domingo, 30 de dezembro de 2012

Destrinchando Zeitgeist - Parte 2: Ignorância Estratégica

Na primeira parte de Destrinchando Zeitgeist, vimos que as principais alegações do documentário são falsas. Com base em obras clássicas e antigas das mitologias pagãs, tais como O Livro dos mortos, Textos da Pirâmide, Odisséia, O Trabalho e os Dias, Teogonia, Textos do Sarcófago, Mahabharata, Bhagavata Purana e outras, ficou claro que os supostos paralelos existentes entre Jesus Cristo e os mitos pagãos se resumem a comparações forçadas, interpretações subjetivas (e parciais), erros de cronologia, erros de metodologia histórica e falsificações grosseiras.

Só para lembrar, nós analisamos os supostos paralelos existentes entre Jesus e Osíris, Hórus, Dionísio, Átis, Krishna e Mitra, que são os principais do documentário, e ainda alguns que puxei aleatoriamente de uma extensa lista que o documentário passou em alta velocidade na tela (por que será, né?), a saber, Sidarta Gautama (Buda), Odin, Thor, Tamuz e Baal. Se o leitor está se perguntando como os produtores de Zeitgeist conseguiram ser tão mentirosos, picaretas e desonestos, fique tranqüilo; vou explicar em outra postagem.

Nessa postagem, vamos analisar algumas alegações de Zeitgeist que se baseiam no que eu chamo de “ignorância estratégica”. Ignorância estratégica é o ato de ignorar propositalmente partes de um assunto que não são convenientes para o argumento que se está procurando sustentar. Vamos lá?

“A Bíblia é um livro astrológico e Jesus é o deus-sol do cristianismo” 

Segundo sustenta o documentário, a adoração ao sol teria influenciado diversas religiões ao longo dos milênios, dentre as quais se incluem o judaísmo e o cristianismo, este último tendo Jesus como o seu deus-sol.

Entretanto, a alegação esbarra em dois sérios problemas. O primeiro: a Bíblia é clara ao afirmar que a adoração a sol, lua, estrelas e qualquer coisa criada, é abominável a Deus, pois Deus é maior que todas essas coisas, sendo antes o criador. O segundo: a Bíblia enfatiza diversas vezes que o Deus judaico-cristão é o Deus criador. Ele não é um deus-sol, nem um deus-lua, nem um deus-terra, nem um deus-tempestade. Confundi-lo com aquilo que Ele mesmo criou é algo que não pertence e nunca pertenceu à doutrina dos judeus ou dos cristãos. Vamos ver alguns exemplos.

Em Deuteronômio 4:19, podemos ler:
Guardem-se para que não levantem seus olhos para os céus e, vendo o sol, a lua e as estrelas, a saber, todo o exército dos céus, sejam seduzidos a inclina-rem-se perante eles, prestando culto a essas coisas que o Senhor, nosso Deus, repartiu a todos os povos debaixo de todos os céus.
Isso está presente no livro de Deuteronômio, Antigo Testamento, que foi escrito em cerca de 1.500 anos antes de Cristo, quando o judaísmo começava a se formar como uma religião oficial. No mesmo livro, mais adiante, lemos:
Quando em seu meio, em alguma das cidades que o Senhor, seu Deus, lhe dá, for achado algum homem ou mulher que proceda maliciosamente aos olhos do Senhor, seu Deus, quebrando a sua aliança, e que vá, sirva a outros deuses e os adore, ou adore ao sol, ou à lua, ou a todo o exército do céu, o que eu não ordenei; e isso lhe seja denunciado e você ouça; então, você procurará saber se é verdade e sendo verdade e certo que se fez tal abominação em Israel, levará o homem ou a mulher que fez este malefício às tuas portas e os apedrejará, até que morram (Deuteronômio 17:2-5).
Veja que a religião judaica era bem enfática no que dizia respeito à proibição de adorar astros. É ridículo sustentar, como sustenta Zeitgeist, que a religião judaica era baseada no zodíaco. Mas, continuemos. Em Jó 31:26-28, o personagem Jó, afirma:
(...) se olhei para o sol, quando resplandecia, ou para a lua, que caminhava esplendente, e o meu coração se deixou enganar em oculto, e beijos lhes atirei com a mão, também isto seria delito à punição de juízes; pois assim negaria eu ao Deus lá de cima.
Em II Reis 23:5, também existe algo interessante. O então rei judeu Josias, inicia uma reforma religiosa, a fim de fazer cumprir as ordenanças das Escrituras Sagradas que, na época, em grande parte, estavam sendo ignoradas pelo povo. Um de seus atos foi o seguinte:
E destituiu os sacerdotes pagãos nomeados pelos reis de Judá para queimarem incenso nos altares idólatras das cidades de Judá e dos arredores de Jerusalém, aqueles que queimavam incenso a Baal, ao sol e à lua, às constelações e a todos os exércitos celestes.
Então, o que vemos aqui é que muitas pessoas poderiam até se corromper (como, de fato, ocorreu diversas vezes), contudo, a religião judaica jamais ensinou a adoração à astros. Quem o fazia, estava indo contra o judaísmo. Um último texto deixa ainda mais claro essa verdade. Está em Ezequiel 8. Lemos:
E de novo o Senhor Deus me disse: ‘Você os verá cometerem práticas ainda mais repugnantes’. Então ele me levou para a entrada da porta norte do templo. Lá eu vi mulheres sentadas, chorando por Tamuz. Ele me disse: ‘Você vê isso, filho do homem? Você verá práticas ainda mais repugnantes do que esta’. Ele então me levou para dentro do pátio interno do templo, e ali, à entrada, entre o pórtico e o altar, havia uns vinte e cinco homens. Com as costas para o templo do Senhor e os rostos voltados para o oriente, estavam se prostrando e adorando o sol (Ezequiel 8:13-16).
Este é um relato de uma visão do profeta Ezequiel. Na visão, Deus lhe dizia que muitos do povo estavam praticando coisas repugnantes. Entre elas, vemos a adoração a Tamuz, aquele deus da colheita que analisamos, lembra? E há aqui também, a citação da adoração ao sol. Como fica patente, a religião judaica condenava veementemente esse tipo de atitude. Simplesmente não fazia parte da doutrina judaica à adoração a astros.


Ora, o mesmo pode-se dizer da religião cristã, já que o cristianismo veio a surgir do judaísmo. O apóstolo Paulo deixa clara a posição cristã quando escreve sua epístola aos Romanos, dizendo que muitos homens “trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram a coisas e seres criados, em lugar do Criador, que é bendito para sempre” (Romanos 1:25).

Paulo tinha bem clara em sua mente a noção de que o Deus que ele adorava era o Deus criador de todas as coisas. Então, coisas como sol, lua, estrelas, terra, água, fogo, homens, mulheres, animais e plantas eram meras criaturas, não devendo ser adoradas em hipótese nenhuma. Apenas o Deus criador poderia ser adorado. Por isso, o mesmo Paulo diz o seguinte para aos pagãos que pensavam que ele e seu amigo Barnabé eram deuses, em Atos 14:15:
Senhores, por que fazem isso? Nós também somos homens como vocês, sujei-tos aos mesmos sentimentos, e estamos anunciando o evangelho para que destas coisas vãs vocês se convertam ao Deus vivo, que fez o céu, a terra e o mar e tudo o que há neles (...).
Em circunstâncias semelhantes, quando na Grécia, pregando para adoradores de diversos deuses diferentes, Paulo diz, em Atos 17:23-24:
Pois esse Deus que vocês adoram sem conhecer é precisamente aquele que eu estou anunciando. O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas.
O discípulo João mostra que a adoração não era uma contradição a essa noção de adorar a um só Deus, o Deus criador. Ele diz nas primeiras palavras de seu evangelho:


No princípio existia o Logos, e o Logos estava com Deus, e o Logos era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele e, sem ele, nada do que foi feito se faria. (...) E o Logos se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai (João 1:1-3 e 14).

O Logos ao qual se refere João é Jesus. Costuma a ser traduzido como “O Verbo” ou “A Palavra”. O importante desse texto é que Jesus era entendido como sendo parte do próprio Deus. Para o cristianismo não há, nem nunca houve mais de um Deus. O Pai, o Filho (Jesus) e o Espírito Santo são todos partes de um só Deus, tal como três pedaços de uma única laranja não deixam de ser uma mesma laranja, embora tripartida. E esse Deus triúno do cristianismo é o Deus criador, como acabamos de ver. 

O Deus judaico-cristão sempre foi reconhecido e diferenciado dos demais deuses de outras religiões como o Deus criador. Citamos passagens do Novo Testamento que comprovam isso. Podemos citar também muitas do Antigo Testamento, como a que está em II Crônicas 2:11-12, onde lemos:
Hirão, rei de Tiro, respondeu por uma carta que enviou a Salomão, dizendo: ‘Porque o Senhor ama ao seu povo, te constituiu rei sobre ele’. Disse mais Hirão: ‘Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, que fez os céus e a terra’ (...).
Tiro não era uma cidade de Israel. O rei de Tiro não era judeu. No entanto, ele reconhecia que o Deus de Israel não era um deus-sol, ou um deus-lua, mas o Deus que fez os céus e a terra.


O profeta Jonas, ao ser questionado por alguns homens pagãos sobre qual era o deus a que ele servia, respondeu assim:
Sou hebreu e sirvo ao Senhor, o Deus do céu, que fez o mar e a terra. Então, os homens ficaram possuídos de grande temor e lhe disseram: ‘O que é isso que você fez?’, pois sabiam os homens que ele fugia da presença do Senhor, porque lhes havia declarado (Jonas 1:9-10).
Eu poderia citar pelo menos mais uma dúzia de passagens que comprovam que o judaísmo e o cristianismo não apresentam nenhum vínculo com a astrologia, o zodíaco e a adoração a divindades que nada mais são do que criaturas, como o sol e a lua.

O que Zeitgeist faz é forçar comparações, baseado em elementos que não tem a menor importância. Por exemplo, em determinado trecho, o documentário afirma que a prova de que o cristianismo tem a ver com o zodíaco são diversas passagens que usam o termo “era” (no sentido de período). Ora, mas o fato de alguém se utilizar do termo “era” não significa que essa pessoa siga o zodíaco. Somente um babaca que não tem o que fazer, poderia usar um argumento pífio desses.

Aliás, no que diz respeito a esse assunto do zodíaco, o documentário mostra ter sido feito por um bando picaretas sem vergonha de mentir. Por exemplo, há um trecho em que o documentário cita o texto de Lucas 22:7-12, dizendo que nesse texto os discípulos perguntaram a Jesus quando seria a próxima passagem de “era” depois que ele fosse embora (o que seria uma alusão às passagens de “era” do zodíaco).

Mas quando vamos averiguar o que está escrito nesse trecho de Lucas, o que lemos é o seguinte:
Chegou o dia da Festa dos Pães Asmos, em que importava comemorar a Páscoa. Jesus, pois, enviou Pedro e João, dizendo: ‘Vão preparar a Páscoa para que nós a comamos’. Eles lhe perguntaram: ‘Onde quer que a preparemos?’ Então, lhes explicou Jesus: ‘Ao entrarem na cidade, encontrarão um homem com um jarro de água. Sigam-lhe até a casa em que ele entrar e digam ao dono da casa: ‘Onde é o aposento no qual eu irei comer a páscoa com os meus discípulos?’ Ele lhes mostrará um espaçoso cenáculo mobilhado. Ali, façam os preparativos.
Ah! Faça-me o favor! Onde é que nós encontramos nesse texto uma menção à passagem de era no zodíaco? Não está claro que os discípulos estavam perguntando a Jesus onde fariam a festa judaica da Páscoa? 

Como podemos observar, não há limites para as mentiras que os produtores do documentário veiculam como fatos. Aqui já se pode ter certeza de que tudo o que for possível ser distorcido ou até mesmo inventado para criticar a religião tradicional, será feito pelos produtores. Afinal, todos eles estão profundamente vinculados ao ódio contra a religião tradicional.

“A Bíblia toda é um plágio”

Aqui temos a afirmação de que a Bíblia toda é um plágio. As provas seriam as diversas histórias parecidas com histórias bíblicas, que podemos encontrar em outras religiões antigas. O documentário cita a história da arca de Noé e o dilúvio, a história de Moisés sendo salvo do infanticídio em um cesto, a história de Moisés como legislador de um povo e até os dez mandamentos. Vamos analisar.

A começar pela história da arca de Noé e do dilúvio, não é nenhuma surpresa para nós, cristãos, que existam diversas culturas, religiões e tradições no mundo que são muito parecidas com a história bíblica. Há tempos e tempos nós temos usado este fato como um argumento a favor do evento em si. O que se espera de um evento global que tenha ocorrido de verdade? Não são diversos relatos do mesmo?

Ora, encontramos em mais de trezentas culturas espalhadas por diversas regiões do mundo as histórias da criação do mundo e do homem, da queda da raça humana, do dilúvio e da arca. Todas têm aspectos diferentes, mas o básico é o mesmo. Isso é uma boa evidência de que o fato ocorreu e que os relatos foram sendo passados de geração em geração, tendo seus elementos básicos conservados em várias culturas. Trata-se de um argumento sólido porque, de fato, é difícil explicar como todos esses relatos podem ter aparecido em algumas culturas que jamais tiveram comunicação umas com as outras e que, no entanto, têm relatos semelhantes sobre a criação e um suposto dilúvio.

Se os produtores do documentário Zeitgeist tivessem lido livros como O Fator Melquisedeque, de Don Richardson, Escavando a Verdade, do Dr. Rodrigo Silva, The American Indian Mythes, de A. G. Roth, Em busca da Arca de Noé, de Dave Balsinger e Charles Sellier Jr., God’s promise to the Chinese, de Ethel Nelson e Faith of Our Fathers, de Archie Lee, saberiam que esses paralelos são exatamente o que se espera caso os fatos da criação, da queda do homem, da arca e do dilúvio tenham ocorrido de verdade. Ou seja, a Bíblia não é, necessariamente, um plágio dessas histórias, mas essas histórias todas descendem de um fato real.

Com relação à história de Moisés sendo salvo de um infanticídio, Zeitgeist nos presta o desserviço de distorcer a história de Sargão I, rei da Acádia, para torná-la mais parecida com a de Moisés. Este homem foi um rei que teve a história de sua infância registrada em um tablete que data de cerca de 2250 a.C. O relato da história é esse:
Sargão, o rei poderoso da Acádia, sou eu. Minha mãe era humilde. Meu pai, não tive a oportunidade de conhecer. O irmão do meu pai vivia nas montanhas. Minha cidade é Azupanu, que está situada na ribeira do Eufrates. Minha mãe me concebeu em secreto. Em secreto ela me deu à luz. [Ela] me colocou em um cesto de juncos e fechou a tampa com betume. [Ela] me colocou no rio [Eufrates], que não me submergiu. O rio me levou boiando até Akki, o regador das águas. Akki, o regador de água, me aceitou como seu filho e me criou.
Ora, veja. A história realmente tem aspectos semelhantes com a de Moisés. Mas é preciso, antes de tudo, ressaltar que a narrativa de Sargão não diz que ele foi salvo de um infanticídio, como o documentário sustenta. Agora, vamos às explicações. Seria a história de Moisés um plágio da história de Sargão? Não necessariamente.


Em primeiro lugar, devemos lembrar que no mundo antigo, os rios eram tidos como sagrados. Assim, colocar um bebê dentro de um cesto não seria considerado tão incomum como seria hoje. A história de Rômulo e Remo, de Roma, ainda que seja uma lenda, confirma o que eu estou falando. Poder-se-ia colocar um bebê em um rio como uma maneira de oferta aos deuses. Da mesma forma, uma mãe que não tivesse condição de cuidar de seu filho, poderia “dá-lo aos deuses” ou deixá-lo no rio com o intuito de que alguém que estivesse nas margens, visse o cesto e adotasse a criança.

O que estou falando não é absurdo. Por exemplo, todos nós sabemos que igrejas e orfanatos sempre receberam bebês em cestos de mães que os deixavam na porta e iam embora. Isso era muito comum no final do século XIX e início do século XX, quando era considerado um escândalo moças solteiras engravidarem. Em certa época, chegou a se criar nas igrejas católicas a chamada “Roda dos Rejeitados” ou mesmo “Roda dos Excluídos”, um local específico para que mães solteiras colocassem seus bebês.

Se colocarmos as coisas nesses termos, as histórias de Moisés e Sargão deixam de ser uma coincidência tão incrível e passam apenas a expressar uma idéia recorrente e/ou fácil de ser pensada pelas pessoas do mundo antigo. Veja, não é tão improvável que no mundo antigo duas mães tenham posto seus filhos em um cesto num rio com intuito de que alguém na margem os visse e os adotasse. Sobretudo, tendo em mente que um bebê vindo do rio provavelmente seria considerado um presente dos deuses, dado o caráter sagrado dos rios.

Alguém pode alegar: “Ah, mas é muita coincidência tanto Moisés como Sargão terem se tornado homens famosos”. Bem, é muita coincidência se considerarmos que só eles foram postos em rios por suas mães. Mas e se centenas de crianças tiverem passado pela mesma situação ao longo dos séculos do mundo antigo? Entre centenas, dois deles se tornarem famosos não é algo tão improvável. Talvez a idéia de colocá-los em rios tenha partido justamente da observação de que outras mães já tinham feito isso. 

A hipótese é plausível. Não há motivo para jogá-la fora, quando sabemos que os diversos relatos de bebês deixadas em igrejas e orfanatos expressam eventos diferentes (que eram recorrentes) e não cópias de um único evento. Dizer que a hipótese de Moisés ser um plágio é a única plausível não passa de desonestidade.

Ainda uma informação interessante pode ser dita aqui. Quando os estudiosos alegam que a história de Moisés seria um plágio da história de Sargão, afirmam que os israelitas teriam aprendido a história quando foram cativos da Babilônia em 587 a.C. e acoplado à história de Moisés. Se isso é fato, era de se esperar que a história de Moisés estivesse cheia de termos que remetessem à língua babilônica da época do Egito. 

Mas, conforme o egiptólogo James K. Hoffmeier mostra em seu livro Israel in Egypt, as palavras utilizadas na narrativa hebraica não são nem da língua babilônica e nem da língua hebraica da época do exílio. Em vez disso, o relato da história de Moisés está permeado de termos técnicos que eram comuns no Egito, em um período muito distante do cativeiro israelita na Babilônia. Isso evidencia que o autor do relato só pode tê-lo escrito no período em que viveu no Egito, muito antes da época do cativeiro. Isto é, a história não deriva da mitologia babilônica.

Continuando, temos ainda as alegações de que a história de Moisés como sendo um legislador, seria um plágio das histórias de Manou, Minos e Mises. Mas eu não sou idiota para comprar a idéia de que o simples fato de existirem legisladores nos mitos do paganismo prova que Moisés é cópia deles. Se for assim, posso dizer que os deputados que temos hoje em dia na câmara são cópias desses mitos também, pois são legisladores, não é mesmo?

O documentário afirma que Minos, de Creta, teria recebido leis de Zeus em um monte e as deu ao povo. Não encontrei isso, mas se há algo do gênero na mitologia grega, não é de se surpreender. Os deuses, em todas as religiões, sempre moraram nos céus. Havia na mitologia grega o alto monte Olimpo, que era a morada dos deuses. É compreensível, assim, haver histórias de Zeus ordenando algo de algum monte. Até aí, não há nada muito substancial para provar plágio. Algo que vamos abordar mais à frente é o fato de que algumas semelhanças básicas entre as religiões são esperadas; essas não provam plágio, pois são básicas e inevitáveis.

Por fim, temos a alegação de que os dez mandamentos são um plágio do “Feitiço 125 do Livro dos Mortos”. Finalmente, o documentário cita uma fonte antiga! Mas é triste que a alegação seja baseada em uma comparação tão forçada. Tenho um download da obra em meu computador. O tal feitiço trata-se de uma orientação que é dada, a quem morre (pelo que pude entender da fragmentada narrativa). A orientação é chamada de “Confissão Negativa”. Ali, a pessoa deveria saudar cada deus e dizer que não fez um determinado mal. Então, temos frases como: “Eu não roubei”, “Eu não matei”, “Eu não fui violento”, “Eu não menti” e etc.

Dizer que os dez mandamentos são um plágio disso é ridículo. O decálogo é tão somente um conjunto de regras morais que sempre existiram e que todas as nações do mundo conheciam, embora muitas pessoas não praticassem. Sempre foi imoral o ato de matar. Sempre foi imoral o ato de roubar. Sempre foi imoral o ato de mentir. Desde que o mundo é mundo, essas regras existem. Os dez mandamentos são simplesmente a lei por escrito. Então, não há plágio nenhum aqui. As tábuas da lei apenas catalogaram o que já existia há milênios. Veja o quão baixo os produtores de Zeitgeist chegaram...

“A Bíblia plagia suas próprias histórias”

Aqui o documentário alega que a Bíblia plagia até suas próprias histórias. Como exemplo, é citado José, filho de Jacó, um personagem de Gênesis, que teria paralelos com Jesus. Os paralelos citados são os seguintes: ambos nasceram de um milagre; José era um de 12 filhos e Jesus tinha 12 discípulos; Jesus foi vendido e José também foi; Judá sugeriu a venda de José e Judas sugeriu a venda de Jesus; José começou seus trabalhos aos 30 anos e Jesus também.

As informações estão corretas. Encontram-se na Bíblia. Mas dois pontos devem ser levantados aqui. O primeiro: as semelhanças não são tão grandes. O documentário as cita de maneira genérica para gerar uma impressão de que as histórias são praticamente idênticas. Mas não são. Veja: Jesus nasceu de uma virgem. José nasceu de uma estéril. Jesus não era fruto de algum tipo de união. José era fruto da união entre Jacó e Raquel (seus pais biológicos). Jesus mais seus 12 discípulos somam 13 pessoas. José mais seus 11 irmãos, somam 12 pessoas. Jesus não foi vendido, mas sim entregue às autoridades por 30 moedas de prata. José foi vendido para ser escravo e por 20 moedas. Judas era um discípulo de Jesus. Judá era um irmão de José. A sugestão de Judas de entregar Jesus foi feita às autoridades. A sugestão de Judá de vender José como escravo foi feita aos seus próprios irmãos. Enfim, existem muitas diferenças também.

O segundo: embora as semelhanças entre José e Jesus não sejam tão grandes quanto Zeitgeist quer fazer o expectador achar, elas existem. Mas também isso sempre foi de conhecimento dos cristãos e nunca representou um problema. É o próprio Jesus que afirma em João 5:39 que as Escrituras Judaicas (que eram anteriores a ele) falavam principalmente sobre ele. Isso quer dizer que em toda a Escritura existem profecias, simbologias e até histórias reais de personagens que prefiguravam Jesus e sua obra.

O cordeiro sacrificado prefigurava Jesus. O sumo-sacerdote prefigurava Jesus. O templo prefigurava Jesus. O maná no deserto prefigurava Jesus. A água que Moisés fez sair de uma rocha prefigurava Jesus. Os profetas prefiguravam Jesus. A posição de rei de Israel prefigurava Jesus. Davi, Oséias, Jacó, José e Isaque prefiguravam Jesus. 

Deus, como um agente livre em nosso “sistema aberto de mundo” tem toda a capacidade de, sem quebrar o livre arbítrio humano, “mexer os pauzinhos” para que determinados fatos prefigurem um evento vindouro. Então, supondo-se que Deus existe mesmo, encontrar algumas semelhanças entre Jesus e determinadas pessoas da Bíblia é uma confirmação de que toda a Escritura testifica de Cristo.

Antes que alguém diga que estou apenas tentando fugir da lógica, devo lembrar que a Bíblia apresenta mais de 50 profecias e elementos simbólicos escritos centenas de anos antes de Cristo, que dão detalhes sobre a vida e a obra de Jesus. Farei um estudo mais detalhado sobre o assunto em outra ocasião, mas para quem tiver curiosidade, uma leitura de Isaías 53 e de Miquéias 5:2 comprova o que estou dizendo. São profecias bem específicas sobre Jesus escritas centenas de anos antes dele nascer.

Bem, podemos parar por aqui. Vimos como os produtores do documentário são extremamente desonestos e ignoram propositalmente partes importantes da discussão a fim de sustentar seus argumentos anti-religiosos. Mas ainda não acabou. Na próxima postagem da série, nós vamos ver um pouco sobre a terrível distorção feita em cima do que os estudiosos chamam de “Jesus Histórico”. Destrinchar é isso: não deixar nenhum detalhe de fora.
______________________
Bibliografia:
1. Richardson, Don. O Fator Melquisedeque. Vida Nova, 2008.
2. Silva, Rodrigo. Escavando a Verdade. Casa publicadora Brasileira, 2007.
3. Roth, A. G. The American Indian Mythes. 
4. Balsinger, Dave e  Sellier, Charles. Em busca da Arca de Noé. Record, 1976.
5. Nelson, Ethel. God’s promise to the Chinese. Read Books Publisher, 1997.
6. Chan Kei Thong  e Charlene L. Fu. Faith of Our Fathers: God in Ancient China. China Publishing Group, 2006.
8. Wikipédia

2 comentários:

  1. Olha, por respeito ao contraditório, tentei até ler o que escreveu, mas esbarrei no "argumento" de que o documentário (zeitghest) "esbarra" no que "na Bíblia se encontra". Desculpe-me, mas não dá para avançar na leitura se o argumento seria o que diz a própria Bíblia, contestada, ademais, pelo documentário! Boa crença para vc!

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    1. Henderson,

      O documentário não pode dizer que a Bíblia defende a astrologia se a Bíblia condena a astrologia. Isso não é contestação, mas mentira. Se o documentário se baseia em analisar a Bíblia fazendo falsas legações sobre o que ela diz, não dá para creditar o documentário. Boa crença pra você!

      Att.,

      Davi Caldas.

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