segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

O casamento dentro da perspectiva bíblica cristã

Dentro da perspectiva bíblica cristã, o casamento foi criado para simbolizar uma relação muito maior e mais importante: a relação entre Deus e o ser humano. Não fosse isso, não haveria qualquer necessidade de casamento. Os anjos, por exemplo, são criaturas assexuadas. Não têm órgãos sexuais, nem desejo. Não se casam, não fazem sexo, não sentem falta ou necessidade desse tipo de relação. Anjos não possuem gênero; não há anjos machos e anjos fêmeas. Há apenas anjos.

Deus poderia criar um universo inteiro de criaturas assexuadas e sem gênero. Deus mesmo não tem gênero ou sexo. Gênero e sexo são meras criações dele, as quais Ele, evidentemente, antecede.

Entretanto, aprouve a Deus criar macho e fêmea, casamento e sexo, a fim de expressar, simbolizar, descrever a relação entre Deus e o ser humano.

O apóstolo Paulo, na Bíblia, afirma que o marido deve amar a esposa como o próprio Cristo amou a Igreja, a ponto de se entregar por ela. Quando lemos isso, somos levados a crer que Paulo estava usando o amor de Cristo para com a Igreja como um símbolo para o casamento. Na verdade é o oposto. Paulo sabia que o casamento é que era um símbolo desse amor. E era por isso que deveria ocorrer de acordo com o que representava.

O casamento que não ocorre nos moldes estipulados por Deus, destoa da realidade que ele representa, perdendo todo o seu sentido e propósito.

Quando um marido agride sua esposa, física ou verbalmente, fere a imagem de Deus. Representa-o como um Deus mal, agressor e sem amor, um Deus que não se preocupa com o ser humano. Quando uma esposa humilha seu marido ou lhe é infiel, fere a imagem da Igreja, "a esposa de Deus", representando-a como uma troglodita ou vagabunda.

A santidade dentro do casamento é muito mais do que meramente uma obrigação entre marido e mulher. É uma obrigação para com Deus. Deve haver amor, respeito, carinho, fidelidade e compromisso no casamento não só porque devemos isso ao nosso cônjuge, mas porque devemos isso a Deus, já que o casamento foi criado para representar sua relação conosco.

Qualquer perversão no conceito de casamento criado por Deus é uma representação falsa de sua relação com a humanidade. Se bato em minha esposa, estou dizendo: "Deus nos agride!". Se traio meu marido, estou dizendo: "Nós não queremos Deus".

É por esse motivo que o casamento só é possível, biblicamente, entre homem e mulher, macho e fêmea. Quando um homem "casa" com outro homem, está representando Deus como um Ser que não se interessa pelo ser humano. Quando uma mulher "casa" com outra mulher, representa o ser humano como um ser que não deseja, nem precisa de Deus. E em ambos os casos, o casamento, que é mero símbolo da relação entre Deus e o ser humano, é elevado a uma posição que não lhe pertence, tornando-se mais importante do que aquilo que representa, a realidade eterna e primária: o amor entre Deus e o ser humano.

Isso se estende a tudo o que se relaciona ao casamento. Quando nos casamos e temos um filho, este simboliza o próprio Jesus encarnado. O apóstolo João usa exatamente esta imagem, em Apocalipse. Quando casamos e temos uma filha, esta simboliza a continuidade da Igreja, do povo de Deus. Não há Jesus encarnado se houver só Deus, ou só Igreja. Não há continuidade do povo de Deus se houver só Deus ou só a Igreja. Deus outorgou ao ser humano o poder de gerar descendência através do amor entre um homem e uma para representar o modo como o amor entre Deus e o ser humano geraria Cristo encarnado para morrer por nossos pecados e a continuidade do seu povo para espalhar as boas novas. É por isso que não há geração de filhos e família se não houver a união entre homem e mulher. Tudo o que diz respeito a casamento, família e geração de filhos está relacionado ao grande amor de Deus pelo ser humano.

Se alguém diz que acha ridículo não modificar a concepção de casamento "só" porque isso não representa Deus corretamente, faz do símbolo algo mais importante que a realidade simbolizada. Não é a realidade que deve ser modificada para se adequar ao símbolo, mas o oposto. O símbolo se sujeita ao real.

Há muitas pessoas que não creem nisso. Isso não me irrita. O que me irrita é quando alguém se levanta para perguntar qual é o problema de se casar com alguém do mesmo sexo, ou de ter um casamento aberto, ou um casamento poliamoroso. Perguntam isso, dizendo: "Eles não estão fazendo mal a ninguém e é uma relação consensual". Mas a imoralidade desses atos, dentro da visão bíblica, não se baseia na ideia de que "é errado porque causa tristeza ao próximo", ou de que "não é consensual". Baseia-se, sim, no que acabei de descrever.

A pergunta do critico, portanto, revela total desconhecimento do que é o casamento na perspectiva bíblica. Ele pretende rebater a concepção bíblica de casamento sem levar em conta a própria base bíblica para essa concepção.

Em suma, a concepção bíblica de casamento pode ser descrida, mas não pode ser considerada incoerente. Se, de fato, o cristianismo está correto, qualquer casamento que fuja do padrão de casamento estabelecido por Deus é errado. E isso é um fato incontestável.

O que acho interessante nisso tudo é como a concepção cristã de casamento (quando seguida corretamente) tem a capacidade de valorizar o casamento mas, ao mesmo tempo, de superá-lo, no sentido de entender que a realidade que ele simboliza é muito maior do que o símbolo. Em outras palavras, o romance entre Deus e o ser humano é que é o centro de tudo, a grande história do universo, o grande enredo de amor pelo qual vale a pena viver e morrer. É por ele que valorizamos nosso casamento aqui na terra, cuidando de nosso cônjuge e de nossa família com devoção; mas também é por ele que superamos esse casamento ao fim de nossa vida terrena, após o último minuto de respiração, quando entramos no descanso que antecede nossa entrada no reino eterno.

No dia em que todo o mal for extinto e Deus recriar esta terra e povoá-la com aqueles que aceitaram o seu sacrifício supremo, todos os tipos de amores que conhecemos serão absorvidos pelo amor de Deus, o qual é a fonte de todos os outros. E todo o amor que teremos em nós e uns pelos outros será o amor de Deus. Então, o símbolo também será absorvido pelo real e nós entenderemos em sua plenitude que o marido é Cristo, a esposa é a Igreja e isso é tudo o que importa.

O cristianismo nos ensina a não centralizar os romances. Todos os romances são apenas manifestações do Grande Romance. E tudo, absolutamente tudo, gira em torno disso. Nada tem importância, tampouco significado fora do amor entre Deus e os homens. Daí o casamento se revestir de sagrado. Daí o amor e o respeito ao cônjuge se tornar muito mais do que ética humanista, mas devoção ao Ser Supremo que criou o casamento para representar o seu perfeito amor. Daí o casamento não se tornar, contudo, o sentido da vida, mas apenas um estágio do amor a ser completado e superado (como quando, completamos uma fase em um jogo, superando-a e tornando-nos aptos para uma fase superior). O cristianismo nos ensina que o amor de casal e mesmo o de família não é o amor supremo, não é o amor final, não é o amor completo e perfeito. Ele é apenas uma parte e mesmo uma ponte pela qual devemos prosseguir em busca do amor supremo, que é Deus.

Em contrapartida, a concepção de casamento, do mundo secularizado, o mundo não-cristão, nos ensina esvaziar o casamento de todas as suas virtudes e obrigações, banalizando-o; mas, ao mesmo tempo, eleva o sentimento de casal, o amor eros, o romance entre duas pessoas, a um patamar que não lhes pertence, escravizando-nos sob o pensamento de que o sentido da vida é amar perdidamente uma pessoa, e que este amor é o mais intenso, elevado, prazeroso e máximo que se pode encontrar. O secularismo cega os olhos do homem para o amor supremo de Deus, fazendo-o prisioneiro eterno de utopias romancistas mescladas a prazeres falsos que destroem o sentido do casamento e, na maioria das vezes, o fazem sentir infeliz. E aqui cai o homem na ideia de tentar distorcer de todas as formas possíveis o casamento, a fim de tentar tirar dele algo que o faça completo.

A concepção secularista de casamento desumaniza os seres humanos. Torna-os seres dominados pelo sexo, pelo amor utópico, pela busca insaciável pelo prazer próprio, pela visão limitada de amor, pela banalização das relações duradouras, pela adoração irracional (travestida de amor) a certos tipos de pessoas (em geral, tipos de pessoas que lhe causarão prejuízos), pela insensibilidade em relação ao amor de Deus e por uma tendência de enxergar em coisas temporais, efêmeras, breves e fúteis o sentido da vida. O secularismo esfacela o amor, a sensibilidade e o senso das proporções; distorce todos os valores, verdades, prazeres e virtudes; infecta a mente de uma pequenês, de uma brevidade, de uma mentalidade que é incapaz de enxergar mais do que um palmo a diante. Mas, acima de tudo, o secularismo comete o maior dos pecados: apega-se a amores incompletos e os coloca acima de Deus, retirando-o de cena. Ao retirar de cena o amor dos amores, a fonte dos amores, o amor final, o amor supremo, o secularismo assassina o amor e destrói o sentido supremo da vida.

Esse texto, como é óbvio para qualquer pessoa mentalmente saudável, não tem objetivo algum de inferir qualquer coisa sobre política. Também não tem o objetivo de impedir o leitor de fazer o que quiser em sua vida amorosa. Até porque eu não tenho o poder de controlar vidas através do que escrevo (nem faço questão de ter). Esse texto tão somente discute porque no cristianismo há um padrão de casamento. É porque ele não é um fim em si mesmo, mas um símbolo de algo maior (porque o real é sempre maior que seu símbolo). E, tendo sido criado como símbolo, perde o sentido e o objetivo quando não simboliza adequadamente, distorcendo a mensagem que deveria transmitir e, na maioria das vezes, causando sensação de infelicidade.

Esse é um dos motivos (o mais ignorado, por sinal) pelo qual um cristão não deveria achar correto, nem praticar o adultério, a bigamia, a poligamia, o poliamor, o sexo sem compromisso, o casamento sem amor, o casamento homossexual, a zoofilia, a necrofilia, a pedofilia, a infidelidade, a agressão do cônjuge e etc. Nenhuma dessas atitudes representa bem a relação entre Deus e o ser humano. E isto, para o cristianismo, já seria motivo suficiente para não endossar estas práticas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caro leitor,
Evite palavras torpes e linguajar não compatível com a filosofia do blog. Obrigado.