quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Argumentos para a existência de Deus - Parte 6: Argumento da Ressurreição

Estamos chegando ao final da nossa série, amigo leitor. Já vimos os argumentos: cosmológico, teleológico, moral, da razão humana e ontológico. E conforme tivemos a oportunidade de ver, nenhum desses argumentos apela para crenças cegas, sem sentido lógico, mas se baseia puramente no raciocínio lógico. Seguindo esse mesmo princípio, o que vamos ver hoje é o argumento da ressurreição. Tal argumento pretende mostrar que existem alguns fatos históricos sobre Jesus (reconhecidos pela maioria dos historiadores), que apontam para a sua ressurreição.

Embora o intuito dessa série não seja defender uma religião específica, mas sim mostrar que existe a necessidade lógica da existência de um Ser transcendente, pessoal, único e criador de tudo, não posso deixar de citar o argumento da ressurreição. Não se trata de ser pretenciso, mas tão-somente de observar que este argumento tem um forte potencial de sustentar a existência de Deus. Afinal, se realmente Jesus ressuscitou, isso confirma que existe algo além da natureza; mais que isso, confirma que o próprio Deus se fez humano, revelando-se à humanidade.

Mas será que realmente há evidências históricas que apontam para a ressurreição de Jesus? É o que vamos ver.

Introdução

O argumento da ressurreição pode ser resumido da seguinte forma:
(1) Existem alguns fatos históricos sobre a vida de Jesus que são reconhecidos pela maioria dos historiadores, tais como: (a) sua existência; (b) sua morte em uma cruz; (c) seu sepultamento em uma tumba de José de Arimatéia; (d) a constatação da tumba vazia ao terceiro dia de sua morte; (e) os diversos testemunhos sobre aparições de Jesus após sua morte; (f) a origem da crença dos discípulos na ressurreição; 
(2) tais fatos históricos necessitam de uma explicação. Por que Jesus não estava no túmulo em que fora posto? Como o corpo saiu de lá? Como várias pessoas puderam ver Jesus após a sua morte? Por que surgiu a crença de que Jesus havia ressuscitado? É necessário achar uma explicação plausível para todos essas questões;
(3) a melhor explicação, que abrange todos os pontos e que parece mais provável, é a de que Jesus ressuscitou. É uma explicação mais lógica do que todas as alternativas que tem sido postuladas pelos céticos.
Este é o resumo do argumento da ressurreição. Obviamente o leitor que não crê na ressurreição de Jesus deve estar cheio de questionamentos e críticas. Mas acalme-se um pouco! Esse é o resumo do argumento. Vou explicar cada ponto e depois lidar com cada crítica que possa vir a surgir. Ok?


Fatos históricos e critérios de confiabilidade

O argumento da ressurreição se inicia afirmando que há alguns fatos históricos sobre Jesus que são aceitos pela maioria dos historiadores. Entretanto, devemos saber o que são fatos históricos antes de qualquer coisa. Bem, fatos históricos são aqueles que podem ser atestados através de documentos históricos. Eles se diferem de outros fatos porque podem ser afirmados com um mínimo de certeza. Por exemplo, como podemos ter certeza que Pedro Àlvares Cabral chegou ao Brasil em 22 de Abril de 1500? Através de uma série de documentos da época que nos ajudam a recompor esses fatos.

Assim é todo o estudo da história. Tudo o que sabemos do passado com algum grau mínimo de certeza (historicamente falando) está baseado em documentos da época ou próximos à época em que ocorreram os fatos*.

É óbvio que apenas a existência de documentos não são suficientes para dizer que um evento realmente aconteceu. É necessário também saber se os documentos são confiáveis. Afinal, é possível que um documento da época de um evento seja apenas um relato mítico, uma lenda, uma mentira. Como podemos saber se um documento, de fato, está relatando um evento real? Aqui exponho dez critérios principais que são utilizados pelos historiadores para averiguar se um documento relata um evento real:

1) Descrição do Contexto: Se o fato relatado pelo documento ocorre em um contexto político, econômico e/ou cultural bem definido no tempo e no espaço, ele já inspira alguma confiança - isso porque histórias míticas ou lendárias não são relatadas dentro de contextos bem definidos no tempo e no espaço. Por exemplo, a história da Branca de Neve. Vamos supor que essa história tenha sido descoberta em documentos antigos. O que nos faria ter certeza de que se trata de uma narrativa mítica seria a total falta de contexto na história. Vejamos:

Em que país a história ocorreu? Em que província do país? Em que ano? Quem eram as pessoas mais ilustres? Quem era o rei? A qual dinastia ele pertencia? O que o povo mais almejava? Quais eram as principais tradições e costumes que vigoravam na época? Que importância Branca de Neve e sua história tiveram para a vida das pessoas em geral? Qual é a história política desse país? Como era a sua relação com outros países? Qual é a sua geografia? Como ele era na época e como ele é hoje? Quais foram as consequencias da história da Branca de Neve para o país?

Entendeu, amigo leitor? Se os documentos responderem a essas perguntas, então o relato pode ser considerado digno de algum crédito, pois a história está no interior de um contexto bem definido que pode ser estudado pela história. Mas se essas perguntas não podem ser respondidas, se todo o relato ocorre fora de um contexto espaço-temporal, não podendo ser mapeado pela história, então o que temos é um relato mítico (como a história da Branca de Neve).

Ressaltemos algo importante aqui: ninguém que inventa uma mentira, mistura tal mentira com descrições detalhadas do contexto histórico, político, econômico e cultural de onde se passa a história. Afinal, se isso for feito, será fácil constatar que o relato é uma mentira. Por exemplo, se digo que um lobisomem viveu na minha cidade há 50 anos, algum maluco pode até acreditar nessa mentira. Mas se digo que esse lobisomem nasceu no bairro de Deodoro, virou vereador com 25 anos, teve uma crise nervosa na câmara dos vereadores, sequestrou o prefeito da cidade, foi preso, solto depois de 4 anos e morto em uma praça pública pela multidão, essa mentira não vai se sustentar, pelo simples fato de que nada disso realmente aconteceu no contexto que descrevi.

Portanto, documentos que descrevem detalhes do contexto em que ocorreu o fato descrito, têm muita probabilidade de estarem contando a verdade. Quanto mais detalhes sobre o contexto os documentos derem, mais provável é que a história relatada seja um fato histórico ou, no mínimo, que contenha muitos fatos históricos.

2) Múltiplas Comprovações: Se vários documentos diferentes falam sobre o mesmo fato, temos mais um ponto a favor da veracidade do fato. Quando um evento é descrito apenas por um documento, ele não é muito digno de credibilidade. Quanto mais fontes diferentes atestarem determinado fato, mais provável é que o fato tenha ocorrido de verdade. Isso torna os documentos confiáveis.


3) Antiguidade: Quanto mais antigos forem os documentos que falam sobre um fato, mais provável é que eles sejam verdadeiros. Afinal, os documentos terão sido lidos por pessoas que viviam no contexto descrito (ou próximo), sendo fácil para tais pessoas saberem se o fato era verídico ou não. Não sendo verídico, não se espalharia.

4) Constrangimento: Se as descrições presentes nos documentos incluem fatos constrangedores para o autor, seja por estarem ligadas diretamente ao autor ou ligadas à pessoas importantes para o autor, então temos mais uma grande probabilidade de que os documentos estejam descrevendo fatos verídicos. Um autor só relata eventos constrangedores se tais eventos forem verdadeiros ou se o autor estiver sendo beneficiado com o seu próprio constrangimento (de alguma maneira).

5) Ausência de Benefícios: Existem relatos cujo historiador pode perceber que o autor foi beneficiado com o que escreveu. Esse tipo de relato não costuma ter crédito, já que, provavelmente, o autor investiu em uma mentira para obeter benefícios. Assim, se um documento claramente não traz nenhum benefício para quem o escreveu, ou até traz prejuízos, então é muito provável que o evento descrito é verídico. Ninguém irá mentir sobre algo se sua mentira não traz benefícios, ou pior, se traz prejuízos.

6) Dissimilaridade: Se um relato atesta o surgimento de uma ideia que causaria escândalo, irritação e até rejeição por parte da maioria das pessoas da época, é provável que esse relato seja verídico. Principalmente se o mesmo relato não somente atesta o surgimento dessa ideia escandalosa e irritante, mas a apóia. 

Note que o autor dar o seu apoio à ideia não significa que ele recebeu benefícios por isso. Na verdade, o apoio do autor a uma ideia escandalosa e que causou rejeição por grande parte das pessoas, é uma evidência de que o autor tinha algum bom motivo para apoiá-la. Esse motivo pode ter sido um benefício? Sim. E nesse caso, a obra não é digna de crédito. Mas se o autor apoiou essa ideia escandalosa e rejeitada por muitos, sem receber nenhum benefício pessoal, então isso é uma evidência de que o evento não somente foi verídico como importante o suficiente para que o autor resolvesse relatá-lo mesmo sem receber benefícios com esse relato. 

Se o autor, além de não receber benefícios com o relato, recebeu algum prejuízo por escrever a obra, o tamanho do prejuízo e a sua eminência nos dão ainda mais certeza de que o relato é autentico. Ninguém toma prejuízo à toa.

7) Concordância: Se um fato é atestado por vários documentos, eles não podem se contradizer. Quanto maior e mais grave o número de contradições, mais podemos ter certeza de que o fato real difere bastante de seus relatos (ou seja, o fato foi deturpado pelas várias fontes que o relataram). 

Aqui cabe uma observação imprescíndivel: a memória humana muitas vezes não tem condição de lembrar de detalhes secundários de um evento. Por exemplo, digamos que várias pessoas sejam testemunhas de um assalto um banco. Uma delas pode chegar à sua casa e contar: “O Banco foi assaltado hoje. Foram oito bandidos que praticaram o assalto. Entraram, pegaram o dinheiro e saíram num carro”. Outra pessoa, que também foi testemunha do evento, pode narrá-lo assim: “Eu vi um assalto no Banco hoje. Foram dez bandidos. Um ficou no carro, dois na porta, e sete entraram no Banco. Eles entraram, mataram um cara lá dentro do cofre, pegaram o dinheiro e saíram num carro”. Ainda uma outra pessoa pode dizer assim: “Vi um assalto no Banco. Foram dez bandidos que entraram lá. Pegaram o dinheiro, mataram três pessoas, feriram uma e depois disso eles foram embora”.

Perceba que os três relatos divergem uns dos outros em alguns detalhes, como na ordem dos acontecimentos, no número de bandidos que praticaram o crime, no número dos bandidos que entraram no banco e no número de pessoas que foram mortas. Porém, essas divergências não alteram o relato principal: o de que o Banco foi assaltado por um bom número de bandidos e houve violência lá dentro. As divergências em pormenores das descrições são somente um reflexo da nossa dificuldade de remontar com exatidão todos os fatos; também um reflexo da visão que nós tivemos do evento (às vezes o que eu vi, você não viu ou nós dois vimos, mas eu sou mais detalhista que você).

Portanto, o critério da concordância não deve ser usado de forma exagerada, mas apenas com o intuito de captar a mensagem principal. É a mensagem principal que deve estar em plena concordância. Aliás, divergências em pequenos detalhes são essenciais para que o historiador possa ter certeza de que os vários documentos que descrevem um fato foram escritos por pessoas diferentes (critério da múltipla comprovação).

A mesma coisa podemos dizer das cópias. A maior parte da história geral do mundo é reconstituída não por documentos originais (que, geralmente, se perdem no tempo), mas pelas cópias que se fizeram deles. Se as cópias são abundantes e a data delas é próxima à escrita dos originais, podemos ter certeza de que não houve nenhuma deturpação ao analisar as diferenças entre as cópias. Quanto mais iguais forem as cópias em seu conteúdo principal, mais podemos ter certeza de que a mensagem original do documento não foi adulterada com o passar do tempo.

8) Citações Próximas: Se o conteúdo de algum documento for citado em outros documentos de datação próxima ao fato ocorrido, é provável que o fato seja verídico, pois a confiabilidade do primeiro documento foi atestada por pessoas que viveram mais próximas ao evento do que nós, tendo mais condição de saber se os fatos eram verídicos ou se não eram.

9) Comprovação Inimiga: Se determinado evento é motivo de inimizade entre dois tipos de pessoa e ambos os tipos de pessoa descrevem este fato (cada um criticando o outro), isso quer dizer que o fato é verídico. Afinal, inimigos não tem interesse em se ajudar. Se alguém inventa um fato mentiroso, seu inimigo jamais escreverá algo que confirme essa mentira. Mas se o fato é verídico e é a razão da inimizade entre os dois grupos, então a citação do fato será usada por ambos os grupos. 

Independente de qual grupo esteja correto, sabemos que o fato oconteceu. Por exemplo, os militares achavam que era certo usar a repressão no período da ditadura brasileira. Mas muitos dentre o povo não achava. Não importa para a discussão qual era o grupo que estava correto. Sabemos que a repressão na ditadura militar é um fato, fato este que é atestado tanto pelo grupo favorável à repressão quanto pelo grupo contrário.

10) Citação de testemunhas: Se um documento cita os nomes das testemunhas de determinado fato e/ou oferece a localização das testemunhas para o leitor, ou ainda, lembra aos leitores que o fato teve testemunhas, incentivando-os a irem procurar essas testemunhas para argui-las, com certeza tal fato é verídico. Afinal, ninguém que inventa uma mentira, incentiva as pessoas a procurarem as testemunhas, dando ainda nomes e localizações. Então, se um documento cita testemunhas, ele é verídico. E quanto mais testemunhas forem citadas para um evento, mais digno de confiança é o fato relatado.

Os Documentos do Novo Testamento 

Ufa! Acho que falei de todos os critérios. O leitor deve estar cansado, né? Mas foi necessário. Agora, não teremos mais dúvida sobre como verificar se os documentos que atestam determinado fato são mesmo confiáveis (isto é, se podemos concluir através deles que o fato relatado realmente ocorreu dentro da história).

Agora, é preciso que o leitor saiba de outro ponto importante para o argumento da ressurreição: o Novo Testamento (e a Bíblia) não é um documento só escrito por só um autor. O Novo Testamento é um conjunto 27 livros e cartas que foram escritos de modo independente por pelo menos 8 autores diferentes. O motivo pelo qual tais documentos foram reunidos em um só compêndio é que eles tratam de assuntos semelhantes, complementares e coerentes com a primeira parte da Bíblia (o Antigo Testamento).

Bem, embora estes documentos sejam considerados sagrados e inerrantes pelos cristãos, na qualidade de historiador estes documentos deixam de ter um valor sagrado e passam a ser analisados como qualquer outro documento secular. Este é o trabalho do historiador. Ele não deve analisar o Novo Testamento como a Palavra de Deus (à priori), mas como um conjunto de documentos diferentes que podem ou não conter relatos de fatos verídicos. E como é que podemos saber se os documentos são confiáveis e contém eventos reais? Usando os dez critérios que acabamos de estudar. Se os relatos do Novo Testamento passarem por esses critérios, não há motivo para nós desconsiderarmos o que esses documentos dizem. Vamos usar os critérios, então?

Analisando os fatos do Novo Testamento

Não há espaço aqui para analisar os documentos em sua totalidade. Então, eu irei me concentrar apenas naqueles seis fatos que eu afirmei que a maioria dos historiadores concordam com sua veracidade (ou seja, são históricos). Só para lembrar, os seis fatos são esses: (a) a existência de Jesus; (b) a sua morte numa cruz; (c) o seu sepultamento em uma tumba pertencente a José de Arimatéia; (d) a constatação, três dias depois, de que a tumba estava vazia; (e) os relatos das aparições de Jesus após a morte; (f) o início da crença dos primeiros cristãos de que Jesus havia ressuscitado.

Agora, vamos às análises desses fatos básicos:

A) A existência de Jesus: Este fato é confirmado não só pelos documentos de autores cristãos que viveram no primeiro século, mas também por diversos autores não cristãos (a maioria, inclusive, bem hostil ao cristianismo) que, em seus escritos, citaram um homem judeu chamado Jesus que pregou uma nova filosofia, que foi morto em uma cruz e que gerou o movimento cristão. Não há espaço para pôr os escritos aqui (o farei em breve em uma série de postagens sobre quem foi Jesus), mas posso citar os autores. 


A começar pelos autores não-cristãos, temos os escritos do historiador judeu Flávio Josefo (37 d.C – 100 d.C); do historiador romano Cornélio Tácito (55 d.C – 120 d.C); de Caio Plínio II, governador da Bitínia (61 d.C – 114 d.C); de outro historiador romano chamado Suetônio (69 d.C – 141 d.C); do escritor satírico Luciano de Samósata (125 d.C – 181 d.C) e etc. Há ainda os comentários de Talmudes Judaicos (que eram códigos de discussões rabínicas), nos quais Jesus é citado em alguns trechos, sempre apontado como um judeu apóstata e herege que não deveria ser seguido por nenhum judeu ortodoxo.

Então, aqui já vemos que os critérios para confiabilidade das fontes foram muito bem encontrados já nas fontes não-cristãs. São documentos antigos, múltiplos, coerentes nas informações principais, escritos por adversários dos cristãos (judeus e pagãos) que não tinham o mínimo interesse em defender o cristianismo, que relatam eventos dentro de contextos históricos e etc.

Quanto aos autores cristãos, temos os escritos de pelo menos 8 autores diferentes no Novo Testamento (Mateus, Marcos, Lucas, João, Paulo, Tiago, Pedro e Judas), que são os documentos mais antigos que temos sobre Jesus. Além desses, temos os escritos dos primeiros teólogos da Igreja (chamados de “pais da Igreja”) que chegaram a viver em parte do primeiro século. Entre eles, Clemente, Inácio, Policarpo, Papias e etc.

Os “céticos” leigos costumam a criticar o estudo desses documentos escritos por cristãos, dizendo o seguinte: “Eles não são dignos de confiança porque foram escritos pela parte interessada. Ou seja, eram beneficiados com os relatos que faziam. Por isso, devem ter inventado todos esses relatos”. Só que esses “céticos” esquecem que os primeiros cristãos não foram beneficiados em nada ao escrever e divulgar esses relatos.

Quem lê o Novo Testamento e estuda um pouco de história, sabe que os cristãos do primeiro, segundo, terceiro e início do quarto século, foram fortemente hostilizados por judeus (de onde vieram) e por pagãos. Havia perseguição física, havia prisões, havia martírio, havia tortura e havia morte. Propagar o cristianismo nos primeiros séculos era, em muitos casos, como propogar o cristianismo em países anti-cristãos contemporâneos como a Coréia do Norte e a Arábia Saudita. Não há benefícios para quem propaga essas ideias nesses países.

O “cético” aqui faz algo ridiculo. Ele aplica o seu contexto ao contexto daquela época. Hoje, sobretudo no ocidente, abrir uma igreja é algo que dá dinheiro. As pessoas estão familiarizadas com o cristianismo, existe certa tolerância aos cristãos e, por isso, é fácil abrir uma igreja, enganar muitas pessoas e enriquecer com o dízimo delas. Mas na época do surgimento do cristianismo até antes do governo romano se tornar cristão (no quarto século), o contexto era totalmente diferente. Quem escolhia ser cristão estava su-jeito à pobreza, perseguição, injúrias, hostilidade, ridicularização, rejeição etc. As ideias cristãs, tanto para judeus, quanto para pagãos, eram afrontas às suas crenças tradicionais, seu modo de viver e seu modo de pensar.

Então, dizer que os escritos dos primeiros cristãos não são dignos de confiança porque eles eram a parte interessada é de uma tolice sem tamanho. Eles são dignos sim de confiança, justamente porque não havia nenhum benefício que poderiam ganhar ao escrever aqueles relatos. De fato, a maior parte desses escritores foram martirizados e mortos por causa do que escreveram.

Então, observe bem como todos os critérios se satisfazem quando analisamos os documentos do Novo Testamento e dos pais da Igreja: todos eles apresentam descrições detalhadas do contexto em que Jesus viveu (tal como do contexto do qual emergiu o cristianismo); temos mais de 12 autores diferentes atestando que Jesus existiu; os relatos são de documentos bem antigos; a escrita e divulgação dos relatos não trouxe benefícios para os autores; existia ampla concordância dos escritores no que diz respeito a fatos básicos sobre Jesus; havia vastas citações dos documentos do Novo Testamento pelos pais da Igreja ainda no primeiro século; havia vasta citação de testemunhas dos eventos pelos autores (vamos ver isso melhor a diante); e não existia motivo para que a invenção de uma mentira, já que os ensinos de Jesus irritava a maioria dos judeus e dos pagãos.

Portanto, concluímos que a existência de Jesus é um fato histórico inegável, pois todos os critérios para avaliação de documentos utilizados pelos historiadores são plena-mente satisfeitos na análise dos documentos antigos que falam sobre Jesus. Somente um desonesto intelectual poderia negar a historicidade de Jesus depois destas evidências.

B) A morte de Jesus em uma cruz: Do mesmo modo que documentos cristãos e não-cristãos do primeiro e segundo século atestam que Jesus existiu, também atestam que ele foi condenado à morte de cruz e assim morreu. Todos os nomes que citamos na avaliação acima, ao falarem de Jesus, citaram essa sua morte condenatória. Deste modo, os critérios de contexto histórico, multiplicidade, ausência de benefícios, comprovação inimiga e todos os outros que já vimos se aplicam também a este fato. Portanto, a morte de Jesus em uma cruz também é inegável historicamente.

C) O sepultamento em uma tumba de José de Arimatéia: Este fato é atestado explicitamente pelos quatro evangelhos e implicitamente pelo apóstolo Paulo. Ou seja, é um fato atestado por documentos antigos e múltiplos. Fora isso, dificilmente os cristãos da época inventariam esse sepultamento em uma tumba pertencente a José de Atimatéia, em primeiro lugar, porque era desonroso que alguém não fosse sepultado na tumba de sua própria família. Em segundo lugar, porque José de Arimatéia era um membro do Sinédrio (o tribunal religioso judaico que condenou Jesus). 

Se já era vergonhoso para os seguidores de Jesus verem seu mestre ser sepultado em uma tumba de alguém que não era seu familiar, muito mais vergonhoso e odioso era para os discípulos ver seu mestre sendo posto em uma tumba de alguém que fazia parte do tribunal que matou. Tal história, portanto, jamais seria inventada por nenhum autor cristão da época. Se tal fato foi relatado é porque ele realmente ocorreu.

Então, vemos aqui que foram satisfeitos os critérios de multiplicidade, contexto histórico, antiguidade, citação e localização de testemunhas, constrangimento, ausência de benefícos e etc. O que eu não citar será para não ser redundante, mas o leitor já tem as ferramentas e pode avaliar por si mesmo.

D) A tumba vazia: A constatação da tumba vazia, três dias após o sepultamento de Jesus, é relatada também pelos evangelhistas e por Paulo em diversas cartas. Mas a lógica é igualmente importante para a confiabilidade desse relato. Se Jesus não tivesse sumido da tumba, ninguém sairia espalhando por aí que Jesus ressuscitou. A certeza da ressurreição de Jesus entre seus seguidores surge, em primeiro lugar, pela constatação da tumba vazia.

Há outro detalhe que nos dá a certeza de que a tumba realmente foi encontrada vazia. Os quatro evangelistas afirmam que as primeiras testemunhas deste fato foram mulheres (dentre elas, Maria Madalena, ex-prostituta). O problema é que no contexto judaico da época as mulheres não tinham nenhum valor como testemunha. Na verdade, as mulheres não eram valorizadas em quase nenhum aspecto. Elas serviam somente para agradar o seu marido e cuidar dos filhos.

Assim, se os evangelistas tivessem inventado a história do túmulo vazio, é certo que não colocariam mulheres como as primeiras testemunhas. Isso não só iria contrariar o pensamento patriarcal e machista da época (o que é improvável que autores de índole mentirosa fizessem), como seria burrice, pois não haveria valor em um testemunho dado por mulheres. Pouquíssimas pessoas dariam crédito ao testemunho.

Mas, se mesmo sendo contrário ao pensamento da época, constrangedor para os seguidores homens e um ponto desfavorável em sua pregação, ainda assim, o relato das mulheres como testemunha do túmulo vazio foi feito pelos escritores, tudo isso mostra que eles estavam sendo sinceros. O fato realmente ocorreu.

E) Os testemunhos das aparições de Cristo: As aparições de Cristo após a sua morte são relatadas explicitamente pelos quatro evangelistas e por Paulo. Segundo eles, várias pessoas viram Jesus após morto, num período de 40 dias. São citados como tendo visto Jesus após a morte Maria Madalena e mais um grupo de mulheres, Pedro e mais os outros discípulos, dois seguidores de Jesus no caminho de um vilarejo chamado Emaús, Tiago (um dos irmãos de Jesus), o apóstolo Paulo e cerca de mais 500 pessoas. 

Vários pontos desses relatos dão credibilidade ao fato. Primeiro, temos múltiplos relatos de que diversas pessoas diferentes viram Jesus após a morte. Se fosse apenas um relato, talvez pudéssemos dizer que foi uma invenção. Se o relato tivesse sido escrito muito tempo depois do fato, poderíamos dizer que não é confiável. Se o relato não des-crevesse um contexto histórico, poderíamos apontá-lo como mito. Mas o que nós temos são múltiplos relatos, coerentes em suas informações principais, com um contexto muito bem definido e escritos praticamente na mesma época dos eventos. Ou seja, não há nada aqui que nos leve a crer que tais relatos não são confiáveis.

Segundo, os relatos dizem que diversas pessoas viram Jesus após sua morte. Se fosse uma ou duas, ou mesmo meia dúzia, não ao mesmo tempo, poderíamos dizer que foram alucinações. Só que, no total, foram mais de 500 pessoas que o viram após a sua morte. E na maioria das suas aparições, havia sempre mais de uma pessoa presente. Não podemos dizer que se tratou de diversas alucinações coletivas. Ora, alucinações não são efeitos psicológicos coletivos nos quais todas as pessoas de um lugar veem exatamente a mesma coisa. Alucinações são individuais porque cada um tem seu próprio cérebro e suas próprias sensações. Ou seja, as pessoas desses relatos realmente devem ter visto Jesus após a sua morte.

Terceiro, o apóstolo Paulo em sua primeira carta aos Coríntios 15:3-5, não só oferece o nome de algumas das testemunhas das aparições de Jesus, afirmando ainda que mais de 500 pessoas chegaram a vê-lo de uma só vez, mas também atesta que a maioria dessas pessoas ainda vivia quando ele escreveu a carta (ou seja, um convite para o leitor investigar se realmente os fatos eram verídicos).

Quarto, não havia motivo para que os primeiros seguidores de Jesus inventassem suas aparições. Eles não iriam ganhar dinheiro ou status. E mesmo que tivessem feito isso apaenas por orgulho, para limpar o nome de seu mestre, que havia sido condenado injustamente, isso não explica o porquê persistiram nessa mentira a ponto de sofrerem e morrerem por ela. Na verdade, não faz sentido acreditar que o cristianismo logrou êxito em meio a tantas e terríveis perseguições baseado em um fato que mais de 500 pessoas sabiam que era mentira. Ainda mais quando nos lembramos que essas pessoas criam em Deus. Ou seja, se estivessem mentindo, sabiam que Deus as cobraria por isso.

Bem, tudo isso mostra que, de fato, muitas pessoas experimentaram aparições de Jesus após a sua morte, inclusive alguns dos próprios autores desses documentos. E os critérios, como o leitor está vendo, estão sendo satisfeitos nesses relatos.

F) A crença na ressurreição de Jesus entre os discípulos: Este é o último fato que vamos analisar. Como os outros, ele também é inegável historicamente. É atestado por todos os documentos que compõem o Novo Testamento, assim como por todos os documentos escritos pelos pais da Igreja e também por documentos de alguns daqueles autores não cristãos que citamos na análise do primeiro fato. De fato, o próprio Paulo afirma que a crença na ressurreição de Jesus é motivo pelo qual o cristianismo passou a existir (I Coríntios 15:12-19); e a pregação dos primeiros cristãos era centrada justamen-te neste ponto – Jesus ressuscitou dentre os mortos.

Então, não há dúvida de que os discípulos de Jesus e os primeiros cristãos, desde cedo mantiveram a crença de que Jesus ressuscitara dentre os mortos. Este é o motivo pelo qual o cristianismo começou a existir. E em que se baseava essa crença? Ora, ela se baseava na constação do túmulo vazio pelos discípulos e nas aparições que eles e várias pessoas experimentaram juntas, em diversas ocasiões. Como os relatos das aparições e do túmulo vazio são confiáveis, então a crença sincera dos discípulos na ressurreição de Jesus também é confiável. Tratam-se de fatos históricos.

Ou seja, o relato da crença na ressurreição de Jesus entre os primeiros cristãos é confiável por se basear em outros fatos confiáveis que levaram os discípulos a terem tal crença e também porque o próprio relato da crença em si satisfaz os critérios de confiabilidade, tais como: multiplicidade dos relatos, antiguidade das fontes, coerência nas informações principais, citação de testemunhas, comprovação inimiga e etc. Não existem motivos plausíveis para se opor ao relato dessa crença.

Agora, a grande questão é: Qual é a melhor explicação para esses fatos? Porque o leitor deve notar que até agora eu não concluí que Jesus ressuscitou. Eu apenas citei os fatos históricos de que Jesus existiu, foi morto em uma cruz, sepultado, a sepultura foi encontrada vazia três dias depois, várias pessoas experimentaram visões dele após a morte e, por causa disso, os discípulos passaram a crer em sua ressurreição. Esses são os fatos. São inegáveis. Mas a partir desses fatos, posso concluir que Jesus ressuscitou?

É aqui que entramos na segunda premissa do argumento. Lembra-se dela? Diz assim: tais fatos históricos necessitam de uma explicação. Por que Jesus não estava no túmulo em que fora posto? Como o corpo saiu de lá? Como várias pessoas puderam ver Jesus após a sua morte? Por que surgiu a crença de que Jesus havia ressuscitado? É necessário achar uma explicação plausível para todos essas questões.

O argumento da ressurreição afirma que a melhor explicação para esses fatos é que Jesus realmente ressuscitou dentre os mortos. Mas será que é? Vamos ver...

Qual a melhor explicação para os seis fatos?

O que vamos fazer agora é simples. Vamos comparar diversas explicações que já foram dadas para esses fatos com a explicação de que Jesus realmente ressuscitou. Qual será a explicação mais plausível e lógica?

A) Os discípulos roubaram o corpo de Jesus: Os que sustentam tal explicação, dizem que os discípulos teriam roubado o corpo justamente porque queriam espalhar o mito de que Jesus ressuscitara. Só que isso não explica as aparições experimentadas por muitos. Já vimos que não havia motivos para que os discípulos e os primeiros cristãos pregassem tamanho número de mentiras que em nada os beneficiava. E eles sabiam que se as pregassem, iriam ter problemas. Então, o que os motivava não poderia ser um fato inventado. As aparições eram reais. A crença na ressurreição era real. 

Fora isso, é de suma importância ressaltar que inventar a ressurreição corporal de um homem que foi crucificado, apontá-lo como sendo o Messias prometido ao povo judeu e ainda colocá-lo na posição de um ser divino (o próprio Deus encarnado), era a coisa mais idiota que uma pessoa poderia fazer ou pensar no primeiro século. Tão idiota quanto seria um cozinheiro tentar apagar um incêncio em sua cozinha com uma garrafa de álcool. Vou explicar o porquê.

Em primeiro lugar, a crucificação era a pior punição que uma pessoa poderia receber na época. Só os piores criminosos iam para a cruz. A palavra cruz chegava a ser uma palavra obscena, por conta do caráter dessa punição. A pessoa que ia para uma cruz era desprezada pela sociedade. Ela era um lixo humano, um esterco. Desta forma, falar sobre um Deus que se fez homem e morreu... Ainda por cima em uma cruz... Era algo totalmente inimaginável e absurdo. Sendo assim, nenhum discípulo jamais imaginaria (e se imaginasse, jamais colocaria em prática) espalhar essas ideias, a não ser que fossem verídicas. 

Para os pagãos, tal ideia era risível. Os deuses pagãos eram heróis. Se um Deus descesse do céu, jamais poderia morrer em uma cruz. Isso seria a prova cabal de que ele era um deus fraco ou, mais provável, mero homem. Para os judeus, tal ideia era ofensiva e blasfêmica. Os cristãos afirmavam que Deus e Jesus eram um só e que esse Jesus era o Messias esperado pelas profecias judaicas. Mas isso contradizia toda a teologia judaica da época. Os judeus do primeiro século acreditavam que quando o Messias viesse, iria assumir o trono de Israel, lutar contra os romanos (que os dominava) e elevar a nação ao seu ápice. Essa era uma das crenças mais fortes entre os judeus da época. 

Então, a morte de Jesus na cruz foi uma completa catástrofe para os aqueles que seguiam Jesus. Eles eram judeus. Mantinham a interpretação judaica da época sobre o Messias. Se Jesus morreu em uma cruz, isso era a prova cabal para todas as pessoas de que Jesus não fora ninguém importante. Ele não poderia ser o Messias que exaltaria a nação judaica e muito menos Deus. O nome de Jesus estava completamente manchado com a sua morte na cruz. Inventar que ele havia ressuscitado, que era Messias e que era o próprio Deus seria algo tão idiota que ninguém teria capacidade de pensar nisso.

Aliás, muitos homens surgiram na história proclamando-se o Messias. Eles jun-taram seguidores, mas quando morreram, o movimento minguou, alguns voltando para suas antigas atividades, outros crendo que o Messias poderia ser alguém da família do homem que morreu. Mas uma coisa era certa entre todos os judeus: se aquele que se autoproclamava o Messias morreu, ele não era realmente o Messias. Dizer o contrário disso era totalmente ilógico. E dizer que o homem que morreu era um ser divino... Era blasfêmia das mais terríveis.

Em segundo lugar, a crença na ressurreição corporal não era uma crença comum no primeiro século. Entre os pagãos ninguém cria nisso. Achava-se que o corpo de uma pessoa morria, mas seu espírito (fantasma) permanecia vivo. Esse espírito era imortal e poderia reencarnar em um novo corpo, nascendo de novo. Mas aquele corpo antigo, já era, iria se decompor. Essa crença era tão forte entre os pagãos que em diversas passagens do Novo Testamento vemos uma ridicularização por parte deles à ideia de ressurreição corporal (Atos 17:18, 31-32 e 26:8, 22-25; I Coríntios 1:22-23 e 15:12-20).

Entre os judeus, pelo menos nessa época, a ressurreição corporal era aceita, mas entendida como algo que só ocorreria no dia do juízo final. Era a ressurreição dos mortos justos após a vinda do Messias, a destruição dos inimigos e a exaltação de Israel, que daria início ao Reino de Iavé. Alguns até podiam aceitar que era possível Deus ressuscitar uma pessoa ou outra antes disso, por meio de um profeta, como sinal de que o profeta era de Deus (como Deus fez em raras ocasiões no Antigo Testamento). Porém, essa ressurreição seria temporária. A pessoa ressurreta viveria sua vida, envelheceria e morreria novamente. 

Esse era o máximo em que um judeu do primeiro século poderia acreditar no que tange à ressurreição corporal. Ainda assim, poucos eram os que atentavam para essa hipótese, pois já havia séculos que isso não ocorria. Tanto que na ocasião em que Jesus diz que Lázaro irá ressuscitar, Marta entende que Jesus está falando da ressurreição do último dia (João 11:20-26). Esta passagem deixa bem claro que ninguém cria que Jesus poderia levantar seu amigo Lázaro dentre os mortos. 

Então, quando Jesus morreu, a última coisa em que seus discípulos e seguidores pensariam era em inventar a sua ressurreição corporal. Ainda mais uma ressurreição na qual Jesus jamais morreria novamente, mas iria para o céu. Para ser mais claro, dentro do contexto da época, essa ideia não tinha como surgir de nenhum lugar. Cabe perguntar aqui: que mente seria tão criativa e, ao mesmo tempo, tão imbecil para inventar uma ressurreição corporal desse tipo e espalhá-la, sabendo que isso iria se chocar com tudo o que se pensava naquele contexto?

Então, veja quantas ideias estranhas ao pensamento corrente na época os discí-pulos e primeiros cristãos pregavam: um Messias que veio e não se tornou rei de Israel, nem venceu os inimigos, nem exaltou a nação. Um Messias que veio, foi embora e não iniciou a nova era, na qual os mortos justos ressuscitariam. Um Messias que era divino e, no entanto, morreu em uma cruz. Um Messias que ressuscitou primeiro que todo mundo para a vida eterna e que foi para o céu (em vez de assumir o trono). Quem iria se dispor a pregar essas loucuras se não tivessem ocorrido de verdade? E como o cristianismo iria se desenvolver e chegar até os dias de hoje, tornando-se a maior religião do mundo, com uma pregação tão cheia de “pontos fracos”, se Deus não estivesse do lado dos primeiros cristãos, ajudando-os com o forte poder de seu Espírito Santo? É de se pensar...

B) Os familiares de Jesus pegaram o corpo: Quem usa essa explicação, afirma que os familiares de Jesus teriam pego seu corpo para dar-lhe um enterro digno em uma tumba da família. Sem saber disso, quando os discípulos viram o túmulo vazio, creram que Jesus havia ressuscitado e saíram espalhando isso. Mas essa explicação tem vários problemas. Primeiro, ela também não explica as visões que várias pessoas tiveram de Jesus. É até bom lembrar que essas visões não foram apenas visões. Na maioria delas, Jesus permitiu que tocassem nele e até se alimentou. O que explica mais de 500 pessoas terem essas experiências?

Segundo, ela não explica porque os parentes de Jesus não disseram aos discípu-los que, na verdade, eles pegaram o corpo para sepultá-lo. É uma mal entendido fácil de se resolver. Fora isso, é muito pouco provável que a simples constatação da tumba vazia fizesse todos os discípulos crerem que Jesus ressuscitou. Maria Madalena, por exemplo, ao ver o túmulo vazio, correu para contar aos discipulos e afirmou o seguinte: “Tiraram do sepulcro o Senhor, e não sabemos onde o puseram” (João 20:2). Depois, quando as mulheres contaram que viram Jesus, o evangelista Lucas relata: “Tais palavras lhes pareciam um cmo delírio, e não acreditaram nelas” (Lucas 24:11). Marcos diz a mesma coisa em seu evangelho: “Estes, ouvindo que ele vivia e que fora visto por ela [Maria Madalena], não acreditaram” (Marcos 16:11). Mais tarde, o discípulo Tomé, ao ouvir dos discípulos que eles tinham visto Jesus, lhes disse: “Se eu não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, e ali não puser o dedo, e não puser a mão no seu lado, de modo algum acreditarei” (João 20:25). 

Terceiro, é pouco provável que um parente de Jesus tivesse ido até o túmulo no dia de sábado. Sábado era o dia sagrado de descanso dos judeus. No primeiro século, era um mandamento cumprido à risca. Como Jesus foi sepultado um pouco antes do pôr do sol de sexta (que já era considerado fim da sexta e início do sábado), então os parentes de Jesus certamente esperariam até domingo para pegarem o corpo. De fato, Lucas faz uma afirmação que corrobora com essa noção:
Era o dia da preparação [sexta] e começava o sábado. As mulheres que tinham vindo da Galiléia com Jesus, seguindo, viram o túmulo e como o corpo fora ali depositado. Então, se retiraram para preparar aromas e bálsamos. E, no sábado, descansaram, segundo o mandamento (Lucas 23:54-56).
Se nenhum parente de Jesus foi ao túmulo durante o sábado, então não pode ter sido algum deles que pegou o corpo, pois já no domingo de manhã, Jesus não estava lá, e a primeira pessoa a ir ao túmulo, bem cedo, foi Maria Madalena e não um parente de Jesus.

Quarto, há uma possibilidade de que durante o sábado o túmulo tenha sido guar-dado por uma escolta. É o que lemos em Mateus 27:62-66. O evangelista afirma que os líderes religiosos que condenaram Jesus pediram uma escolta para Pilatos, a fim de que o túmulo fosse guardado, justamente para que os discípulos não roubassem o corpo. A escolta foi dada, segundo o relato. Se considerarmos o relato como verídico (esse relato só aparece no evangelho de Mateus, carecendo de múltiplas comprovações), então não houve possibilidade alguma de que pegassem o corpo no sábado.

C) Os romanos pegaram o corpo: Aqui começam as exlicações desesperadas dos “céticos”. A afirmação é: os romanos pegaram o corpo de Jesus. Mas por que os romanos iriam roubar o corpo de um homem que foi crucificado? Que interesse teriam no corpo de um mero judeu que foi condenado à pior morte da época? Não faz sentido nenhum isso. Além disso, essa hipótese não explica as aparições experimentadas pelos discípulos e pelos primeiros cristãos. 

D) Os líderes judaicos pegaram o corpo: Essa é uma das mais fracas hipóteses que se pode postular. Os líderes judaicos eram as últimas pessoas da face da terra que iriam querer roubar o corpo de Jesus. O que eles mais queriam já havia sido feito: Jesus, o homem que odiavam, estava morto. Não havia motivo para pegar o corpo. Do ponto de vista da lógica, inclusive, é bem mais provável que eles tenham feito conforme lemos em Mateus 27:62-66: pediram a Pilatos uma escolta para o túmulo a fim de evitar que qualquer seguidor roubasse o corpo e inventasse a ressurreição (que era algo que Jesus dissera que faria, embora nem os próprios discipulos acreditassem).

Também deve ser dito aqui que essa hipótese também não explica as aparições de Jesus experimentadas por mais de 500 pessoas. Contudo, ainda que desconsideremos isso e aceitemos que os líderes judaicos (ou mesmo os romanos) roubaram o corpo por algum motivo qualquer, seria fácil que eles mostrassem o corpo para as pessoas quando os discípulos começassem a pregar a ressurreição. Assim, ninguém mais daria crédito à pregação.

E) Jesus não morreu na cruz, apenas desmaiou: Quem sustenta essa hipótese, afirma que Jesus não teria morrido de verdade, mas desmaiado. Com isso, ele mesmo poderia ter saído da tumba e suas aparições se dariam porque ele estava vivo. Bem, esta hipótese também é frágil. Primeiro, porque dificilmente os soldados não perceberiam que Jesus não morreu. Na verdade, eles devem ter verificado se Jesus morreu ou não com um cuidado especial. Afinal, a morte de Jesus havia sido prematura; uma pessoa na cruz costumava demorar uma semana para morrer. De fato, o evangelho de João relata que um dos soltados abriu o lado do corpo de Jesus com uma lança, provavelmente para averiguar se ele realmente estava morto (João 19:31-37).

Além disso, se realmente Jesus tivesse sobrevivido à cruz, era de se esperar que não tivesse forças para sair do túmulo. Segundo os relatos, havia uma grande pedra na entrada da gruta onde seu corpo fora depositado. Como é que alguém que foi açoitado, espancado e crucificado, tendo desmaiado de tanta fraqueza, teria força para retirar a pedra que tampava seu túmulo? Sobretudo, se realmente havia ali uma escolta. Caso ele conseguisse tal proeza, seria morto pelos soldados.

Ainda devemos ressaltar que a hipótese não explica a última aparição de Jesus aos discípulos, na qual ele ascende aos céus. A não ser que Jesus fosse um ser divino ou um profeta muito poderoso, não poderia fazer isso. Também não explica suas aparições corporais em que, embora corporais, ele aparecia e desaparecia. Se a ideia é explicar os fatos sem recorrer ao sobrenatural, essa hipótese falha feio.

Ora, mesmo que considerássemos que Jesus desmaiou, que ninguém percebeu que ele estava vivo, que o colocaram numa tumba e que mesmo fraco, conseguiu tirar a pedra e sair, isso não explicaria a crença na ressurreição entre os discípulos, já que Jesus teria aparecido todo “ferrado”. Iriam achar apenas que ele sobreviveu de uma maneira milagrosa. 

A hipótese também não explicaria o “sumiço” de Jesus. Se Jesus não tivesse morrido, os discípulos iriam cobrar dele que assumisse o trono. E, pela lógica, se Jesus era apenas um homem normal, a ideia seria boa. Em vez de viver se escondendo, ele poderia retornar à cidade, mostrando que Deus não deixou que ele morresse e, juntando os judeus para livrar Israel da opressão romana. Isso sem dúvida converteria quase todos os judeus, talvez até quem concordou com sua morte. Afinal, era o que a interpretação da época achava que o Messias faria.


F) Jesus tinha um irmão gêmeo: Essa hipótese eu vi em um debate. Segundo ela, se Jesus tivesse um irmão gêmeo, ele poderia ter sido confundido com Jesus após a sua morte. Isso explicaria as “aparições de Jesus” e a origem da crença dos discípulos na ressurreição. Essa hipótese também falha. Primeiro, porque não há nenhuma evidência histórica que comprove a existência desse irmão gêmeo. Segundo, porque essa hipótese não explica a constatação do túmulo vazio. Se Jesus morreu mesmo, devia estar lá, não é? Terceiro, se Jesus tinha um irmão gêmeo, é pouco provável que os discípulos não soubessem disso. Os discípulos conheciam a família de Jesus. Então, se vissem o irmão de Jesus, é claro que não pensariam que ele era Jesus. Quarto, o próprio irmão de Jesus não teria interesse de se passar por ele. O que ganharia se passando por um crucificado que quase todo mundo rejeitou? Aliás, é importante lembrar que os irmãos de Jesus não criam nele. Então, nem por questão de honra, seu suposto irmão gêmeo se interessaria em se passar por ele.

G) A ressurreição de Jesus: Chegamos, enfim, à hipótese de que Jesus teria ressuscitado dentre os mortos. Será que ela consegue explicar os fatos? Sim. Ela explica porque Jesus não estava mais em seu túmulo no domingo de manhã, porque mais de 500 pessoas tiveram experiências de ver Jesus após a sua morte e porque os discípulos e primeiros cristãos mantinham a crença da ressurreição.

Mais do que isso, essa hipótese explica porque os discípulos e primeiros cristãos pregavam ideias tão estranhas e ilógicas ao pensamento da época, tais como um Messias que não assumia o trono de Israel e que ainda morria crucificado. Explica ainda porque mesmo sendo um homem de carne e osso, que “falhou” em sua missão de Messias e que foi crucificado, Jesus foi considerado divino. Também explica porque os discípulos pre-gavam uma ressurreição corporal de Jesus, quando seriam mais bem aceitos se falassem sobre um “Jesus-fantasma”.

A ressurreição de Jesus explica os fatos, explica a insistência dos discípulos em ideias que entravam em choque com as crenças da época e explica porque os discípulos estavam dispostos a sofrerem hostilidade, perseguição e mortes. Os primeiros cristãos estavam comprometidos com a verdade. E a verdade era que eles tinham testemunhado a ressurreição corporal de Jesus. Então, por mais estranho, esquisito e perigoso que falar sobre isso para o mundo pudesse parecer, os discípulos iriam anunciar essa verdade com toda a intensidade. Isso explica, por fim, a existência e a duração do cristianismo.

Considerações Finais

Chegamos ao fim da explicação do argumento. Agora podemos falar sobre como alguém poderia refutá-lo. Temos duas premissas e uma conclusão. A primeira premissa afirma que existem alguns fatos históricos sobre Jesus que são bem confiáveis e, por isso, aceitos pela maioria dos historiadores. A segunda afirma que esses fatos precisam de uma explicação. A conclusão é que a melhor explicação é a da ressurreição.

A segunda premissa é inquestionável. Fatos requerem explicações e isso se torna bem claro quando temos fatos que não se explicam por si próprios. A conclusão parece ser bem sólida também. Afinal, qualquer explicação naturalista para aqueles seis fatos não explica todos os eles. Então, creio que o ponto que está mais sujeito à crítica é o primeiro. Será que esses seis fatos sobre Jesus são realmente históricos?

Bem, não vimos razões para achar que não. Expus aqui os dez critérios básicos que os historiadores usam para definir um fato como histórico e confiável. Mostrei que esses seis fatos são amplamente apoiados por esses critérios. Então, para refutar o argumento, é necessário que o crítico mostre porque um desses fatos não deveria ser considerado histórico. Ou, quem sabe, tentar achar uma explicação mais plausível para eles do que a ressurreição.

Aqui, vale lidar com uma objeção. Alguém afiramr que um historiador não deve pressupor a existência de Deus e que, por isso, não é válido eu colocar a ressurreição como uma explicação possível. Mas sejamos honestos: se um historiador não pode pressupor a existência de Deus (e concordo), também não pode pressupor a sua inexistência, não é verdade? O historiador deve ser neutro. E foi isso o que fiz. O fato de eu colocar a hipótese da ressurreição ao lado de hipóteses naturalistas mostra que fui neutro. Apenas estava considerando as principais hipóteses para escolher qual era a melhor.

O ponto é: a melhor hipótese é da ressurreição. Não vejo então motivos racionais para não aceitá-la. Isso não é uma pressuposição. Isso é hipótese apoiada por evidências plausíveis. Então, não vejo fundamento nessa objeção.

No mais, quanto à possibilidade ou não de existir Deus, já vimos cinco argumen-tos que mostram, de maneira bem racional, que não só é possível que Deus exista como é necessário no que tange a lógica. Então, por mais que não se pressuponha a crença em Deus, quando chegamos ao ponto em que só a ressurreição de Jesus consegue explicar os fatos históricos que temos nas mãos, é nossa obrigação racional aceitar essa hipótese, não importando no que isso implicará emocionalmente para nossas vidas.
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* Para o argumento da ressurreição, nós focamos apenas em documentos manuscritos, mas no estudo da história, objetos, desenhos e pinturas também servem para documen-tar eventos antigos.
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Bibliografia: 
Nesta postagem, diferentemente das outras, eu não fiz nenhuma citação direta de livros, artigos ou autores. Mas como fiz uma ampla pesquisa para escrever o texto, acho justo colocar aqui as minhas principais fontes (não são todas, pois, alguns conhecimentos que tenho, já não lembro mais de onde retirei).

1. Debate: Dr. Craig x Dr. Ehrman - Is There Historical Evidence for Resurrection? (Existe evidência histórica para a ressurreição?); College of the Holy Cross, Worcester, Massachusetts, EUA – 2006. – Presente no link: http://descontradizendocontradicoes.blogspot.com.br/2010/10/debate-william-lane-craig-x-barth-d.html

2. J . P. Holding, A fé impossível ou como não criar uma religião (Artigo presente no link:


3. Palestra: As Origens Cristãs e a Ressurreição de Jesus: A Ressurreição de Jesus como um Problema Histórico. – N. T. Write (presente no link:

4. F. F. Bruce, Merece Confiança o Novo Testamento? – Ed. Vida Nova, 2010 (Terceira Edição).
5. Alguns artigos sobre ressurreição lidos no site: http://mauevivian.blogspot.com.br

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