vejamos: Não há nada na Bíblia (que aceitamos como sendo inspirada divinamente) que diga que o sétimo dia da semana foi abolido por Jesus ou que Jesus mandou substituir o sétimo dia pelo domingo. Você só encontra comentaristas que não foram discípulos diretos de Jesus (nem discípulos dos discípulos), afirmando que os cristãos passaram a guardar o domingo em vez do sábado. Mas eles não provam, através dos escritos de Paulo, Pedro, Tiago, João, Judas e os evangelistas que foi Jesus quem ordenou que isso fosse feito. Eles só narram que os cristãos passaram a fazer e tentam justificar isso, dizendo que foi porque Jesus ressuscitou nesse dia.

    Aí está o problema. Se algum deles provasse, na Bíblia, que Jesus autorizou a mudança, beleza. Mas se eles só dizem que mudou, então não dá para dizer que a mudança tem base bíblica. E por que eu acreditaria na tradição de comentaristas bíblicos, em vez de crer em Jesus Cristo e nos próprios apóstolos diretos de Jesus? Isso me faz lembrar de quando Jesus Cristo disse aos fariseus em Mateus 15:3: “Por que transgredis vós também o mandamento de Deus, por causa da vossa tradição?”.

    Mas o assunto realmente merece um estudo mais amplo. Vou te pedir o seu email e o seu facebook (se você tiver) e te mandarei um livro muito bom que tenho sobre a mudança do sábado para o domingo. Em suma, o autor explica que o processo teve várias fases. A primeira fase ocorreu em função da crescente distanciação entre os cristãos e os judeus, o cristianismo e o judaísmo. Inclusive, o autor faz uma análise minuciosa sobre o pensamento de Inácio, Barnabé e Justino Mártir, mostrando que esses pais da igreja foram muito influenciados por certa antipatia pelo judaísmo (e pelos judeus). Assim, não me admira que eles interpretassem o sábado como tendo sido abolido. Então, tal como eles influenciam a sua opinião hoje, com certeza influenciaram a opinião de muita gente com seus escritos.

    ResponderExcluir
  13. De modo rápido eu posso citar aqui vários pontos que contribuíram para que o sábado fosse sendo rejeitado e o domingo aceito.

    Primeiro: No final do primeiro século, os cristãos já não visitavam sinagogas, como costumavam fazer Paulo, Silas, Timóteo e etc. Não dava mais, pois o cristianismo foi mesmo rejeitado pelo judaísmo e agora se tratavam de duas religiões diferentes. E como os judeus passaram a hostilizar muito os cristãos, a antipatia dos cristãos para com os judeus e o judaísmo também cresceu.

    Segundo: os judeus, ao longo dos últimos séculos, haviam transformado o dia de sábado em um dia cheio de pesados fardos (que não estavam baseados nas Escrituras, vale lembrar). Isso contribuiu para que cada vez mais novos conversos vissem o sábado como mais uma das velharias judaicas a ser abandonada.

    Terceiro: com a distanciação entre judaísmo e cristianismo, o número de judeus que se convertiam diminuiu muito. A maioria esmagadora dos conversos eram gentios. Isso também contribuiu para que o sábado fosse se perdendo. Até porque, nas pregações cristãs, se enfatizava mais o evangelho de Jesus (e com razão). Então, Jesus e judaísmo passaram a ser dois polos distintos. Aí o pagão aceitava Jesus, mas não recebia orientação quanto a guardar o sábado. E como o tema não era muito debatido, a tendência era que o dia fosse esquecido.

    Quarto: antes do domingo começar a ser visto como um dia de guarda (com caráter sabático), ele era visto como um dia para se comemorar a ressurreição. Era por isso que, antes de sair para trabalhar, os cristãos costumavam acordar mais cedo, no amanhecer do primeiro dia, para fazer um pequeno culto relembrando a ressurreição. Mesmo aqueles que guardavam o sábado, mantinham essa tradição. Isso elevou a importância do domingo aos poucos. Há alguns relatos, inclusive, de cristãos que, posteriormente, passaram a guardar o sábado e o domingo (se eu não me engano, os cristãos da Etiópia fizeram isso).

    Quinto: más interpretações de passagens bíblicas. Por exemplo, a famosa passagem de Colossenses 2:16-17, que fala que ninguém deve ser julgado por comida, bebida, festas, luas novas e sábados. Uma leitura rápida nos leva a pensar que esses sábados se referem ao sétimo dia da semana. Mas uma análise mais detida nos revela que os feriados religiosos judaicos eram chamados de sábados (pois sábado significa “cessar”) e pelo contexto da passagem, é evidente que Paulo está falando sobre rituais e não sobre o mandamento moral do sábado.

    Sexto: os judeus tinham duas “marcas registradas” que os diferenciavam dos outros povos: a guarda do sábado e a circuncisão. Sabemos que a circuncisão não vale mais porque ela era símbolo do compromisso de Deus com o povo Judeu (e na Nova Aliança, a “nação” de Deus são todos os cristãos). Mas o sábado é um mandamento de cunho moral. Tanto que foi dado entre os dez mandamentos. Entretanto, por ser uma “marca registrada” dos judeus, os cristãos passaram a encarar a guarda do sábado como um ato ritualístico (igual a circuncisão).

    Sétimo: com a morte dos discípulos de Cristo e dos discípulos dos discípulos, não havia mais a quem perguntar sobre a questão do sábado. Será que era tão importante guardar o sábado mesmo? As pessoas foram concluindo por si mesmas que não.

    Oitavo: Se por um lado os cristãos se distanciaram dos judeus, por outro lado a aproximação com os gentios levou-os a serem influenciados pelo “dia do sol” pagão. As religiões pagãs adoravam o deus sol justamente no primeiro dia da semana. Como Jesus também ressuscitou no primeiro dia, a aproximação foi muito natural. Tanto que Justino, em uma de suas epístolas, enfatiza que os cristãos se reúnem no “dia do sol”.

    ResponderExcluir
  14. Quanto ao princípio “Sola Scriptura”, ele é: se basear só na Bíblia. Como já afirmei, existem bons motivos para crer que os cânons são inspirados. Um deles é o fato de que seus autores foram discípulos diretos de Jesus ou discípulos dos discípulos. Por esse motivo, defendemos que qualquer coisa que esteja fora da Bíblia é inválida. Esse era o mesmo princípio de Jesus, que baseava tudo o que ia falar nas Escrituras Judaicas.

    Sendo assim, a aceitação do que falaram cristãos que não foram discípulos de Jesus, nem discípulos dos discípulos (e que não estão baseados nos mesmos), não faz muito jus ao princípio sola scriptura. Deve-se estudá-los a fim de saber como foi o processo de mudança do sábado para o domingo, mas não para saber se a mudança foi biblicamente válida ou não. Isso deve ser visto na Bíblia.

    Se formos aceitar tudo o que disseram estes cristãos, teremos que aceitar, por exemplo, a tese de Justino de que o sábado foi criado apenas para punir os judeus e que antes de haver Israel, não se guardava o sábado. Também teremos de aceitar a tese de Orígenes de que o Maná não caía no sábado, para o povo do deserto, porque isso era um símbolo de Deus preferia o domingo. Ora, se você lê a Bíblia, sabe essas ideias são por demais contrárias ao que a Bíblia diz.

    Então, creio que a primeira coisa que devemos fazer para discutir a questão do sábado, não é recorrer aos pais da igreja, mas sim à Bíblia. Vou fazer uma postagem mais detalhada sobre isso, mas eu posso citar um texto aqui, do Novo Testamento, que evidencia que o sábado não foi abolido por Jesus. Está em Mateus 24:20-21:

    “Orai para que a vossa fuga não se dê nem no inverno e nem no sábado; porque nesse tempo haverá grande tribulação, como desde o princípio do mundo até agora não tem havido e nem haverá jamais”.

    Aqui, Jesus está profetizando (para os seus 12 discípulos) sobre a destruição de Jerusalém pelos romanos que só ocorreria quase 40 anos depois de seu sacrifício (no ano 70 d.C.). E veja que Jesus se preocupava que a perseguição pudesse ocorrer no inverno ou no sábado. Por quê? Bem, se fosse no inverno, seria ruim para os fugitivos; passariam frio. Se fosse no sábado, eles teriam que passar o dia sagrado de descanso, fugindo, o que era ruim tanto para eles, quanto para Deus. Agora, faria sentido Jesus ter essa preocupação se o sábado, após seu sacrifício, tivesse sido abolido? Claro que não. Se Jesus disse para orar para que a fuga não se desse no sábado é porque 40 anos após a sua morte, o sábado ainda estaria de pé.

    Se formos considerar o caráter “dupla face” dessa profecia (muitas profecias da Bíblia são previsões de dois eventos em uma só narrativa) e entender que Jesus também se refere a perseguição dos cristãos no finzinho dos tempos, fica ainda mais claro que o sábado ainda está de pé.

    Esse é só um dos textos do Novo Testamento que evidenciam a validade da guarda do sábado. Vou fazer uma postagem sobre o assunto e aí a gente pode discutir a interpretação das passagens. Quanto ao link que você me mandou, eu agradeço muito por ter me enviado. Na verdade, eu já o tinha lido uma vez, mas agora posso poder fazer uma refutação sistemática dele em uma postagem. O artigo não é muito profundo e contém alguns erros primários, mas que podem passar despercebidos. Vou tentar postar ainda hoje.

    Zé (ah, bem melhor te chamar de Zé), muito obrigado pelo debate. Estou achando muito produtivo. Continue voltando. :D

    ResponderExcluir
  15. P.S.: Zé, terminei o texto referente à refutação do link que você me enviou. Vou colocar o link aqui para você ler. Está em duas partes. Sinta-se à vontade para criticar.

    http://mundoanalista.blogspot.com.br/2012/09/refutando-alguns-argumentos-anti.html

    Abraços.

    ResponderExcluir
  16. Davi, mais uma vez muito obrigado pela paciência.

    Dessa vez, vou ficando por aqui. Acho que a discussão já chegou num ponto que não será muito produtiva.

    Eu teria várias questões a levantar (o fato de a Sola Scriptura ser auto-contraditória, por exemplo), mas vejo que isso não vai dar muitos frutos.

    Caso você tenha interesse em debates desse tipo (eu não gosto muito, entrei aqui pra tentar conhecer melhor, não pra "refutar"), acho que seria frutuoso que você falasse lá com o pessoal da Veritatis (site onde está o link que eu mandei). Sei que há vários colaboradores por lá que vieram de denominações protestantes. Com eles você vai poder entender e discutir o motivo que os fez se converterem ao catolicismo. Talvez sejam pessoas que não conheciam bem suas crenças (já vi vários casos parecidos, perdidos principalmente pra esse ateísmo militante), mas se você tem interesse, provavelmente vale a pena tentar.

    O fato é que aprendi muito contigo e sou grato por isso.

    Pra mim a discussão já deu o que tinha que dar, e mais vale que lutemos juntos por um mundo mais cristão, detonando essa onda de militantes ateus que nos atacam de todos os lados.

    Um grande abraço e a paz de Cristo!

    ResponderExcluir
  17. Já tinha até ido dormir, mas resolvi voltar por causa do tal do cânon. Quem sabe você consegue me esclarecer isso também...

    O problema é que o cânon bíblico nunca foi uma unanimidade, e essa polêmica foi justamente o que provocou uma decisão formal, a do ano 393.

    Acredito que todas elas possuam os itens que você citou (foram escritos por discípulos, são coerentes entre si, foram amplamente divulgados, etc.), então como decidir o cânon correto sem recorrer a uma autoridade? E se uma autoridade serve para um assunto tão importante para o cristianismo (há algum mais importante que esse???) por que não serviria para os outros assuntos?

    Até hoje há controvérsias sobre o cânon, qual delas está certas? Os deuterocanônicos, por exemplo, entram ou não entram? Por que? Quem é a autoridade que deve decidir isso?

    E já que voltei, seria interessante que você comentasse também o caráter auto-contraditório da Sola Scriptura: se a Sola Scriptura não está definida na Bíblia, e nunca foi defendida por Jesus, por que acreditar nela?

    Agora cama, senão eu não acordo amanhã... :-)

    ResponderExcluir
  18. Zé, primeiramente acho que te devo um pedido de desculpas. Talvez eu tenha sido um pouco agressivo em meus comentários e nas duas postagens que fiz a respeito do link que você me enviou. E isso pode ter gerado um mal estar em você. Não foi minha intenção.

    Gostaria de deixar claro que o motivo pelo qual estou debatendo com você não é para refutá-lo, mas sim para tirar suas dúvidas sobre o adventismo. Entretanto, é claro que tirar suas dúvidas sobre o adventismo implica, para mim, em analisar objeções e refutá-las, conforme aquilo que acredito sinceramente ser a visão correta. Trata-se de uma conseqüência lógica de qualquer discussão. Faz parte do debate. Mas não desejo criar, com isso, um mal estar. Até porque, como você falou, devemos estar juntos como cristãos e eu concordo com isso.

    Não obstante, acho importante que tanto eu quanto você (por mais difícil que seja) mantenhamos nossas cabeças abertas para argumentos contrários ao que cremos e humildade para reconhecer algum possível erro. Não é fácil. Tive que fazer isso uma vez. Não sou adventista de berço. Vim a me converter após quase dois anos de estudo; um com um pastor e um sozinho. Eu não pretendia me tornar adventista, era de outra igreja, não tinha intenção de sair de lá, tinha outras crenças e não queria ter que mudar minhas opiniões. É sempre chato ter que mudar, né... Eu cheguei a trabalhar fortemente em argumentos contrários ao adventismo e à guarda do sábado, enquanto estudava. Mas mesmo não querendo me tornar adventista, pedia a Deus que fizesse conforme a vontade dele; e continuei estudando. Foi depois de muito estudo e oração que eu, por fim, resolvi me tornar um adventista do sétimo dia.

    Estou dizendo isso, não para tentar provar que minha doutrina é a certa, mas para mostrar que eu sei o quanto é difícil assumir uma postura cética quanto às suas próprias crenças. E não me julgo livre de cometer o erro de me prender a uma crença apenas por temer a mudança. Infelizmente é um vício emocional do ser humano. Mas na medida do possível, pretendo não agir assim. Se fizermos isso, creio que o debate ainda pode ser frutífero.

    ResponderExcluir
  19. Agora, vou tentar responder seus questionamentos. Você fez três perguntas: (1) se não é necessário uma autoridade para decidir quais livros formarão o cânone, (2) se essa autoridade não tem legitimidade para decidir outras questões e (3) como explicar o caráter “auto-contraditório” da sola scriptura. Vou te responder de um modo misturado, porque as três perguntas estão intimamente ligadas.

    Para começar, devo esclarecer uma coisa importante: o princípio sola scriptura defendido por Lutero não é contra a existência de autoridades na Igreja. O que Lutero defendia era que a autoridade da liderança da Igreja deveria estar subordinada à Bíblia e que as tradições e interpretações da Igreja jamais deveriam contradizer os claros ensinos das Escrituras Sagradas.

    Então, o princípio sola scriptura não se opõe à autoridade dos líderes da Igreja, mas coloca essa autoridade em seu devido lugar. É aqui que entramos nas primeiras perguntas: não é necessário a existência de uma autoridade para decidir o que é inspirado e o que não é? E, se essa autoridade tem legitimidade para escolher o próprio cânone, sua autoridade não é, necessariamente, igual ao cânone?

    Vamos por partes. Sim, é necessário uma autoridade para selecionar os livros do cânone. Isso porque Deus sempre instituiu líderes entre o seu povo e na Igreja; homens que devem ser fiéis ao Senhor, cheios do Espírito Santo e com um bom conhecimento da Palavra de Deus. Estes líderes servem como instrumentos nas mãos de Deus para instruir o seu povo. E acabe a eles reunirem-se para resolver questões importantes, sempre na base da oração e da análise racional das questões. Um exemplo bíblico disso está na controvérsia sobre a circuncisão, narrada em Atos 15. Ali houve uma reunião dos líderes da Igreja para decidir a questão.

    Agora, isso não quer dizer que a liderança seja infalível em suas decisões. Ainda que sejam decisões importantes. O homem é falho e está sempre sujeito a fazer as coisas segundo aquilo que ele mesmo pensa. É por isso que a própria Bíblia nos orienta a ser céticos em relação ao ser humano. Este ceticismo implica em: não aceitar, à priori, algo que um líder diz com base apenas em seu posto de autoridade na Igreja, mas aceitar o que um líder diz com base em evidências plausíveis de que aquela Palavra é mesmo de Deus. As evidências que levam um líder sustentar certa posição como correta é que devem legitimar sua autoridade e não sua autoridade pré-definida que deve legitimar a posição que sustentou.

    Isso que acabo de dizer é um princípio básico para todos os cristãos (inclusive os cristãos católicos), porque é justamente esse princípio que nos faz confiar que a Bíblia, embora tenha sido escrita por homens, foi inspirada pelo Espírito Santo. Cremos assim, porque os autores de cada livro da Bíblia estavam sempre relatando grandes sinais de Deus testemunhados pelas pessoas do contexto e, muitas vezes, o próprio autor estava envolvido nesses sinais, tornando evidente para todos que Deus estava com ele. Assim, as pessoas de cada contexto tinham evidências suficientes de que os escritos do autor eram inspirados. E é por isso que nós aceitamos o que no passado se aceitou, por meio de evidências. Se não fosse pelas evidências, como saberíamos que não estamos sendo enganado por homens? Então, vemos que as evidências de que algum escrito é inspirado são imprescindíveis para a sua escolha.

    Ora, se a ênfase está nas evidências de que os escritos são inspirados, então a autoridade utilizada para a seleção é apenas reflexo da autoridade inerente dos próprios escritos. Assim, a autoridade dos escritos é maior do que a autoridade dos líderes, que necessitam legitimar sua seleção com evidências de que esses escritos são inspirados.

    ResponderExcluir
  20. Vamos deixar isso mais claro através de um exemplo: Suponha que meus olhos sejam vendados e que me mandem pegar uma laranja que está em um cesto. Só que nesse cesto também há limões, tangerinas, tomates e cebolas. Como posso saber qual é a laranja? Naturalmente pelas evidências. Eu a apalparei, tentarei sentir o seu cheiro e com base nisso farei a seleção. Então, nesta situação, de quem provém a autoridade máxima que me diz o que é a laranja? Da própria laranja, não é mesmo? A autoridade vem das evidências intrínsecas a ela. A minha autoridade de descobrir o qual é a laranja, está diretamente subordinada à própria laranja. Com os escritos inspirados é a mesma coisa. É neles que se encontram a autoridade máxima.

    Em última instância, a autoridade maior está sempre nas evidências. Foram por meio delas que o cânone bíblico pôde ser formado, gradualmente, sendo legitimado como Palavra de Deus. Ou seja, isso coloca a autoridade dos líderes na dependência de evidências e, conseqüentemente, na dependência dos escritos que, pelas evidências, se tornaram canônicos. Daí emerge o princípio da sola scriptura.

    Para provar que o princípio está errado, seria necessário provar que a seleção do cânone, ao contrário da seleção da laranja do meu exemplo, não foi feita por meio de evidências, mas única e exclusivamente por meio da autoridade dos líderes. Se tiver sido assim, então, de fato, para aceitar o cânone, teremos que aceitar que os líderes da Igreja têm autoridade máxima (e maior que a Bíblia, pois o cânone depende apenas da autoridade da Igreja para existir).

    Mas é óbvio que os líderes da Igreja, ao longo de anos e anos de análises, estudos, debates, discussões, concílios e oração, buscou e se baseou em evidências para fechar o cânone.

    Então, como a ênfase está nas evidências e não nos líderes, é plausível aceitar a sola scriptura em lugar da sola ecclesia. Os líderes da Igreja são instrumentos que, mesmo sendo falhos, Deus os usa para alcançar seus objetivos. A autoridade a eles concedida por Deus não é máxima, mas subordinada à Bíblia.

    ResponderExcluir
  21. Agora, algumas observações adicionais: Primeiro, as controvérsias quanto aos livros do Novo Testamento não foram tão grandes. A maioria dos livros que não entraram no cânone apresentava conteúdo herético, ou incoerente com as demais escrituras, ou de procedência e data duvidosas. Enfim, apresentavam muitas evidências de que NÃO eram inspirados por Deus e foram barrados sem dificuldades de se entender isso. Em contraponto, a maioria dos livros que entraram, já eram utilizados e considerados confiáveis desde o final do primeiro século. Só para se ter idéia, as cartas de Clemente, Inácio e Policarpo já citavam 25 dos 27 livros do Novo Testamento entre os anos 95 d.C. e 110 d.C.

    Isso é uma evidência de que, embora o cânon tenha demorado para ser fechado oficialmente, a maior parte de seus livros era considerada confiável há muito tempo, justamente por aspectos como coerência no conteúdo, procedência definida, divulgação e outras evidências que escritos inspirados sempre tem. Ter isso em mente é importante porque, se a maioria dos livros era utilizada e considerada confiável desde o final do primeiro século, então a maior parte das informações pertinentes ao cristianismo já era bem conhecida e aceita muito antes do cânone ser oficialmente fechado.

    As maiores controvérsias giraram em torno de 6 epístolas apenas: Hebreus, Tiago, II Pedro, II João, III João e Apocalipse. Mas, fazendo uma leitura detalhada do que elas dizem, constatamos que elas estão de pleno acordo com o que diz os demais 21 livros do Novo Testamento (e também os do Antigo). Além disso, sabemos quem foram os seus autores (a epístola aos Hebreus é a única que não sabemos o autor, embora saibamos que ele conheceu Timóteo, pois o cita). Então, há boas evidências de que esses livros, de fato, são inspirados.

    Segundo, a existência de controvérsias apenas comprova que todo ser humano é falho (até mesmo os líderes) e que, por isso, para se fechar um cânone pode-se precisar de muitos anos de estudos, análises comparadas, debates, concílios e oração.

    Contudo, se aceitamos através da razão que Deus tem que ter trabalhado tanto na fase de inspiração dos escritos, como na fase de seleção, é plausível afirmar que todos os erros ocorridos na fase de seleção, em algum momento, foram consertados por Ele.

    Terceiro, não acredito que entre os livros que compõem hoje o Novo Testamento exista algum não inspirado ou não totalmente inspirado. A coerência entre todos eles e entre os livros do Antigo Testamento descartam essa hipótese. Mas acredito que alguns escritos inspirados possam ter ficado de fora, sim. E isso não é necessariamente um problema. Afinal, Deus pode inspirar qualquer pessoa em um texto e isso não quer dizer que esse texto tem que entrar no cânone. Fosse assim, o cânone acoplaria livros até os dias de hoje. Ora, um dia precisa parar.

    Talvez um exemplo de texto inspirado que não entrou no cânone do Novo Testamento seja a epístola de Paulo aos laodicenses. Essa epístola não contém nenhuma heresia ou ensino contraditório. Por que não entrou? Não sei. Talvez porque o seu conteúdo, embora inspirado, não fosse necessário ao cânone, trazendo informações que o cânone já tem. E talvez por esse motivo Deus tenha impelido os líderes a não colocarem lá. E quantas outras epístolas inspiradas não podem ter sido escritas por Paulo, Pedro, João e etc.? Talvez muitas delas tenha se perdido. Não é um problema tão grande. Na verdade, não é um problema. O que está no cânone é tudo o que precisamos saber sobre o evangelho. É suficiente.

    Espero ter conseguido responder suas perguntas. Meu conhecimento sobre esse tema não é muito amplo, mas foi bom ter entrado nesse assunto, pois agora pretendo procurar pela internet livros apócrifos e deuterocanônicos para estudar.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  22. Pra começar, o seu pedido de desculpas: não aceitarei porque simplesmente não cabe. =)

    Se existiu algum ataque seu, ele foi às ideias, e não há motivo algum para eu me sentir ofendido por isso. A discussão está ótima, continue sempre com as críticas. Afinal, como crescer sem elas? E as críticas ao autor do artigo, é ele quem deve rebater. Eu não tenho conhecimento suficiente para fazê-lo, então também não posso ficar chateado por isso...

    Talvez você tenha pensado isso porque eu falei em parar. Mas quando eu falei isso era porque achava que já tinha entendido tudo. Só depois percebi que ainda haviam algumas perguntas a serem respondidas. Então voltei...

    Portanto, continuamos separados pelas crenças (muito poucas aliás; as semelhanças são em número absurdamente maior) mas unidos como cristãos. Sempre!

    Quanto à mudança: não acho tão chato mudar, até porque minha profissão (desenvolvedor de sistemas) exige isso o tempo todo. E a resistência à mudança é absolutamente normal; não me lembro de conhecer alguém que não a tenha...

    A questão da "cabeça aberta" que você cita é justamente o que estou tentando alcançar: para você entender o motivo de alguém ter uma crença, tem que se colocar no lugar dela, e entender sua forma de pensar. Pra isso é necessário entender como o crente lida com as aparentes contradições de sua crença, e questioná-las.

    Se sua crença fizer mais sentido que a minha (no momento eu não acho =D), certamente mudarei de ideia...

    ResponderExcluir
  23. Agora a questão da Sola Scriptura:

    O catolicismo também defende que na dúvida entre a validade ou não de uma "teoria" a Bíblia é que dá a palavra final. Não vejo diferença aqui. Se você puder, cite um exemplo de algo no catolicismo que seja condenado na Bíblia, por favor... Eu gostaria de saber... E que não seja essa questão do sábado ou domingo, pois essa discussão me lembra das críticas de Jesus aos fariseus, que se prendiam aos detalhes do judaísmo mas esqueciam o fundamental (Mt 15).

    E essa questão de só "aceitar o que um líder diz com base em evidências plausíveis de que aquela Palavra é mesmo de Deus" cai num raciocínio circular: se há várias interpretações sobre um determinado assunto, como saber qual delas era a intenção original? No meu julgamento pessoal? Veja que a falta de uma autoridade na Terra leva ao relativismo bíblico, e com essas múltiplas interpretações - sem ser possível saber qual delas é a correta - fica impossível saber qual é a Verdade.

    Eu (como católico) creio que a promessa de Jesus que eu citei lá em cima (Mt 28,20) é justamente o que nos dá a confiança pra saber que nunca estamos *doutrinariamente* errados, afinal tivemos a promessa de que as portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja (Mt 16,18). Aliás, daí vem nossa confiança na infalibilidade papal. Mas o que vocês dizem é que as portas do inferno dominaram a Igreja por vários séculos (não totalmente, claro, mas parcialmente), até que os adventistas descobrissem que ela estava doutrinariamente erradas. Quando analiso isso e contrasto com a promessa feita, as coisas não parecem fazer o menor sentido pra mim...

    (Momento off-topic: Aliás, já que citei a esse trecho, uma dúvida: qual é a interpretação de vocês para Mt 16,18-19? Isso me causa muita curiosidade.)

    Quanto à infalibilidade das decisões da Igreja tem outro problema: o que faz com que a decisão de At 15 esteja correta? O mero fato de ela estar escrita em um livro que faz parte da Bíblia? Afinal, ela contraria um preceito do Antigo Testamento... A infalibilidade bíblica - em que nós dois acreditamos - diz que a narrativa está correta (isso realmente aconteceu), mas não que a atitude foi correta, concorda? Como sair dessa cilada?

    Quanto às listas de Clemente, Inácio e Policarpo, o número está errado: são 23, não 25 (faltam 2 Timóteo, 3 João, Judas e Apocalipse). Sem contar que você juntou todas como se fossem uma só, quando na verdade são 3 listas diferentes, sendo que a mais completa é a de Policarpo, com 18 livros. Aliás, nem sei por que discutir isso, pois a mera existência de controvérsias já prova sem abertura a dúvidas que o cânon nunca foi uma unanimidade, e portanto não pode ser óbvio. Minimizar a quantidade de diferenças simplesmente não responde à necessidade de aceitar a autoridade humana nesse caso...

    E uma última pergunta: quando vemos tantas "versões" diferentes da doutrina cristã, como saber qual delas é a que foi inspirada pelo Espírito Santo?

    Abração!

    ResponderExcluir
  24. Rapaz, eu tenho medo quando escrevo muito em comentários, porque sei que pode dar preguiça de ler tanta coisa. Mas não tenho como escrever menos, pois isso aqui já é um resumo, rsrs. Mas já que você tem mostrado interesse em ler o que escrevo, então acho que vale à pena escrever. São seis páginas A4, hein... :D Mas, vamos lá:

    “O catolicismo também defende que na dúvida entre a validade ou não de uma ‘teoria’ a Bíblia é que dá a palavra final. Não vejo diferença aqui. Se você puder, cite um exemplo de algo no catolicismo que seja condenado na Bíblia, por favor... Eu gostaria de saber... E que não seja essa questão do sábado ou domingo, pois essa discussão me lembra das críticas de Jesus aos fariseus, que se prendiam aos detalhes do judaísmo mas esqueciam o fundamental (Mt 15)”.

    Eu não entendi porque você relacionou aqui o mandamento do sábado com os fariseus, “que se prendiam a detalhes do judaísmo, esquecendo-se do fundamental”. Acho que você quis minimizar a importância do quarto mandamento, reduzindo-o a um “detalhe do judaísmo”. Eu não vejo motivo para tal, já que o sábado faz parte dos 10 mandamentos, é um memorial de que Deus é o criador e é um dia em que podemos nos dedicar inteiramente a ele. Aliás, vale ressaltar o que está escrito em Tiago 2:8-11:

    “Se vós, contudo, observai a lei régia segundo a Escritura: Amarás o teu próximo como a ti mesmo, fazeis bem; se, todavia, fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado, sendo argüidos pela lei como transgressores. Pois qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos. Porquanto, aquele que disse: Não adulterarás também ordenou: Não matarás. Ora, se não adulteras, porém matas, vens a ser transgressor da lei. Falai de tal maneira e de tal maneira procedei como aqueles que hão de ser julgados pela lei da liberdade” (Tiago 2:8-11).

    É claro que Tiago está falando dos dez mandamentos aqui. E nós dois concordamos que os dez mandamentos são preceitos morais da lei, portanto, imutáveis. Então, se Tiago usa o princípio de não fazer acepção entre os dez mandamentos, por que minimizar a importância do sábado (que é um desses mandamentos)?

    [P.S.: Se o sábado havia se tornado um fardo na época de Jesus era porque os fariseus criavam uma série de regras que não estavam nas Escrituras Sagradas (para ser mais exato eram 39 regras, chamadas de “pais”. E cada uma dessas regras se dividiam em sub-regras). Por exemplo, segundo o ensino farisaico, um homem só podia andar cerca de um quilometro no dia de sábado. Os mesmos fariseus proibiam que as pessoas cuspissem no chão e jogassem terra em cima do cuspe, no dia de sábado, pois era considerado “um trabalho”. Mas o sábado bíblico não tem nada disso].

    ResponderExcluir
  25. Com relação a doutrinas no catolicismo que não estão de acordo com a Bíblia, eu poderia citar a imortalidade da alma. Essa doutrina não tem respaldo bíblico. Pelo contrário, em diversos textos a Bíblia deixa claro que quando o ser humano morre, seu corpo vai para o pó, seu fôlego volta para Deus e nesse dia perecem todos os seus desígnios. E NÃO, esses textos NÃO estão falando do corpo da pessoa, mas da própria pessoa, por inteiro. Isso é enfatizado em textos como: Salmos 146:3-4; Salmo 17:15 Salmo 6:4-5; Salmo 115:17-18; Eclesiastes 3:18-20; Eclesiastes 9:5-6 e 10; Eclesiastes 12:1-7; Isaías 38:18-19; Daniel 12:2; Lucas 8:49-55; Atos 2:25-35; I Coríntios 15:20-26; I Coríntios 15:50-54; I Tessalonicenses 4:13-17; I Timóteo 6:13-16; Hebreus 9:27-28; Apocalipse 20:4-6 e etc.

    As únicas passagens que, supostamente, favorecem a doutrina da imortalidade da alma, são poucas, não são contundentes e se baseiam em interpretações falhas. Eu já mapeei e analisei 9 em um texto que não publiquei ainda (acho até que vou publicá-lo hoje). Vou dar um exemplo de uma dessas passagens: A história do rico e do Lázaro (Lucas 16:19-31). É uma parábola, mas muitos insistem em interpretá-la literalmente. O problema é que, se formos interpretar literalmente essa história, teremos que interpretar como literais o fato de que todos os que morrem vão para o seio de Abraão; o de que a expressão “seio de Abraão” é literal; o fato de que o céu e o inferno estão tão próximos a ponto de uma pessoa poder conversar com a outra (uma de cada lado); o fato de que as almas mortas têm corpos (o que contraria a Bíblia, pois o corpo terreno está morto e o corpo celestial, Paulo afirma que só receberemos na ressurreição – I Coríntios 15:52) e por aí vai. Ou seja, é uma interpretação ridícula.

    Fica claro que Jesus apenas se utiliza de uma narrativa simbólica, com elementos conhecidos (pois os pagãos acreditavam na imortalidade da alma e os israelitas estavam sob domínio romano), para ilustrar uma verdade maior. A análise dos termos utilizados por Jesus nos revelam claramente o que ele queria dizer. O rico representava os judeus, sobretudo os líderes judaicos, que se regalavam por serem povo de Deus. O mendigo era a representação dos gentios. Desejar alimentar-se das migalhas que caíam do rico era uma referência a gentios sinceros que queriam a benção de conhecer a Deus, como tinham os judeus (aliás, é a mesma expressão utilizada na passagem em Mateus 15:27 por uma mulher gentia que se coloca numa posição inferior aos judeus: “Sim, Senhor [Jesus], porém, os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa de seus donos” – os donos se referiam aos judeus).

    “Seio de Abraão” confirma que Jesus falava sobre os judeus. O grande orgulho dos judeus era ser descendência de Abraão (João 8:33-58; Mateus 3:9). “Sepultado” era uma previsão do que ocorreria com os judeus espiritualmente: morreriam, pois negariam a divindade e o sacrifício de Jesus. “Atormentado” era o que ocorreria com o povo por conta de terem rejeitado Jesus e amaldiçoado a si mesmos (Mateus 27:25). Vemos como que o povo judeu sofreu muito ao longo do tempo, desde o sacrifício de Jesus. Por fim, “Moisés e Profetas” é uma referência a quantas chances que os judeus tiveram de fazerem tudo diferente desde que saíram do Egito. E embora Moisés e os Profetas tenham testemunhado de Jesus em seus escritos (conforme Jesus afirma em João 5:39), os judeus não o aceitaram.

    ResponderExcluir
  26. Esse é o sentido da parábola contada por Jesus. E faz sentido, pois no contexto da passagem, antes de contar a parábola, Jesus Cristo estava justamente criticando a hipocrisia e a avareza dos fariseus. E com certeza ninguém ali pensou que Jesus estava defendendo a imortalidade da alma, pois era comum até nos talmudes, por exemplo, que se fizessem narrativas com elementos pagãos para se extrair verdades maiores. Semelhante a esse texto, há oito interpretações bem absurdas e que, em última instância, não poderiam ser verdadeiras, pois contrariam os textos claros que dizem que o homem, quando morre, fica morto até que Jesus o ressuscite. Portanto, a imortalidade da alma é uma doutrina contrária a Bíblia, que tanto católicos quanto protestantes acreditam.

    ResponderExcluir
  27. “E essa questão de só ‘aceitar o que um líder diz com base em evidências plausíveis de que aquela Palavra é mesmo de Deus’ cai num raciocínio circular: se há várias interpretações sobre um determinado assunto, como saber qual delas era a intenção original? No meu julgamento pessoal? Veja que a falta de uma autoridade na Terra leva ao relativismo bíblico, e com essas múltiplas interpretações - sem ser possível saber qual delas é a correta - fica impossível saber qual é a Verdade”.

    Se eu for considerar o seu argumento, entraremos em grandes problemas, precisamente porque ele pode ser usado para qualquer crença que eu adote. Por exemplo, como posso ter certeza de que o cristianismo é verdadeiro se existem tantas religiões? Por que eu sigo o cristianismo e não o islamismo? Bem, eu, Davi, sigo o cristianismo porque ele me parece mais coerente do que as outras religiões. Vejo nele mais evidências de estar correto. No entanto, há islâmicos que seguem o islamismo por essa mesma razão. E aí? Quem está certo? Note que não há uma autoridade na terra que me possa mostrar qual é a religião certa. Então, se uma pessoa está, sinceramente, buscando evidências para saber qual é a religião correta, segundo o seu argumento isso não vai adiantar, pois ela precisa de uma autoridade. Como não existe essa autoridade, não dá para saber com certeza qual é a religião certa.

    Aliás, é bom lembrar que os judeus nunca tiveram um papa para ser sua autoridade na terra. No entanto, eles fecharam seu cânone, não é mesmo? E tanto era o cânone certo que Jesus o utilizava. Agora, ainda assim havia divergências. Por exemplo, os saduceus não acreditavam em todos os livros da Escritura, ao contrário dos fariseus. E aí? Em quem acreditar? Nos fariseus ou nos saduceus? Qual desses estava certo?

    Imagine um agnóstico. Ele quer ter certeza se Deus existe ou não. Seus amigos cristãos dizem que existe e seus amigos ateus dizem que não existe. Em quem acreditar? Quem está certo? Cadê a autoridade para decidir essa questão?
    Você está entendendo onde quero chegar? Seu argumento faz com que todas as crenças só possam ser defendidas com certeza se houver uma autoridade para dizer que ela está certa. Então, se não há essa autoridade, não há como termos certeza de nada. Conclusão: existem muitas religiões porque não há como ter certeza de nada. E Deus não pode nos cobrar por escolher a errada, pois não há autoridade entre nós que nos mostre qual é a religião correta (se eu aceitar o papa, tenho que pressupor antes que o cristianismo está correto, o que é raciocínio circular; se eu aceitar Maomé, tenho que pressupor antes que o islamismo está correto, o que também é raciocínio circular).

    ResponderExcluir
  28. Mas não é isso que a Bíblia ensina. A Bíblia dá um valor muito grande a busca por evidências para crermos em algo. Por exemplo, ela diz para não dar crédito a um profeta quando o que ele disser não se cumprir (Deuteronômio 18:21-22); diz que conhecemos as pessoas pelos seus frutos (Mateus 7:16); diz que devemos examinar de tudo e reter aquilo que é bom (I Tessalonicenses 5:21); nos incentiva a investigar se, de fato, é Deus que está falando em determinada situação (Juízes 6:17-24); nos informa que Satanás é enganador e pode se tornar até um anjo de luz (II Coríntios 11:14); nos alerta que quem confia no ser humano é maldito (Jeremias 17:5) e etc.

    Paulo, por exemplo, diz que o homem é indesculpável se não crer porque, ainda que não tenha ouvido a Palavra, a própria natureza testifica que existe um Deus e a consciência nos ensina o que é certo e o que é errado (Romanos 1:18-21 e 2:12-16). Ou seja, Paulo está falando sobre evidências. Quando um ateu estuda sobre o argumento cosmológico, o argumento teleológico e o argumento moral, por exemplo, está encontrando evidência de que Deus existe por meio da natureza. E é, ao abrir sua cabeça para esses argumentos, que o Espírito Santo pode trabalhar nele e convencê-lo. O Espírito trabalha juntamente com as evidências no coração dos homens. Quantos sinais Jesus Cristo não fez para que as pessoas cressem nele? Se não creram foi porque fecharam os ouvidos para o Espírito e, por isso, não entenderam as evidências.

    Portanto, se um homem é indesculpável por escolher o caminho errado porque existem evidências, como é que posso dizer que é necessário ter um líder humano, de autoridade intrínseca, para lhe dar certeza? Se é assim, todos os ateus estão desculpados. Mas isso não contraria o que Paulo falou?

    ResponderExcluir
  29. “Eu (como católico) creio que a promessa de Jesus que eu citei lá em cima (Mt 28,20) é justamente o que nos dá a confiança pra saber que nunca estamos *doutrinariamente* errados, afinal tivemos a promessa de que as portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja (Mt 16,18). Aliás, daí vem nossa confiança na infalibilidade papal. Mas o que vocês dizem é que as portas do inferno dominaram a Igreja por vários séculos (não totalmente, claro, mas parcialmente), até que os adventistas descobrissem que ela estava doutrinariamente erradas. Quando analiso isso e contrasto com a promessa feita, as coisas não parecem fazer o menor sentido pra mim...”.

    Em primeiro lugar, vamos interpretar o texto com o mínimo de coerência. A palavra para inferno, nesse texto, é Hades. Quer dizer, literalmente: Sepultura. Se eu digo para você, Zé, que as portas da sepultura não prevalecerão contra você, é lógico que estou querendo dizer que você não vai morrer. Há dúvidas disso? Então, se Jesus disse que as portas da sepultura não prevaleceriam contra a Igreja, quer dizer que a Igreja, apesar dos problemas, jamais se extinguiria, morreria, acabaria. E isso foi cumprido? Foi. Hoje, o cristianismo é a maior religião do mundo, inclusive.

    Em segundo lugar, se realmente os católicos estiverem doutrinariamente errados (é uma hipótese), esses erros foram ratificados e continuarão sendo seguidos justamente porque existe a crença de que o Papa não falha. Se não falha, não há nada para mudar e nem nunca haverá. Pelo contrário, a tradição será cada vez mais forte. Por outro lado, se não existisse essa crença na infalibilidade, qualquer possível equívoco doutrinário da Igreja poderia ser revisto com relativa velocidade. Talvez houvesse mais debates, mas haveria uma liderança e uma Igreja mais cética em relação ao ser humano. Isso geraria líderes mais humildes e um cuidado maior na escolha desses líderes, nos estudos da Bíblia e na busca por evidências sempre.

    A crença na infalibilidade, no entanto, nos estagna. Se, de fato, eu estiver certo e quiser te convencer disso, não vou conseguir, nem apelando para a Bíblia (ainda que você creia nela), pois o Papa é infalível em questão de doutrina, de modo que, até a Bíblia Sagrada depende dele para ser interpretada. E acabou aí. Não estou dizendo que estou certo, mas se eu estiver, esse é quadro.

    ResponderExcluir
  30. “(Momento off-topic: Aliás, já que citei a esse trecho, uma dúvida: qual é a interpretação de vocês para Mt 16,18-19? Isso me causa muita curiosidade.)”.

    Esse texto é interessantíssimo! Gosto muito de falar sobre ele. Existem duas chaves para entender esse texto. A primeira está no fato de que Jesus nos aproxima tanto dele que chega a dizer que nós somos um com ele (João 17:21-23). De fato, todos os discípulos reconheciam isso e, por isso, após a ascensão de Jesus passaram a dizer que nós somos corpo de Cristo. Paulo usa muito essa expressão. Em outras palavras, nós somos parte de Jesus Cristo.

    A segunda chave é que Jesus era considerado a grande rocha, o fundamento da Igreja, a pedra angular. Pedro reconhece isso enfaticamente em Atos 4:8-12 e em I Pedro 2:4-8. Paulo reconhece isso em Efésios 2:19-22 e em I Coríntios 3:11.

    Considerando essas duas chaves, entendemos que quando Jesus Cristo disse que Simão era pedra, estava querendo dizer que Simão (Pedro) fazia parte do próprio Cristo. E era sobre ele mesmo (Cristo) que a Igreja seria edificada. A interpretação faz sentido, até porque Pedro, em grego, Petros, é usado para se referir a um fragmento de uma pedra maior, um pedacinho de pedra. Ou seja, Cristo é a rocha e nós somos pedacinhos dessa rocha quando nos unimos a ele.

    Mas por que Jesus disse isso justamente a Pedro? Era porque Jesus conhecia o coração de Pedro. Se formos ver toda a história de Pedro, vemos que, embora ele amasse muito a Jesus e o seguisse com energia, confiava demais em si mesmo. Foi isso que o levou a dizer que jamais negaria Jesus (e o negou três vezes). Ora, Jesus sabia que Pedro seria um discípulo maravilhoso, forte como uma pedra. Mas para isso era necessário que ele confiasse mais em Jesus e menos nele mesmo, que reconhecesse sua fraqueza. Por isso, Jesus deixou claro que Pedro só era pedra porque fazia parte de Jesus. A leitura de João 21:18 nos ajuda a entender isso. Jesus diz a Pedro que quando era jovem, Pedro fazia o que queria, mas que agora as coisas não seriam mais assim, precisamente porque seguir a Cristo é fazer a vontade de Deus até a morte. Ali Jesus acabou com o orgulho que tanto atrapalhava Pedro.

    ResponderExcluir
  31. “Quanto à infalibilidade das decisões da Igreja tem outro problema: o que faz com que a decisão de At 15 esteja correta? O mero fato de ela estar escrita em um livro que faz parte da Bíblia? Afinal, ela contraria um preceito do Antigo Testamento... A infalibilidade bíblica - em que nós dois acreditamos - diz que a narrativa está correta (isso realmente aconteceu), mas não que a atitude foi correta, concorda? Como sair dessa cilada?”.

    A Igreja poderia estar errada em sua decisão? Sim. Mas qual a probabilidade? Afinal, estavam reunidos cristãos fiéis e discípulos diretos de Cristo, todos cheios do Espírito Santo. E a decisão foi pautada na razão. Vejamos: a circuncisão era um preceito ritual que simbolizava o acordo de Deus para com os judeus como nação. Mas o próprio Antigo Testamento sempre apresentou passagens mostrando que Deus faria um novo acordo que incluiria os gentios. Assim, os judeus deixariam de ser o povo de Deus e, a nação de Deus, por assim dizer, seria a “nação cristã” (o que incluiria qualquer judeu que se convertesse, é claro).

    Ora, se isso tudo isso era lógico para aqueles cristãos, então também era lógico que o símbolo da antiga aliança não era mais necessário. Principalmente se fosse feito com o intuito de salvar alguém (já que, quem salva é Cristo).

    Você pode argumentar: “Mas houve grande discussão”. É verdade. Precisamente porque mudar não é fácil. Na verdade, acho uma postura sábia analisar muito as coisas antes de tomar decisões precipitadas (eu demorei dois anos para aceitar o adventismo e provavelmente demoraria mais dois para aceitar qualquer outra conjunto de crenças, no mínimo, rsrs). Mas, no fim das contas, aquela liderança, que era confiável (não confundir com inerrante), tomou uma decisão plausível no que tange a razão. Por que não crer que acertaram? Não vejo nenhuma evidência contrária. Você vê?

    ResponderExcluir
  32. “E uma última pergunta: quando vemos tantas "versões" diferentes da doutrina cristã, como saber qual delas é a que foi inspirada pelo Espírito Santo?”.

    É o mesmo problema das religiões. Quando vemos tantas religiões no mundo, como saber qual delas é a verdadeira religião do Deus verdadeiro? E como saber que existe uma religião e um Deus verdadeiro? Através de uma autoridade humana? Ou através do trabalho conjunto entre as evidências e o Espírito Santo? Se você aceita a autoridade de um ser humano para decidir questões dentro do cristianismo, deve aceitar a autoridade de um ser humano para decidir, antes de você ser cristão e teísta, se o cristianismo e o teísmo são verdadeiros ou não. Caso contrário, como saber?

    Abraços, irmão. :D

    ResponderExcluir
  33. P.S.: Ah, perdão, Zé. Eu analisei apenas Mateus 16:18. Faltou o versículo 19. Esse versículo diz: "Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus".

    É interessante que essa autoridade dada por Jesus a Pedro não foi dada só a Pedro. Dois capítulos depois, em Mateus 18:18 ele repete a mesma frase, agora falando com todos os discípulos, mas deixando claro que o ensino se estende para todo o irmão da igreja. Se você ler o contexto (Mateus 18:15-20), verá claramente que Jesus revela que, por causa dele, todo cristão tem direito de "trazer o céu para si" (vou explicar essa minha expressão).

    Jesus revela isso em duas seções. Na primeira, enquanto fala sobre as relações entre os irmãos, mostra que todas as decisões sensatas, isto é, tomadas nos moldes que ELE estipulou, serão aceitas no céu.

    Na segunda seção do texto, mostra que todas as coisas que cristãos verdadeiros necessitam de Deus, se pedido com fé, mediante Jesus, será dado.

    Ou seja, "trazer o céu para si" é ter os recursos e o apoio de Deus ao alcance das mãos da Igreja (quando a Igreja age dentro dos moldes que Jesus estipulou).

    Mas que Igreja? Qualquer duas ou três pessoas que estejam reunidas em nome de Jesus. Que seja só isso, no entendimento de Cristo já é Igreja (o que inclui católicos, protestantes, pentecostais, adventistas e qualquer cristão sincero que procure estar de acordo com a vontade de Deus).

    Aí, a gente volta em Mateus 16:19 e compreende que as chaves do reino dos céus dadas a Pedro são simplesmente uma simbologia que indica a autoridade que ele, os outros discípulos, e mais todos os cristãos (conforme Mateus 18:18) teriam para trabalhar com recursos dos céus, tais como: intrepidez para pregar, coragem, força, saúde, dom de cura, poder de expulsar demônios, unção do Espírito Santo, dom de falar línguas estrangeiras sem ter aprendido, sabedoria na tomada de decisões e etc; e mais o apoio de Deus para receber esses recursos.

    Por isso, são "chaves". Porque elas são capazes de abrir as "portas do céu" para que recebamos recursos. E através delas, tudo o que fazemos é aceito no céu (desde que ajamos conforme a vontade de Deus, claro).

    Bem, acho que não esqueci de mais nada. :D

    ResponderExcluir
  34. Pode escrever quanto quiser. Eu demoro a voltar, mas volto e leio tudo... :-)

    Teria muuuita coisa pra escrever, mas vou (tentar) escrever pouco pra ajustar melhor o foco...

    Quanto ao sábado: não quis minimizar a importância do mandamento em si, apenas de ser necessariamente o sábado. Exigir que seja sábado ou domingo me parece se apegar muito ao detalhe e desviar do principal: reservar um dia da semana para Deus. E se o sábado relembra momentos da Antiga Aliança (a fuga do Egito, antiga Páscoa), o domingo relembra a Nova Aliança (a ressureição, nova Páscoa). Bom, provavelmente você já sabe desses argumentos mas não concorda, então deixa pra lá.

    Quanto à doutrina da imortalidade da alma: eu gostaria de saber como vocês interpretam Lc 23,43 ("ainda hoje estarás comigo no Paraíso").

    Quanto às supostas "interpretações falhas" de outros trechos, te pergunto: como saber se a sua interpretação é a correta e as outras estão erradas ou o contrário? Se há passagens que favorecem a imortalidade (foi você que disse!), então ela é uma doutrina bíblica, oras! E se é bíblica, como você sabe o que deve e o que não deve acreditar? Aliás, seria bom que você procurasse saber a etimologia (não o significado) da palavra "heresia" e ver como ele se encaixa no contexto cristão. É interessante... Se não entender, não deixe de perguntar. Quanto ao corpo físico: o catolicismo também afirma que ele só ressuscitará no último dia. Nós não afirmamos que "as almas mortas têm corpos", como você disse.

    Quanto às múltiplas interpretações: esse argumento não é meu, é seu! Eu acredito numa igreja única, católica, que recebeu de Cristo a missão de "apascentar as suas ovelhas", recebeu "as chaves do céu", com a garantia de que "as portas do inferno não prevalecerão sobre ela". A autoridade é o próprio Cristo! Portanto, só pode haver uma interpretação correta possível, pois só há uma Verdade. E não acredito que Cristo deixaria sua Igreja "na mão" depois de vir aqui "dar o recado" e afirmar que estaria conosco todos os dias.

    Você cita como exemplo a divergência no cânone do Antigo Testamento, mas naquela época o messias ainda nem havia chegado, e eles estavam cientes que ainda não tinham a revelação completa. Dessa forma, "fechar" o cânon seria absolutamente impossível! E é curioso notar que depois de Cristo eles fecharam, mesmo ainda não tendo o messias. Não entendo, mas ok...

    ResponderExcluir
  35. E não, acreditar no Papa não é um raciocínio circular. Não acreditamos na infalibilidade porque o Papa mandou. Acreditamos que os relatos narrados na Bíblia são verdadeiros, e por isso acreditamos que em Mt 16,18-19 Pedro recebeu essa autoridade. A Bíblia (e, obviamente, a Tradição que definiu a Bíblia) é que é a autoridade. Não há "círculo" nenhum aí. E não foi a Igreja que decidiu que "é necessário ter um líder humano", como você falou. Foi o próprio Cristo.

    E quando você diz que "talvez houvesse mais debates", ou "uma Igreja mais cética", ou "líderes mais humildes" sem a infalibilidade papal, parece que afirma que o Papa decide as coisas sozinho, sem consultar ninguém, quando dá na telha. Pô... Você sabe (ou deveria saber, pelo menos) como as coisas acontecem. Lá em Atos 15 tem um belo exemplo. Houve controvérsia, inclusive. Mas note que nenhum dos "derrotados" agiu como os protestantes, criando uma seita com suas próprias interpretações. Pelo contrário: tiveram a humildade de aceitar a autoridade, mesmo contrariados. E por que aceitaram a autoridade de homens? É um caso a se pensar...

    Aliás, você afirma que "Igreja poderia estar errada em sua decisão" nesse caso. Se é assim, então é melhor parar de estudar, pois a Bíblia é uma grande "pegadinha do Malandro". Se nem ela é confiável, então fica absolutamente impossível saber o certo e o errado. E se é impossível, qual o motivo de estudar? Nunca vou saber se estou mais perto ou mais distante de Verdade mesmo... Seria melhor esquecer essa Bíblia, não? De que adianta remar se você não sabe se está indo para a margem ou para o abismo?

    Quanto a Mt 16,18-19, só não entendo esse malabarismo todo pra entender dois versículos: recorrer ao grego (quando na verdade deveria recorrer ao aramaico), tentar achar correlações em outros livros, ir até o capítulo 18, pra só então conseguir entender o 16. Não consigo entender por que o evangelista fez tanta questão de esconder o sentido correto da frase, mas ok...

    Bom, acho que estamos chegando perto do final: apesar do esforço, confesso que não entendo muito bem como funciona o seu raciocínio. Me parece mais vontade que razão (a ausência de unanimidade no cânon, por exemplo, nem foi mais citada), mas quem sou eu pra te criticar? Sou só mais um buscando a Verdade... Que consigamos chegar lá!

    ResponderExcluir
  36. Bem, vamos lá.

    Quero começar pela interpretação de Mateus 18:18. Você afirma que fiz malabarismo para respondê-la, recorrendo a várias passagens da Bíblia. Bem não vejo isso como um malabarismo, mas como uma interpretação dentro do contexto bíblico. Um dos grandes problemas que o cristianismo enfrenta é a análise insensata de algumas pessoas que se apegam a um único trecho da Bíblia e formam com ele uma doutrina.

    Por exemplo, Paulo afirma que “o homem é justificado pela fé, independentemente de obras da lei” (Romanos 3:28). Se eu aceito esse versículo sem estudá-lo à luz de outras passagens, tenho um argumento para dizer que posso adulterar, por exemplo. Afinal, se tenho fé, independente de me abster de adultério ou não, serei justificado.

    Outro exemplo: Paulo diz que “quem ama ao próximo tem cumprido a lei” (Romanos 13:8) e que qualquer mandamento “nesta palavra se resume: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Romanos 13:9). Se eu aceito esses dois versículos sem estudá-los à luz de outras passagens, tenho um argumento para dizer que eu não preciso amar a Deus acima de todas as coisas. Afinal, se eu amo ao meu próximo, estou cumprindo toda a lei de Deus.

    Você está vendo como não podemos ler um versículo fora do contexto bíblico? Recorrer à outras passagens da Bíblia para entender um texto, não é malabarismo.

    Devo lembrar ainda que nem sempre aquilo que parece mais óbvio, à primeira vista, em uma mensagem, é a idéia correta que o enunciador quis passar. Por exemplo, Jesus diz em João 2:19: “Destruam este santuário e em três dias eu o reconstituirei”. Ora, Jesus diz isso dentro do templo, quando lhe perguntam que sinal ele faria para mostrar que tinha autoridade do céu. O que acha que as pessoas iriam pensar? Bem, no mínimo, que Jesus estava tirando sarro da cara deles. Por isso, replicam: “Em quarenta e seis anos foi edificado este santuário, e tu, em três dias, o levantarás?” (João 2:20).

    Percebeu o que aconteceu? Jesus usou o termo “este santuário”, estando ele dentro do templo. Então, a primeira coisa que as pessoas pensaram foi o mais óbvio: “Esse louco está falando do templo”. E então lançaram o questionamento, muito provavelmente, em tom de zombaria. Mas ninguém ali, nem os discípulos, entendeu que Jesus Cristo estava falando sobre o seu corpo. E não tinham mesmo condição de saber. O que os levaria a considerar que “este santuário” não se referia a “este santuário”, mas a ele mesmo?

    “Ele, porém, se referia ao santuário do seu corpo. Quando, pois, Jesus ressuscitou dentre os mortos, lembraram-se os discípulos de que ele dissera isto; e creram na Escritura e na Palavra de Deus” (João 2:21-22).

    Aí eu pergunto: a mensagem mais óbvia, à primeira vista, é sempre a correta? É claro que não. Aí eu pergunto também: como os discípulos entenderam que Jesus se referia ao seu corpo e não ao templo? Simples: Eles consideraram o contexto. Eles constataram que quem foi “reconstruído” no terceiro dia foi Jesus e não o templo. Eles entenderam que o corpo de Jesus era santuário porque nele habitava o Espírito Santo (Isaías 11:2; Isaías 61:1; Mateus 3:16) e porque ele era o próprio Deus encarnado em um corpo de homem (Isaías 9:6; Miquéias 5:2). Viu a volta que deram? E foram necessários mais de três anos para que entendessem essa “óbvia” mensagem de Jesus sobre a reconstrução “deste templo”.

    ResponderExcluir
  37. Você entende o que quero dizer? Pegar o versículo isolado de Mateus 16:18 e firmar nele a doutrina de que o Papa é infalível e a Igreja também, é tão perigoso quanto pegar a frase isolada de Jesus (“Destruam este santuário”) e dizer que ele estava se referindo ao templo de verdade.

    Ora, se “este santuário” não se refere ao templo em que Jesus Cristo estava, mas sim ao próprio Jesus Cristo, então seria forçoso acreditar, baseado no contexto bíblico, que “esta pedra” não se refere a Pedro, mas ao próprio Jesus? É claro que não. E o contexto bíblico é bem claro ao afirmar em diversas passagens que Jesus Cristo é a rocha e o fundamento da Igreja.
    Agora, se nós somos corpo de Cristo, parte de Cristo e um com Cristo, então se ele é a pedra, nós somos parte dessa pedra. Por conseguinte, somos pedra também. Assim, se Cristo foi (e é) o fundamento da Igreja, os apóstolos também o foram (não por si, mas porque eram um com Cristo). E isso inclui Pedro.

    Quando Pedro confessou que Jesus era Filho de Deus, não o fez por si próprio, mas foi impelido pelo Espírito Santo. Isso levou Jesus a chamá-lo de Pedra. Naquele momento, pela influência do Espírito Santo, Pedro estava tão unido com Cristo que era um com a grande Pedra. E era sobre homens assim, amalgamados com Cristo, pedras junto com o Senhor, que Jesus edificaria sua Igreja. Ou seja, o fundamento era (e é) Cristo. Mas, de certa, forma também foi Pedro e os apóstolos, pois todos eles faziam parte dessa grande pedra chamada Jesus. Talvez isso explique a ambigüidade do texto. Jesus estava mesmo querendo dizer: “Pedro, se estiver comigo, assim como está agora, será um comigo; será pedra como pedra eu sou”.

    Encontro ainda apoio nessa interpretação nos textos de Mateus 5:14 e João 8:12. No primeiro texto, Jesus diz: “Vós sois a luz do mundo”. No segundo diz: “Eu sou a luz do mundo”. Afinal, quem é a luz do mundo? Bem, a luz é Jesus. Mas quando somos um com ele, conseqüentemente também somos a luz do mundo.

    Por fim, “Este santuário” se referia a Jesus Cristo. E nós, ao estarmos unidos com Cristo, somos santuário do Espírito Santo também (I Coríntios 3:16; I Coríntios 6:19). De igual modo, “Esta pedra”, ao meu ver, se refere a Jesus Cristo. E nós, ao estarmos unidos com Cristo, somos pedras também.

    ResponderExcluir
  38. Um segundo ponto que gostaria de chamar sua atenção é o seguinte: você deixou dois questionamentos meus pendentes (por azar, os que eu mais queria que fossem respondidos). Perguntei a você (1) como é que podemos saber se Deus existe ou não e (2) como é que podemos saber qual é a religião correta (se é o islamismo, ou o budismo, ou o hinduísmo, ou o judaísmo, ou espiritismo, ou cristianismo...).

    Fiz esses dois questionamentos porque você afirmou: “E essa questão de só ‘aceitar o que um líder diz com base em evidências plausíveis de que aquela Palavra é mesmo de Deus’ cai num raciocínio circular: se há várias interpretações sobre um determinado assunto, como saber qual delas era a intenção original? No meu julgamento pessoal? Veja que a falta de uma autoridade na Terra leva ao relativismo bíblico, e com essas múltiplas interpretações - sem ser possível saber qual delas é a correta - fica impossível saber qual é a Verdade”.

    Note que o seu argumento para validar a autoridade suprema do papa e da Igreja é que: se não houvesse tais autoridades supremas (infalíveis doutrinariamente), não nos seria possível saber qual é a verdade dentro do cristianismo. Mas, ora, o seu argumento também serve para a busca pela verdade antes de ser cristão e antes mesmo de ser teísta. Como saber qual é a verdade se existem tantas filosofias e religiões diferentes, tantas interpretações distintas da realidade?

    Aliás, antes de ser cristão, como saber que a Bíblia está correta? Com base na autoridade do papa? É claro que não (e qualquer católico concordará com isso). É esse questionamento que quero que você responda. Porque a sua resposta para esse questionamento servirá para o questionamento que você me fez. Aquilo que me dá convicção de que Deus existe e que o cristianismo é correto é, precisamente, aquilo que me dará convicção do que é a verdade dentro do cristianismo. Eu acredito que são evidências. E você?

    Quanto aos seus demais questionamentos, não vou responder agora porque eu gostaria que você respondesse primeiro a estes argumentos e questionamentos que expus.

    Abraços. :D

    ResponderExcluir

Caro leitor,
Evite palavras torpes e linguajar não compatível com a filosofia do blog. Obrigado.