sábado, 9 de agosto de 2014

Análise sobre o texto de Mateus 16:18-19

Gostaria de analisar, neste post, a passagem bíblica que está em Mateus 16:18-19. Esse texto é a principal passagem utilizada por católicos para sustentar que (1) a Igreja Católica Apostólica Romana é a única e verdadeira Igreja edificada por Cristo (sendo, inclusive, infalível em matéria de doutrina) e (2) que Jesus estabeleceu ali um cargo de líder máximo da Igreja na terra (Papa), ordenando o apóstolo Pedro como o primeiro na sucessão. 

A ideia aqui NÃO É ofender católicos ou defender protestantes, mas tão-somente fazer uma análise fria do texto. Vamos começar expondo o texto. Usarei uma Bíblia Católica que tenho em meu computador:
E eu [Cristo] te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus (Mateus 16:18-19).
Repare que Jesus chama Simão de Pedro (seu novo nome) que quer dizer “pedra” e diz que sobre esta pedra ele edificaria sua Igreja. A primeira e mais óbvia interpretação que nos vem a mente é que Jesus edificaria sua Igreja sobre Pedro. Mas até aqui, nada podemos concluir sobre a instituição do papado ou ordenação de Pedro como Papa. Jesus simplesmente diz que sua Igreja começaria a ser construída sobre Pedro. E, de fato, isso aconteceu. Exemplifico abaixo.

Em Atos 2 percebemos que quando os discípulos receberam o Espírito Santo e saíram a pregar, o discípulo mais destacado foi Pedro. Foi por meio de sua primeira pregação que três mil pessoas foram batizadas naquele dia de Pentecostes. 

Foi também a Pedro, vale ressaltar, que Deus deu o famoso sonho dos animais puros e impuros, que pretendia ensiná-lo que o evangelho deveria ser pregado aos gentios. Por causa desse sonho, Pedro pregou ao oficial Cornélio e sua família (Atos 10). E, em função dessa experiência foi que Pedro se tornou determinante em uma reunião entre apóstolos para definir se a circuncisão deveria ser imposta aos gentios ou não (Atos 15).

Então, nesta primeira interpretação, o que Jesus queria dizer era isso: que a Igreja começaria ser construída principalmente sobre o trabalho de Pedro. Ele seria a base para esse início. Alguns podem argumentar que o texto não quer dizer só isso, pois Jesus também afirma que Pedro receberia as chaves do céu e teria autoridade de “ligar e desligar” coisas. Entretanto, a mesma autoridade que Deus deu a Pedro nesta passagem, deu também aos demais discípulos em Mateus 18:18-20. Diz o texto:
Em verdade vos digo: tudo o que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu. Digo-vos ainda isto: se dois de vós se unirem sobre a terra para pedir, seja o que for, consegui-lo-ão de meu Pai que está nos céus. Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.
Nesse texto Jesus está falando para os discípulos. Não apenas para os doze, mas para todos os seus futuros seguidores (toda a Igreja), já que os discípulos não poderiam estar nas congregações de todas as cidades do mundo. Jesus estava dando conselhos práticos para os cristãos de cada cidade, de cada vilarejo, de cada ajuntamento de indivíduos que seguiam a Jesus. Então, a autoridade que Jesus outorgou a Pedro para ligar e desligar coisas com as chaves do céu não era diferente da autoridade que ele dera aos demais cristãos que faziam a vontade de Deus. 

Quanto a frase: “As portas do Inferno não prevalecerão contra ela”, é bem óbvio que aqui Jesus queria dizer que a Igreja não seria extinta. Porém, não há nada que nos leve a crer aqui que Jesus estava falando de uma instituição formal. Precisamos entender que a Bíblia nunca se refere a Igreja como uma instituição formal, mas como o corpo místico de Cristo. O corpo místico de Cristo é simplesmente o somatório de todos os seguidores de Cristo espalhados pela face da terra.

O que é um seguidor de Cristo? Em suma, é alguém que crê (e procura viver em conformidade com sua crença) que Jesus é o Messias prometido, que Ele veio a terra em corpo de homem para nos salvar mediante sua morte e ressurreição, que Ele deseja de nós obediência a Sua Palavra (Antigo e Novo Testamentos) e que Ele voltará para buscar todos aqueles que vivem segundo essa crença, a fim de introduzi-los em um novo reino de paz e vida eterna.

Se você crê nessas coisas, faz parte do corpo místico de Cristo, independentemente de estar em uma instituição formal ou não. Podemos imaginar várias situações em que isso poderia ocorrer. Por exemplo, imagine um homem ímpio e descrente que naufragou e foi parar em uma ilha deserta. Toda a tripulação morreu, só restou ele. Entre os destroços, o náufrago encontra uma Bíblia. Começa a ler os evangelhos, passa a crer em Jesus como o Senhor e Salvador do mundo, passa a crer nas verdades básicas da Bíblia, muda seus pensamentos ímpios e inicia uma vida de oração. 

Ora, mesmo não pertencendo a uma instituição formal, este homem faz parte da Igreja, do corpo místico de Cristo. Ele é um seguidor de Cristo. Faz muito mais sentido postular que Jesus se referia a Igreja nesse sentido amplo e místico, capaz de englobar todo e qualquer seguidor de Cristo (ainda que afastado de uma instituição formal por circunstâncias infelizes), do que postular que ele se referia a uma instituição formal, excluindo todo seguidor que, por algum motivo, está fora da mesma.

Voltando a Pedro, há outra interpretação sobre o significado das palavras de Jesus ao discípulo. Uma segunda, não é tão óbvia, mas igualmente plausível, faz notar que quando Jesus chama Simão de Pedro, a palavra Pedro está sendo aplicada mais como um adjetivo do que como o substantivo que é. Jesus estava querendo dizer, através de uma metáfora, que Simão era Pedro porque ele era (ou, viria a ser) firme em Cristo tal como uma pedra é firme em sua natureza. Ou seja, o termo Pedro serviu nesta frase como um substituto de algum outro termo como “firme”, “forte”, “consistente”. 

Desta maneira, a ênfase da frase “e sobre esta pedra edificarei minha igreja” recai sobre o adjetivo e não sobre Pedro. Era como se Jesus estivesse dizendo: “Você é um homem firme em mim e é sobre esta firmeza em mim que eu irei edificar minha Igreja”. 

Uma vez que a firmeza em Cristo não seria uma característica só de Pedro, então Cristo estava dizendo que edificaria sua Igreja através de homens firmes nele como Pedro. Era uma forma de mostrar a Pedro como essa firmeza era importante para toda a Igreja e de incentivá-lo a continuar firme.

Uma terceira interpretação também plausível, embora mais complexa é a de que Jesus estava fazendo uma alusão ao relacionamento profundo que os cristãos deveriam ter para com ele. Cristo deseja de nós um relacionamento tão profundo para com ele que diz que fazemos parte dele. Ele é o cabeça e nós somos o seu corpo. Fazemos parte de Cristo. Desta maneira, se ele é pedra, nós somos parte dessa pedra. Por conseqüência, somos pedras também. 

Se era isso que Jesus tinha em mente (e não é uma figura incomum na mente de Cristo, já que ele contou parábolas como a da Videira – “Eu sou a videira, vós, os ramos”, João 15:5), então quando Jesus chamou Simão de Pedro, quis dizer apenas que Pedro era parte dele mesmo, era pedra. 

E por que era pedra? Por que estava conectado a Cristo, interligando, amalgamado, colado (como na parábola da videira). Enquanto Pedro continuasse assim, seria pedra, como Cristo o era. E era sobre esta pedra, isto é, na própria natureza firme de Cristo, da qual Pedro estava tomando parte naquele momento, que Ele edificaria sua Igreja.

Esta terceira hipótese encontra muito apoio nos textos em que o próprio Pedro identifica Jesus como a Rocha e a Pedra Angular (Atos 4:5-11 e I Pedro 2:1-8). É uma evidência forte de que Pedro compreendeu a imagem utilizada por Jesus na declaração de Mateus 16:18-20.

Como podemos ver, o texto de Mateus 16:18-20 oferece margem para mais de uma interpretação plausível. Contudo, de nenhuma delas é possível concluir que Jesus estava instituindo o papado, ordenando Pedro como o primeiro Papa e dizendo que a Igreja seria infalível. Afirmar isso é ir além do que o texto efetivamente diz. 

4 comentários:

  1. Como ex-ateu e "iniciado" no Cristianismo, procurei saber, de forma imparcial e fria, qual seria o Cristianismo contemporâneo mais coerente com os evangelhos.

    Eu tirei várias conclusões ao longo de minha pesquisa. Mas a maior delas foi a que me fez abandonar tal pesquisa: este debate entre católicos, evangélicos, ortodoxos, etc., só nos faz perder energias enquanto a modernidade (ou pós) e laicização vem devorando a cultura Cristã, em doses lentas e progressivas.

    Trata-se de não atentar contra fogo amigo.

    Hoje, sou católico. Mas aberto a ler bons textos como estes que oferecem outra perspectiva.

    Abraço!

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    1. meu querido, diante dessa tua confissao eu so tenho uma coisa a te dizer: Infelizmente o senhor esta perdidi e nao sabe pra onde deve ir. No dia em que o senhor entender que religiao nao é o caminho, entender que devemos ser servos de CRISTO e cumprir seus ensinamentos, nao se basear por cultura nenhuma, mas si pela PALAVRA DE DEUS; ai sim o senhor vai conseguir ver a vida com os olhos espirituais, como Saulo que se transformou em Paulo!! Peço-te que nao considere isso como uma afronta, mas como uma orientaçao digna de analise e reflexao, pois assim tua vida ira mudar

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  2. Assim pode-se dizer que Pedro é a segunda pedra, ou seja depois da Pedra de Esquina que é Cristo. Olhando na simbologia de uma construção.

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  3. MUITO BOM CARO IRMÃO, SEUS ESCLARECIMENTOS ME AJUDARÃO MUITO NAS MINHAS DÚVIDAS, MAS , GOSTARIA DE FAZER UMA PONTUAÇÃO EM UMA DE SUAS AFIRMAÇÕES.
    QUANDO VOCÊ DIZ "Era como se Jesus estivesse dizendo: “Você é um homem firme em mim e é sobre esta firmeza em mim que eu irei edificar minha Igreja”. IRMÃO, QUANDO JESUS DIZ "SOBRE ESTA PEDRA EDIFICAREI MINHA IGREJA" ELE ESTÁ SE REFERINDO AS PALAVRAS DITAS POR PEDRO INSPIRADO PELO ESPÍRITO SANTO, OU SEJA, A PEDRA É "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.Mateus 16:16" CRISTO É A PEDRA.
    QUE DEUS O ABENÇOE!

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