quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Analisando o conteúdo do Vídeo “Já estamos no Sétimo dia” – Parte 1

Há algum tempo, em um grupo virtual de debates do qual participo, um irmão postou um vídeo de nome “Já estamos no sétimo dia”. O vídeo é uma palestra de pouco mais de meia hora, na qual o palestrante argumenta que o quarto mandamento (a guarda do sétimo dia da semana, o sábado) era um símbolo do verdadeiro descanso, descanso espiritual em Cristo. Ou seja, não é mais necessário guardar um sábado literal (de 24 horas) e nem um domingo (como fazem muitos cristãos em lugar do sábado).

Como de costume, preferi não fazer comentários precipitados. Em vez disso, eu prometi que veria o vídeo e que faria uma análise do mesmo em uma postagem aqui no blog. Por falta de tempo e alguma preguiça (eu confesso), demorei a ver o vídeo. Agora que já vi, posso expor meus pontos de vista.

Duas coisas me preocuparam no vídeo. A primeira: as más interpretações dos textos bíblicos pelo palestrante. A segunda: o uso descabido de analogias. O que farei aqui será mais uma explicação de cada texto bíblico, citando entre eles as afirmações que foram feitas pelo palestrante e, mostrando porque são incoerentes.

1) Gênesis 2:1-3:

Assim, pois, foram acabados os céus e a terra e todo o seu exército. E, havendo Deus terminado no sétimo dia a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que, como criador, fizera.
Esse é o primeiro texto utilizado pelo palestrante. Ao lê-lo, ele pergunta: “Deus precisa descansar?”. Como a resposta, obviamente, é “não”, o palestrante conclui que esse descanso de Deus não é um descanso literal, mas uma alegoria, um símbolo, uma metáfora do verdadeiro descanso, que é o descanso espiritual em Cristo. A interpretação proveniente desse texto parece ser um dos pontos-chave da palestra.

Agora, note como que o palestrante comete vários erros aqui. O primeiro é a sua conclusão implícita de que, se Deus não precisa de um dia para descansar de suas obras (que fizera durante a semana), nós, humanos, também não precisamos. Evidentemente isso é um falso raciocínio. Deus pode não se cansar, mas nós nos cansamos. E não falo só de cansaço físico e mental por conta das atividades do dia-a-dia, mas também de um cansaço espiritual gerado pela falta de um tempo maior de concentração em Deus.

Aliás, em todo o vídeo, o palestrante se esforça por traçar uma diferença entre o descanso literal e o descanso espiritual, afirmando que no descanso espiritual, todos os dias são dias de descanso. Aqui podemos catalogar o segundo erro: o palestrante força uma falsa dicotomia entre os dois descansos. Para ele, ou você descansa espiritualmente todos os dias ou você descansa literalmente em um dia fixo na semana.

Acontece que o descanso literal e o descanso espiritual não são opostos um ao outro (e nem poderiam ser), mas se complementam. O descanso espiritual é uma paz de espírito alcançada mediante um relacionamento íntimo com Deus. Isso pode e deve ser feito todos os dias. Basta mantermos uma boa vida de oração, lermos a Palavra de Deus com freqüência (pois ela é alimento para nossa fé), confiar em Jesus, permitir a ação do Espírito Santo dentro nós e etc. Isso é descanso espiritual. E não é necessário deixar de fazer nossas tarefas diárias (trabalho, estudo, faxina, compras...) para obter tal descanso em nossas vidas.

Mas o descanso espiritual tende a ser atrapalhado quando não temos um dia fixo e específico para cessar nossas atividades seculares e descansar literalmente. O tempo que temos concentrado em Deus durante a semana é curto. Há pessoas que tem muitas atividades. E, além disso, o cansaço físico e mental às vezes nos vence, fazendo com que nossos momentos com Deus não sejam tão bons como poderiam ser se estivéssemos descansados. O descanso literal permite que o ser humano reponha suas energias físicas, mentais e espirituais, porque estará longe das atividades seculares que lhe cansaram du-rante a semana e concentrado no Senhor durante um dia inteiro (o que terá peso para a próxima semana, com certeza).

Como o leitor pode ver, não há oposição entre os dois descansos. Os dois são muito importantes e se complementam. Um não existe perfeitamente sem o outro. Se eu não descanso espiritualmente todos os dias, meu dia literal de descanso não terá nenhum propósito. Será apenas um dia de folga e nada mais. E, se eu não descanso literalmente, não só terei um tempo escasso para as coisas de Deus como o cansaço físico e mental irá, eventualmente, atrapalhar minha concentração em Deus.

Curiosamente, o palestrante acaba concordando com isso sem perceber, quando diz (já próximo ao final do vídeo) que o fato de sua igreja se reunir aos domingos não quer dizer que ela guarda o domingo. Em suas palavras: “Nós nos reunimos no domingo por conveniência. Porque é um dia em que a maioria das pessoas está em casa”. Ora, ora, isso é uma confissão de que um dia livre é importante para o descanso espiritual. Se não existisse um dia livre, não existiria reuniões entre os cristãos.

Há um terceiro erro do palestrante ainda: ele conclui que se o descanso de Deus não foi literal, o nosso também não deve ser. Em outras palavras, se Deus não precisa descansar literalmente, então seu mandamento de descanso para o homem tem que ser um símbolo. Mas isso não faz o menor sentido. O próprio texto de Êxodo 20:8-11 indica que Deus “descansou” no sétimo dia como um exemplo para o homem. Não que Deus precise descansar, mas Deus quis dar o exemplo.

A mesma coisa faz Jesus com o batismo. O batismo sempre foi um símbolo de arrependimento, de morte e de ressurreição de uma pessoa em Jesus Cristo. Aquele que se batiza se torna nova criatura. Nasce de novo. Contudo, Jesus não tinha nada do que se arrepender e muito menos precisava nascer de novo. Jesus sempre foi perfeito. É o filho de Deus e o próprio Deus encarnado. Então, é óbvio que Jesus só se batizou para dar o exemplo. Seria ridículo que alguém dissesse: “Ah, como Jesus não precisava se batizar, então isso foi um símbolo; nós não devemos nos batizar literalmente (com água), mas somente nos batizar no Espírito”.

Ainda há um quarto erro do palestrante (e eu só estou no primeiro texto...): ele parece ignorar que a palavra hebraica para descanso também significa “cessar”. Eu não sei falar ou escrever em hebraico, mas é óbvio que o descanso de Deus pode muito bem significar um “cessar” na sua obra de criação. É a mesma coisa de um pedreiro terminar uma obra e afirmar que agora irá descansar dela. Talvez o pedreiro continue trabalhando em outra obra no dia seguinte, mas daquela obra ele descansou, pois a terminou. Esta interpretação é plausível, pois a Bíblia diz que Deus “descansou de sua obra de criação” e não que Deus “descansou de todas as obras, ficando em completa inatividade, porque estava muito cansado física e mentalmente”.

2) Êxodo 20:8-9 e Êxodo 23:12:

Lembra-te do dia de sábado para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a sua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus [...]. 
Seis dias farás a tua obra, mas, ao sétimo dia, descansarás [...].
Estes dois textos são usados pelo palestrante de um modo muito engraçado. Ele começa dizendo que nesses textos se encontra a base para que os sabatistas acreditem que devem guardar um sábado literal de 24 horas. E obviamente faz uma crítica porque são passagens do Antigo Testamento e estamos no Novo, tudo mudou. Mas o que quero destacar é o que ele faz enquanto lê os textos. Segundo ele, há uma “revelação” nos dois textos, algo que só pode ser entendido nas entrelinhas: a frase “Em seis dias farás a tua obra”, é um símbolo do período anterior à vinda de Cristo (a era da lei) e a frase “ao sétimo dia descansarás”, um símbolo do verdadeiro descanso, o descanso espiritual iniciado após a ressurreição de Jesus (a era da graça).

Mas o que prova que, de fato, as frases desses dois textos bíblicos representam aquilo que o palestrante disse que representam? Percebe? Não existe na Bíblia nada que indique essa representação. O palestrante simplesmente procura criar uma representação em cima desses textos bíblicos que entre em acordo com sua interpretação inicial de que o sábado era um símbolo do descanso espiritual. Ou seja, é uma analogia que o próprio palestrante inventou. E se a analogia é do próprio palestrante, e não da Bíblia, ela não tem valor para provar sua interpretação inicial.

Que fique claro: Não há problemas em criar analogias a partir da Bíblia. É uma maneira útil de ensinar e extremamente comum em pregações. Em certo culto em que estive, por exemplo, o pregador fez uma analogia em cima de uma passagem de Jonas, na qual o navio onde o profeta entrou para fugir de sua missão representava nossa vida; o capitão do navio representava a cada um de nós, humanos (em especial os cristãos); e Jonas, o profeta desobediente da história, representava aquilo que deixamos entrar em nossa vida (o navio).

Mas em nenhum momento, o pregador tentou induzir os irmãos a crerem que a analogia provinha da própria Bíblia. A analogia é do pregador. O navio representa nossa vida apenas dentro dessa analogia. Dentro da Bíblia, o navio é o navio. Não há nada que indique em qualquer lugar das Escrituras que, de fato, a história de Jonas foi feita para representar nossa relação com o que colocamos em nossa vida.

Outro ponto risível em cima desses dois textos é quando o palestrante descreve como teria sido o período anterior a vinda de Cristo (os “seis dias de obras”, segundo a sua interpretação): “Nos primeiros seis dias é por obras, sacrifício; paga preço”. Ei, péra aí meu irmão! O que exatamente é por obras e sacrifício, no Antigo Testamento? Será que o palestrante está falando da salvação e da relação com Deus? Bem, pelo menos é isso o que a frase induz o espectador a pensar. E se isso se torna um fato na cabeça do espectador (mesmo que só no inconsciente), a rejeição de tudo o que for dito no Antigo Testamento se torna automática. Afinal, quem vai aceitar qualquer coisa que provenha de um conjunto de livros que “prega” a salvação por mérito próprio?

Entretanto, nós sabemos que jamais um ser humano foi salvo por mérito próprio, por fazer boas obras ou por observar a lei. O capítulo 11 da epístola aos Hebreus, deixa claro como água que os heróis do Antigo Testamento foram todos salvos por causa da fé que tinham. O apóstolo Paulo em Romanos 4 e em Gálatas 3 também não deixa dúvidas sobre isso. Então, ou o palestrante ignora a função da fé no Antigo Testamento (o que acho pouco provável) ou pretende fazer o espectador ignorar. Seja como for, o ouvinte menos estudioso da Bíblia fica com impressão de que o relacionamento com Deus e a salvação no Antigo Testamento ocorria mediante a lei. Uma distorção violenta!

3) Jeremias 31:33:

Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração as inscreverei; eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.
Continuando com sua crítica aos sabatistas, o palestrante conta que uma vez, ao debater com um sabatista na internet, o sabatista disse: “Eu até concordo que as leis de aspecto cerimonial, como você diz, foram abolidas na cruz. Mas os dez mandamentos continuam vigentes”. A resposta do palestrante foi: “Mas os dez mandamentos não são mais para serem cumpridos na letra, mas no nosso coração, no nosso espírito”. Então, o palestrante cita o texto de Jeremias, para argumentar que na Nova Aliança a lei está no coração e não em tábuas de pedra (ele cita II Coríntios 3:6-9 também, que já analisarei).

A minha pergunta é: qual é a diferença entre a lei estar em tábuas de pedra e a lei estar dentro do coração? Segundo a interpretação do palestrante, a diferença reside em cortar alguns mandamentos da lei e flexibilizar outros. Obviamente ele não diz isso com essas palavras, mas é exatamente o que ele quer dizer quando afirma que os dez mandamentos não se resumem àqueles dez mandamentos descritos em Êxodo 20:3-17, pois há uma série de “desdobramentos legalistas” nos dez mandamentos que ninguém nunca conseguiu cumprir. Ou seja, o palestrante inventa “desdobramentos legalistas” no decálogo, a fim de ter uma argumento para cortar e/ou flexibilizar alguns mandamentos.

Mas será que é isso mesmo, amigo leitor? Eu proponho uma pequena revisão do contexto bíblico para entender se realmente melhor a relação entre os dez mandamentos e nós, cristãos. Para começar, quais são as principais diferenças entre a Antiga Aliança e a Nova Aliança?

Na Antiga Aliança, nenhum homem ainda havia sido feito apto por Deus para ser morada do Espírito Santo. O Espírito habitava no meio do povo e até descia sobre os homens mais santos, mas aquela unção especial do dia do pentecostes, em Atos 2, ainda não tinha ocorrido. Nenhum homem era templo do Espírito de Deus. E isso só poderia acontecer após a justificação dos homens por meio do sacrifício de Jesus Cristo, isto é, na Nova Aliança. Então, na Nova Aliança, nós somos o templo do Espírito de Deus.

Na Antiga Aliança ainda, como Jesus Cristo não tinha vindo, eram necessários uma série de rituais que simbolizavam a vinda e o sacrifício de Jesus (os aspectos rituais da lei), o que tornava a lei mais pesada e difícil de cumprir. Na Nova Aliança, tendo já vindo Jesus, não é mais necessário (e nem faria sentido) cumprir esses rituais.

Também na Antiga Aliança, as leis eram bem mais duras porque Deus precisava proteger suas verdades. Deixasse determinados pecados se espalharem, a existência do judaísmo até a época de Jesus poderia não se concretizar. Foi assim no mundo anterior ao dilúvio, no qual as nações se afastaram tanto de Deus, que restou apenas uma família de 8 pessoas fieis a Deus. Foi assim no mundo posterior ao dilúvio, no qual as nações tornaram a se afastar de Deus a ponto de Deus ter que criar um povo próprio. E poderia ter sido assim em Israel, já que a nação foi tão dura ao longo dos séculos. Contudo, na Nova Aliança isso já não é mais necessário. Os crentes em Deus estão habilitados para formarem uma nação sem terra própria, espalhados por diversos países, firmes em Jesus Cristo e cheios do Espírito Santo para evangelizar.

Fiou claro? Então, agora dá para irmos ao ponto principal: o que a passagem de Jeremias 31:33 quer dizer quando afirma que o Senhor imprimiria suas leis em nossas mentes e as inscreveria em nossos corações? Quer dizer que na Nova Aliança, as leis do Senhor estariam muito mais firmes em nosso interior do que estavam no interior dos que viveram na Antiga Aliança. Sobretudo em função da relação extremamente mais íntima com o Espírito Santo. É o que Paulo diz em Romanos 8:3-4:

Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.
Notou? É impossível a lei salvar o homem. Não é essa a função da lei. A lei só, e tão-somente, tem função de mostrar o que é certo e o que é errado. Ela não provê meios para resolver seu problema. Então, como era (e é) impossível sermos salvos através da lei, Deus enviou Jesus para nos salvar. A fim de quê? A fim de que o preceito da lei possa se cumprir em nós. E como isso é possível? Seria por que somos fortes e temos condição de cumprir a lei com as próprias forças? Não!!! É porque existe um Espírito Santo dentro de nós. Essa é a grande diferença.

Por isso as leis de Deus agora estão inscritas dentro do nosso interior. Esse é o sentido verdadeiro do texto de Jeremias 33:31. Somos habilitados, através de uma forte relação com o Espírito Santo, a sermos cada vez mais obedientes aos mandamentos de Deus. E esses mandamentos não têm “desdobramentos” que ninguém nunca conseguiu cumprir. Estamos falando apenas de mandamentos morais. Os preceitos ritualísticos não valem mais nada. As punições civis (do Estado israelita do Antigo Testamento) para transgressões morais também não fazem mais sentido hoje (como já disse, as atitudes imediatistas de Deus se deviam à necessidade de não deixar que o povo todo se corrompesse). Tudo isso caiu. Estamos falando simplesmente de mandamentos morais, que estão resumidos no decálogo, e cuja base foi apontada por Jesus Cristo como sendo o amor a Deus acima de todas as coisas e o amor ao próximo como a nós mesmos. É só isso. Não há desdobramentos legalistas aqui. Por isso João afirma:

Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo, é nascido de Deus; e todo aquele que ama ao que gerou também ama ao que dele é nascido. Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus: quando amamos a Deus e praticamos os seus mandamentos. Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não são penosos, porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus? (I João 5:1-5).
4) II Coríntios 3:5-9:
[...] nossa suficiência vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do Espírito; porque a letra mata, mas o Espírito vivifica. E, se o ministério da morte, gravados com letras em pedras, se revestiu de glória, a ponto de os filhos de Israel não poderem fitar a face de Moisés, por causa da glória de seu rosto, ainda que desvanecente, como não será de maior glória o ministério do Espírito! Porque, se o ministério da condenação foi glória, em muito maior proporção será glorioso o ministério da justiça.
Em cima desse texto, que foi citado juntamente com o de Jeremias, o palestrante afirmou que os 10 mandamentos, quando guardados na letra, são o ministério da morte e da condenação, conforme Paulo diz. Mas o que Paulo quer dizer aqui, na verdade, tem conexão com aquele texto de Romanos (que vimos há pouco) em que ele escreve que é impossível a lei salvar o homem. Lembra? Pois é. Segundo Paulo, a lei é santa, justa, boa e espiritual (conforme se lê em Romanos 7:12-16). Só que ela não tem função de salvar, justificar ou purificar o homem. Então, a lei, sozinha, só traz condenação e morte, pois esse é o salário do pecado (Romanos 6:23); e a lei não pode fazer nada por nós.

É por isso que Paulo compara as tábuas de pedra do decálogo a um ministério de condenação e morte. Porque, de fato, o que a lei faz é só condenar. Você olha para a lei e ela te diz: “Querido, você adulterou. O salário disso é a morte”. E acabou. As tábuas de pedra não irão te salvar dessa condenação e muito menos irão te ajudar a se livrar de seu pecado. Mas veja o que o apóstolo Paulo afirma no final do capítulo 7 de Romanos e no começo do capítulo 8:

Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo dessa morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor! [...] Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte. Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito (Romanos 7:24-25 e Romanos 8:1-4).
O leitor vê? O apóstolo Paulo se esforça para mostrar para as pessoas que o que perdoa, salva, justifica e purifica é Jesus, com seu sacrifício, é o Espírito Santo com seu trabalhar em nosso interior, é o amor do Pai, nos reconciliando; em suma, é Deus, e não a lei. A função da lei é tão-somente mostrar o que é certo e o que é errado.

É por isso que Paulo contrapõe em II Coríntios os ministérios do Espírito Santo e das tábuas de pedra. É óbvio que o ministério do Espírito é superior. Porque a lei não faz nada a não ser condenar. Mas Jesus Cristo nos justifica e o Espírito Santo nos guia até cumprimento da lei. Como o próprio texto diz: “Nossa suficiência vem de Deus” e não de nós mesmos.

A letra diz: “Você vai morrer, porque pecou”. Mas Jesus diz: “Você vai viver, porque você confessou seu pecado e confiou em mim, então meu sacrifício justificará a sua vida”. Isso não é uma a abolição da lei ou a modificação dela, amigo leitor. O que a lei diz continua sendo certo. A lei continua tendo sua função. Jesus disse: “Não penseis que vim revogar a Lei e os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra”.

O grande lance que Paulo quer nos mostrar não é que a lei foi abolida, mas sim que a lei não pode condenar quem está em Jesus. Por isso, Paulo diz: “Anulamos, pois, a lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei” (Romanos 3:31).

5) Gálatas 4:8-11:

Outrora, porém, não conhecendo a Deus, servíeis a deuses que, por natureza, não o são; mas agora que conheceis a Deus ou, antes, sendo conhecidos por Deus, como estais voltando, outra vez, aos rudimentos fracos e pobres, aos quais, de novo, quereis ainda escravizar-vos? Guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós tenha eu trabalhado em vão para convosco.
Neste ponto, o palestrante começa a argumentar que o apóstolo Paulo não era a favor da guarda do sábado literal. Ele tenta fazer os espectadores crerem que quando o apóstolo fala “guardais dias” está se referindo ao sábado. O palestrante é tão enfático nessa parte que chega a dizer com todas as letras: “O que é ‘guardar dias’, irmãos? É o Shabbat! É o Sábado!”. Não sei se rio ou se choro com isso... Melhor é refutar.

É claro que esse “guardar dias” não se refere ao sétimo dia da semana. Os judeus tinham sete feriados sagrados nos quais se faziam festas. Estes feriados também eram chamados de sábados, pois sábado significa “cessação” (ou seja, feriado) e faziam parte do sistema cerimonial que prefigurava, com cada um de seus detalhes, o sacrifício de Jesus Cristo. Os judeus também tinham meses, tempos e anos sagrados que faziam parte desse sistema ritualístico.

Mas o sétimo dia da semana nunca foi um preceito cerimonial, mas sim um mandamento moral que foi dado por Deus para que nós descansássemos e para que isso fosse um símbolo de que Ele é o Criador. Foi um mandamento dado por Deus antes de existir Israel, hebreus, 12 tribos, Jacó, Isaque e Abraão. Foi dado no final da primeira semana que existiu. E para ratificar sua importância, o Senhor Deus o colocou nos 10 mandamentos, no monte Sinai, com o seguinte início: “Lembra-te”.

O sábado é um mandamento moral. Não há dúvidas disso. É um mandamento tão moral que até mesmo o palestrante sabe que nós precisamos de um dia de descanso em nossas vidas; um dia livre do trabalho e das tarefas seculares, no qual é conveniente que se faça um culto a Deus. Também o palestrante com certeza concordaria que um dia assim é bom para que possamos estar junto de família e amigos. Quer dizer, são coisas que nós podemos fazer durante a semana, mas que o trabalho e a correria de cada dia não nos dá muito tempo. Então, o sábado é um dia de relacionamento com Deus e com o ser humano que precisa existir no fim de cada semana. É um mandamento moral.

Aí vem o palestrante me dizer que “guardar dias” se refere ao sábado. Ah, pelo amor de Deus, meu querido! O contexto da carta e da passagem nem sequer falam de preceitos morais. Se olharmos um pouco mais à frente, no capítulo 5 de Gálatas, lemos:

Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão. Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará. De novo, testifico a todo homem que se deixa circuncidar que está obrigado a guardar toda a lei. De Cristo vos desligastes, vós que procurais justificar-vos na lei; da graça decaístes. Porque nós, pelo Espírito, aguardamos a esperança da justiça que provém da fé. Porque, em Cristo Jesus, nem a circuncisão, nem a incircuncisão têm valor algum, mas a fé que atua pelo amor.
Circuncisão, meu querido! Paulo está falando meramente de rituais judaicos. É claro, então, que “guardar dias” se refere àqueles feriados judaicos. O que esses feriados representavam já havia se cumprido. Jesus Cristo veio, sofreu, morreu, ressuscitou e nos deu vida. Não havia mais necessidade de observá-los. Mas o sétimo dia da semana é um preceito moral e necessário ainda nos dias de hoje.

6) Filipenses 3:3:

Porque nós é que somos a circuncisão, nós que adoramos a Deus no Espírito, e nos gloriamos em Cristo Jesus, e não confiamos na carne.
O palestrante cita esse texto por alto, para afirmar que guardar o sétimo dia é confiar na carne. Nada mais tolo. Guardar o sétimo dia é reconhecer que nós precisamos de um dia de descanso, bem como reconhecer que o Deus criador no Antigo Testamento é o mesmo Deus criador no Novo Testamento. E outra coisa: o assunto é circuncisão e rituais judaicos mais uma vez. Nada tem a ver com o sétimo dia.

7) Hebreus 10:1:

Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano, perpetuamente eles oferecem.
Aqui, o palestrante argumenta que o sétimo dia é uma sombra, que o verdadeiro sábado é Jesus Cristo, que o verdadeiro sábado é a graça de Deus. Veja que ele persiste em seu erro de misturar os assuntos. A epístola aos Hebreus é uma das mais simples de se interpretar. Fala toda hora de sacrifícios de animais, de serviços de sacerdotes, do santuário judaico, enfim, é só ritual. O autor usa a carta toda para falar o que cada ritual representava. Dizer que ele está falando de preceitos morais da lei (como o sábado) é até uma heresia. Se aceitarmos isso, teremos que aceitar coisas como: “Ah, ‘não adulterarás’ é apenas sombra de um bem vindouro e não algo literal que devo fazer ainda hoje”.

To be Continued...

Bem, já deram dez páginas aqui no Word (sim, eu digito no Word e depois passo para o blog). É muita coisa para se ler na internet de uma vez só. Então, continuaremos na próxima postagem. Nela falarei sobre a passagem de Mateus 11:28-30 (citada pelo palestrante para dizer que o sábado é Jesus Cristo), sobre o capítulos 4 da epístola aos Hebreus (que merece uma explicação mais detalhada) e sobre a passagem de Romanos 6:14 (que não é citada na palestra, mas que permeia todo o pensamento da palestra). É isso. Espero ter sido claro até aqui.

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